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PS e PAN "convergem" em muita coisa. "A divergência começa no exagero"

Chegou a vez de António Costa (PS) e André Silva (PAN) se defrontarem. De um lado, o primeiro-ministro e secretário-geral do PS, do outro o porta-voz e deputado único do PAN. Os dois já piscaram o olho um outro, abrindo caminho à possibilidade de acordo depois do dia 6 de outubro.

PS e PAN "convergem" em muita coisa. "A divergência começa no exagero"
Notícias ao Minuto

21:13 - 11/09/19 por Melissa Lopes

Política Debate

"Portugal bom aluno na Europa" foi o primeiro tema discutido entre António Costa e André Silva, com o primeiro-ministro a defender que "não temos de ter a atitude complexada de que estamos aqui a receber lições da Europa" e que devemos bater-nos pelos interesses do país, respeitando as regras. 

André Silva concordou que devemos cumprir os tratados e as regras "porque estamos na UE e assim deve ser". "Mas não temos que ir mais além", disse, sublinhando que o PAN tem uma perspectiva mais conservadora do que o PS apontando para um défice de 0,5%, uma margem de mil milhões para acomodar algum investimento. 

Em matéria de ambiente, os dois estiveram de acordo "nos objetivos", mas distanciaram-se nos "ritmos", sendo o encerramento das centrais a carvão um dos exemplos: António Costa é cauteloso e aponta para 2030 para atingir essa meta, André Silva garante que é possível fazê-lo até 2023. 

António Costa ergueu as bandeiras do caminho traçado durante esta legislatura para alcançar a neutralidade carbónica. André Silva exigiu mais e acusou o primeiro-ministro de hipotecar as gerações futuras e de estar a "transformar o Alentejo num olival intensivo". O socialista havia de rematar concluindo que os dois partidos convergem em muitas matérias, mas até certo ponto. "A nossa divergência começa no ponto do exagero", apontou. 

Acompanhe abaixo os principais temas do debate:

Portugal, o 'bom aluno da Europa'

O PAN tem no programa que Portugal deve ser responsável financeiramente mas não precisa ser um bom aluno da Europa. Concorda?

António Costa: Não temos de ter a atitude complexada de que estamos aqui para receber lições da Europa. Somos parceiros de corpo inteiro na Europa, devemos respeitar as regras, devemos bater-nos pela defesa dos nossos interesses. Essa expressão "bom aluno" foi empregue num período em que tínhamos acabado de entrar para a UE e tínhamos algum complexo de menoridade e de inferioridade (…) Com toda a franqueza, passados estes anos, acho que não temos nenhuma razão para isso (…).

Esta referência a bom aluno da Europa é algum tipo de crítica ao Governo, André Silva? O que é que o PAN quer dizer com isto?

André Silva: Queria referir que este é um momento histórico, 20 anos depois a sociedade civil permitiu que um novo partido esteja a fazer um debate para uma campanha das legislativas ao ter dado a confiança um novo partido que conseguiu trazer novas propostas e novos debates para cima da mesa.

O PAN tem feito um percurso de consolidação, de crescimento em várias, e assume-se nestas eleições com um princípio norteador: o princípio da responsabilidade. Apontamos no no nosso programa que devemos cumprir aquilo a que estamos obrigados porque estamos na UE, devemos cumprir os tratados e as regras porque estamos na UE e assim deve ser, mas não temos que ir mais além.

Mas é uma crítica ao PS?

André Silva: O PS pretende, e bem, conseguir fazer a redução da dívida relativamente ao produto,  pretende fazer investimentos públicos e ainda ter um excedente orçamental. E nós somos um bocadinho mais conservadores, porque temos dúvidas face a um cenário de eventual abrandamento económico, preferimos apontar para um défice de 0,5%, que nos permite ter uma margem de mil milhões de euros que permitam acomodar alguns benefícios, uma folga para investimento público que é necessário fazer.

Quer responder aos 0,5%?

António Costa: O que é importante é que nós nesta fase em que não há crise, possamos conseguir ter uma política económica equilibrada que tenha permitido repor rendimentos, aumentar o investimento público, reduzir os impostos sobre o trabalho, ao mesmo tempo que reduzimos o défice e a dívida. Porquê? Porque no caso de haver uma eventual crise, os mecanismos automáticos de ajustamento gerarão necessariamente algum défice (…). Se tivermos com saldos primários positivos como temos tido, se tivermos uma trajectória sustentada de redução do défice, sem ter de andar a cortar salários, isso dá-nos uma margem para podermos ter uma situação mais equilibrada que pode um dia acontecer, creio que não está no cenário de ninguém que possa acontecer de imediato.

O maior erro político de Costa

André Silva disse que o maior erro do PS foi a falta de visão que hipotecou as gerações futuras. Quer comentar?

António Costa: Se o André Silva pudesse pormenorizar melhor a que propósito é que se referia, poderei comentar …

André Silva: Tem havido por parte do PS nos últimos 4 anos uma evolução positiva, um crescimento naquilo que são as suas posições em matéria ambiental e isso deve-se acima de tudo a ter uma oposição competente no Parlamento, de um deputado apenas. Conseguimos também fazer com que o PS pudesse evoluir positivamente nas questões ambientais. E é essa a mensagem que temos de trazer aos portugueses, de que o futuro Governo será tanto mais competente se a oposição nesta matéria for competente. (...)  Em determinadas matérias, o PS é pouco ambicioso.  O PS hipoteca as gerações futuras na medida em que coloca a primazia do crescimento económico relativamente àquilo que é a conservação dos habitat, ecossistemas, e ao período de não retorno em 2030.

Neutralidade carbónica

É ou não possível antecipar em 20 anos atingir a meta da neutralidade carbónica em Portugal?

António Costa: Portugal foi o primeiro país em 2016 a assumir o objetivo da neutralidade carbónica em 2050, um compromisso que o conjunto da UE não foi capaz de assumir, visto que vários países se recusam a aceitar esta meta. Só a Finlândia e a Suécia têm metas mais ambiciosas que nós. Fomos também o 1º país na UE a aprovar o roteiro para a neutralidade carbónica, onde procuramos ir ao encontro que 2030 é uma data chave, colocando aí o esforço principal para a redução das emissões, para o aumento de produção de energias renováveis e para a incorporação dessas energias no consumo de eletricidade.

As metas são simples: duplicar até lá a produção de energia com base em energias renováveis, reduzir as emissões de CO2, é conseguirmos ter 80% da eletricidade que consumimos ter como fonte as renováveis. São metas muito ambiciosas. Não vamos mais rápido porque temos de saber compatibilizar aquilo que tem de ser a ambição com a transição económica. Não creio que seja realista que nos próximos 11 anos, as famílias e as empresas possam reverter totalmente o seu modo de vida e o seu modo de consumo energético. Muita ambição até 2030 mas a ambição final até 2050.

Se não é realista é porque o objetivo do PAN, nas palavras de Costa é irrealista

André Silva: Gostaria de contestar. É extremamente importante que consigamos ser mais exigentes do que aquilo que o PS tem sido para 2030, para evitar que consigamos (…) que a temperatura média não aumente em 1,5ºC. Dois exemplos em que o PS é particularmente pouco ambicioso. No roteiro da descabonização, na área da agricultura, falava-se em redução dos efetivos de bovino. Isso caiu. Esse desígnio para a agricultura caiu. Todos os pilares da economia conseguiram contribuir e convergir com o governo para este desígnio nacional, mas o Governo foi especialmente permeável ao setor da produção de carne e de leite ao não permitir a redução de efetivos.

Outra matéria que é muito cara ao António Costa, a produção de energia e esta transição que Costa diz que não é possível até 2030. Vou explicar num minuto que é possível, a fechar as centrais a carvão até 2023, que António Costa defende até 2030. Até 2021, conseguimos fechar os geradores do Pego e de metade do de Sines e depois até final de 2023 os dois geradores de Sines. Todas as centrais de gás natural no país conseguem suprir a produção de energia produzida nas centrais de carvão, com um terço das emissões (…) . É perfeitamente possível do ponto de vista económico e do ponto de vista da resiliência da rede (…) terminar com as centrais de carvão 2023.

António Costa: A nossa meta relativamente à produção é que até 2030 seja possível duplicar a energia produzida com fonte renovável, sobretudo eólica e solar. A meta que temos é antecipar até 2023 é encerrar a central a carvão do Pego e até 2025-2030 a de Sines. Claro que se a tecnologia tiver uma boa evolução (…) pode ser que até consigamos antecipar e quanto mais conseguirmos antecipar melhor. Temos que dar atenção a outros elementos fundamentais. Creio que estamos de acordo. Há uma mudança de paradigma em matéria de mobilidade, e por isso, a grande aposta que fizemos desde o início da legislatura no transporte público: quadruplicámos o volume de investimento no transporte público e em particular na ferrovia. E o plano nacional de infra-estruturas, teve a abstenção do PAN, prevê um reforço muito grande de investimento na ferrovia ao longo da próxima década.

Emergência climática

O PS foi o único partido que votou contra os projetos de resolução do PAN e do BE para a emergência climática. Não fica a ideia que o PS anda a empurrar este assunto tão grave?

António Costa: A emergência climática não se resolve com resolução proclamatória. Desde o início da legislatura que fizemos uma mudança muito importante: colocar no Ministério do Ambiente os transportes urbanos. São a chave para esta transição energética. Colocámos no Ministério do Ambiente toda a política de energia. Sendo indispensável à economia, é hoje uma questão central para a mudança ambiental. Nós já assumimos a emergência climática desde o início da legislatura. A emergência efetiva nós temos assumido e executado (...) Antecipámos um ano a data da diretiva para a eliminação dos plásticos não renováveis.

Era importante haver a declaração da emergência climática?

André Silva: Claro que é importante. O Tratado de Paris também é proclamatório, não é vinculativo, e o Governo assinou. Tem que ver com o compromisso que assumimos perante o país. Há partidos, como é o caso do PS e do PAN, que têm como primeiro capítulo do programa matéria de ambiente e de combate às alterações climáticas. Mas essas matérias só se abordam quando está presente o PAN. Não tem sido uma prioridade para os outros partidos este debate.

António Costa: Relativamente aos objetivos, creio que não há uma divisão entre nós. Haverá talvez alguma divergência quanto ao ritmo. Se tecnicamente for possível, com segurança, antecipar o encerramento das centrais, muito bem. (…) o que posso assegurar é que antecipamos tanto quanto seja possível.

Europa

Como é que Elisa Ferreira vai gerir uma pasta em que Portugal é um dos principais interessados? Dificuldades e prioridades?

António Costa: É útil para Portugal que o comissário que tenha trate de assuntos que interessem a Portugal. Constrangimentos? Não. E exercerá o cargo com independência necessária, conhecendo bem qual a nossa situação (…). Uma das componentes importantes é que vai gerir o novo fundo para a transição justa para a energia e o digital.

Qual a expectativa do PAN?

André Silva: É uma expectativa moderada. Sabemos que a pessoa em causa é competente, que nestas questões há sempre condicionamentos. Espero que Elisa Ferreira vá mais além do que defender os interesses de Portugal. O combate dos nossos dias é fundamental que ocorra em todo o mundo.

António Costa: Também acho.

Turismo

O PAN defende que se apure a carga turística do país e que se imponham quotas. Faz sentido para si?

António Costa: Não, não faz. O que temos de fazer com o turismo é obter a sua diversificação. Durante muitos anos eramos um destino de sol e praia, muito centrado no Algarve e Madeira. Hoje felizmente temos um turismo urbano que é muito relevante, e temos cada mais um turismo de natureza que é sobretudo um enorme impulso para o desenvolvimento das regiões do interior. Tem de ser um turismo para todo o país.

A questão do olival

André Silva: Acredito que o PS sabe o que quer fazer. E é isso que nos afasta claramente, este modelo económico de crescimento ilimitado do faz primeiro e remedeia depois. Parece-me que é pouco sensato esta perspetiva de sucessivos governos. Por exemplo em matéria de agricultura, regadio olival intensivo. Ou em matéria de turismo, que condições é que temos no país, etc. e a partir daí desenvolvermos projetos. Ao nível da agricultura, para fazermos uma verdadeira adaptação às alteraões climáticas devemos fazer e produzir culturas adaptas a períodos de seca (…). O PS está no fundo a transformar o Alentejo num olival intensivo com um gasto de água absolutamente excessivo e que não é admissível num contexto de alterações climáticas (…).

António Costa: A região do Alentejo tem 3 milhões de hectares. A área de olival são 170 mil hectares. E a parte relativa ao olival intensivo é 1,5% da área do Alentejo. Há uma coisa que temos de assegurar: temos de ter uma visão equilibrada dos diferentes objetivos. Não podemos ter um regime económico de predador, mas não podemos deixar de ter um regime económico que gere riqueza e auto-suficiência para o país.

André Silva: O PS não está a aproveitar os recursos, está a depredar os recursos. Está a colocar a sustentabilidade dos recursos naturais e do país.

António Costa: Convergimos em muitas matérias. A nossa divergência começa no ponto do exagero. 1,5% da área do Alentejo?

Perguntas finais

Num cenário em que um membro do Governo convidasse o seu filho para exercer funções, como lidaria com isso?

António Costa: Estou convencido que nenhum membro do governo convidaria o meu filho e que o meu filho não aceitaria trabalhar no gabinete de um governo presidido por mim. O meu filho tem 29 anos, tem a sua vida, o que eu lhe desejo é que seja feliz na vida dele, nunca pediu nada ao pai para construir a sua vida, e não seria agora que o iria fazer. Há regras de bom senso absolutamente essenciais.

Não é pelo facto de o meu irmão ter sido diretor desta casa que a SIC deixou de ser independente. Felizmente na minha família cada um pensa por si próprio.

Medida que previa a reconciliação para crimes violentos. Foi alterada, mas o princípio continua o mesmo. Se um familiar seu fosse vítima de um crime violento, ia tentar convencê-lo a uma reconciliação com o agressor?

André Silva: A proposta do PAN visa tentarmos implementar em Portugal aquilo que já se faz lá fora e que tem ver com a justiça regenerativas. É extremamente importante mudarmos de paradigma e permitirmos às vítimas e agressores que depois de cumprirem penas, assim o queiram, possam reabilitar-se e ficar em paz, mas isto nunca seria uma obrigatoriedade. Eu não ia obrigar nem convencer ninguém. Mas se o quisessem, muito bem. É preciso caminhar para uma sociedade mais harmoniosa e menos violenta.

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