Os 20 do Bloco: “Nunca seremos governo para fazer programas de outros"
Volvidas duas décadas, como nasceu e para onde cresce o Bloco de Esquerda? Os melhores e os piores momentos do partido recordados por Francisco Louçã e Catarina Martins.
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Política Partidos
O Bloco de Esquerda foi fundado há precisamente 20 anos. Para assinalar a data, a SIC juntou Francisco Louçã e Catarina Martins para que ambos passassem em revista as últimas décadas do partido, desde a sua fundação até ao presente. Quanto ao futuro, a atual coordenadora garantiu: “Nunca seremos governo para fazer programas de outros”.
Recuando na fita do tempo, a fevereiro de 1999, Francisco Louçã recorda que o nascimento do Bloco se justificou pelo facto de, na altura, a Esquerda se encontrar “muito dividida”.
“Havia um espaço social importante que não tinha representação, ou seja, que tinha ideias generosas mas a que faltava força”, lembra. Catarina não esteve na fundação, mas “foi-se encontrando com o BE ao longo do tempo, nas diversas formas”.
O economista, por seu turno, vivenciou as primeiras dificuldades do partido recém-criado. Nas primeiras eleições, o Bloco não conseguiu eleger nenhum deputado. Depois, apenas dois: Louçã e Luís Fazenda. “E isso foi ganhando confiança, com altos e baixos, mas foi mostrando que era possível, necessário e que mudava o panorama político português”, sublinha.
Catarina, que foi adolescente nos anos 90, mostra como mudou o país ao longo destes últimos anos de Bloco. “Quantos de nós não se lembram como era a política da droga? A toxicodependência passou a ser tratada como uma doença”, atira. Louçã recorda que essa lei foi negociada pelo Miguel Portas e por si e que o último encontro foi num restaurante do Bairro Alto com o ministro da Justiça de então: António Costa.
Catarina sinaliza o referendo do aborto como uma das grandes mudanças no país. “As mulheres deixaram de ser presas e humilhadas se decidiam abortar, deixaram de morrer em abortos de vão de escada, violência doméstica como crime público. É outro país”, frisou.
Contudo, a maior vitória do partido foi mesmo a primeira. Louçã lembra como foi difícil começar com dois deputados no Parlamento. “Na primeira lei que conseguimos aprovar éramos dois no Parlamento e tivemos resistências do PCP ao CDS. Era uma alteração para que a violência doméstica passasse a ser crime público”.
“É uma transformação do país que é significativa”, constata Catarina. Para Louçã, “foi uma grande vitória porque foi a primeira e porque provou que era possível”.
No entender da coordenadora do partido, se hoje se discute o problema da violência doméstica é porque ele passou a ser considerado crime público.
“Claro que as mulheres continuam a ser vítimas de violência todos os dias, mas se nós agora debatemos o problema, e sabemos que é o maior problema de segurança interna do país, é porque sabemos que é crime público. Porque dantes nem sequer sabíamos, entre marido e mulher ninguém metia a colher, e o que acontecia dentro de casa, lá ficava. As mulheres morriam silenciosamente e isso acabou. E isso é uma conquista de igualdade, mesmo sabendo de tudo o que está por fazer”, afirma.
Já a maior derrota do Bloco, para Catarina Martins, relaciona-se com o sistema financeiro. “A solução para o Banif ter sido igualzinha a todas encontradas antes, porque o PS decidiu ter o apoio da Direita para continuar a comportar-se da mesma forma com o sistema financeiro, foi uma derrota”, declara.
“E foi dois meses depois de o Governo se ter formado. Foi um grito de autoridade do BCE”, acrescentou Louçã.
Como momentos difíceis Catarina guarda a queda do último governo de Sócrates e “o facto de o BE ter chumbado o PEC 4 como, aliás, tinha de chumbar”. “Na altura, o discurso de que não havia alternativa e de que tinha de ser assim era um discurso muito forte, muito pesado e que fez recuar a Esquerda”.
Mas outros momentos duros na vida do partido: as mortes de Miguel Portas e de João Semedo, “pessoas que marcaram muito gerações diferentes da história do Bloco. Isso teve um peso para nós”, lembra Louçã.
Encontrar solução para a liderança, aquando da saída de Louçã, "parecia uma tarefa impossível", recorda Catarina. "O BE tinha razão. Tinha propostas consistentes e tinha a Catarina Martins", atira Louçã.
"Também é verdade que houve uma campanha de ‘O Bloco vai morrer’, que é uma campanha a que o BE já assistiu várias vezes, e que eventualmente não tinha base popular para ser feita da forma como foi", aponta Catarina, que vê a participação do seu partido na dita Geringonça como algo que o Bloco "tinha de fazer". "Na altura pensámos, e se não fizermos o que é que vai acontecer? E qualquer pessoa quando responde a esta pergunta sabe que tínhamos de o fazer".
"O BE fez muitíssimo bem e isso é muito marcante", aplaude Louçã.
E quanto ao futuro próximo, o das eleições legislativas deste ano? "O BE assumirá as funções que poder assumir de acordo com os votos e a força que tiver para o seu programa. Nunca seremos governo para fazer programas de outros", assegura a líder do presente.
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