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"Em Portugal temos um problema, vivemos numa ditadura de Esquerda"

O advogado e colunista democrata cristão Pedro Borges de Lemos é o convidado de hoje do Vozes ao Minuto.

"Em Portugal temos um problema, vivemos numa ditadura de Esquerda"
Notícias ao Minuto

09:20 - 22/01/19 por Anabela de Sousa Dantas

Política Pedro Borges Lemos

Há uma corrente interna no CDS-PP que não concorda com a atual direção. Essa divergência em alguns pontos que consideram fundamentais para a demarcação da identidade do partido junto do eleitorado levou à criação do Movimento CDSXXI, pelo qual o advogado Pedro Borges de Lemos dá a cara.

Definido como uma corrente informal de opinião, o Movimento CDSXXI existe há cerca de um ano dentro do CDS-PP e "defende a Direita conservadora patriótica de inspiração cristã e humanista".

Em entrevista ao Notícias ao Minuto, Pedro Borges de Lemos diz entender que falta em Portugal um partido de Direita que se afirme no espetro, mas assente numa matriz humanista e democrata cristã, ou seja, com enfoque na área social: "Os mais pobres e os mais velhos devem ser defendidos em primeira linha".

O advogado e colunista debruça-se sobre a liderança atual do partido, tecendo várias críticas a Assunção Cristas e a sua ausência de posição em temas relacionados com o que entende ser a espinha dorsal do partido: os valores da vida, da família tradicional e as questões sociais. "Aquilo que é a velha tradição da Direita na Europa, em Portugal já não tem representação e muito menos é representada pelo atual CDS", revela o colunista.

Pedro Borges de Lemos também fala sobre a questão da imigração, sobre uma crise de valores na Europa, sobre Jair Bolsonaro e sobre a moldura penal máxima em Portugal.

É com Assunção Cristas que a identidade democrática cristã tem sido mais renegadaPor que razão o Movimento CDSXXI foi criado e com que intuito?

O Movimento tem pouco mais de um ano, foi criado em 2017, na sequência de algumas solicitações que me foram feitas dentro do próprio partido e de um desafio que militantes descontentes com a atual direção me puseram. Criar uma corrente interna dentro de um partido que resultasse numa alternativa à atual direção. Isto porque, entendiam esses militantes e entendo eu próprio, o CDS é um partido cuja matriz humanista tem sofrido sucessivos atentados num passado recente. Exemplo disso é o facto do Paulo Portas ter anuído a políticas neo-liberais, anti-sociais, que castigaram os mais pobres e que castigaram os mais velhos.

Mas, consideramos nós, é com Assunção Cristas que a identidade democrática cristã tem sido mais renegada. Ela não se define relativamente a matérias sociais cuja defesa deve partir em primeira linha do CDS. Dou alguns exemplos: não esteve presente no dia da votação da lei da gestação de substituição; numa determinada altura admitiu um referendo à eutanásia; e, relativamente à economia, não defende de uma forma clara a economia social de mercado, preferindo continuar a seguir uma linha neo-liberal que não promove o Estado Social.

Mas há aqui um ponto que eu acho que é muito importante e que divide o CDSXXI da atual direção. É que Assunção Cristas afirma que a democracia cristã não é uma ideologia, ou seja, ao fim de 43 anos fomos informados que o CDS não tem ideologia e que, no fundo, a carta de princípios subscrita por Adelino Amaro da Costa não tem atualidade. Isto é uma situação gritante e que os militantes do CDS, que se revêm naquilo que é neste momento a carta de princípios do CDSXXI, não aceitam. (…)

Qual deve ser o caminho do CDS?

O CDS tem de criar a convicção no eleitorado de que tem condições para ser governo. E para preparar esse caminho o CDS tem d e controlar a agenda política e antecipar-se nessa matéria ao PSD. Ora, nós verificamos, e dou-lhe um exemplo, que em matérias sociais o PSD tem tomado a dianteira. Por exemplo, uma das primeiras iniciativas do PSD de Rui Rio foi ter uma reunião com o Bispo do Porto, quando, no fundo, o CDS é que é o partido democrata cristão do espetro. Faria muito mais sentido ser o CDS a promover esse encontro, relativamente a um tema crucial, que é o tema da pobreza. Não vejo o CDS muito preocupado com estes temas. Vejo a direção do CDS muito mais preocupada com, enfim, o duelo com o PS.

A batalha do CDS é clássica relativamente a temas como: os mais velhos, os mais pobres, os mais desfavorecidos, os mais jovens, os reformados. Tudo isso é que são temas muito mais da área de intervenção do CDS.

E considera o CDSXXI que para se ser o líder da oposição, como quer Assunção Cristas, tem de se ser o líder de uma oposição construtiva e elevada. O que não acontece com ela. Portanto, o caminho passa sempre por um CDS independente, autónomo de qualquer outra força política, mas ao mesmo tempo um CDS disponível para pactos de regime em áreas estruturais que possam melhorar a vida dos portugueses.

Falava há pouco de ideologia. Assunção Cristas disse que o CDS não é um partido de Direita radical mas Direita democrática para travar populismos.

Considero que Assunção Cristas não define exatamente qual é seu posicionamento no espetro. Não o define. E nem todos os meios justificam os fins.

Para ser primeira-ministra, Assunção Cristas adotou uma estratégia, que é agradar a todosPeca pela omissão, é isso?

Exatamente. E eu até confrontei Assunção Cristas diretamente, no Congresso, com isso. Assunção Cristas antes do último Congresso deu várias entrevistas e em cada uma delas dizia uma coisa e o seu contrário. Chegou a dizer que o CDS podia, eventualmente, aproximar-se do PSD no sentido de fazer uma eventual aliança. Há inclusivamente fontes próximas da direção, embora não tenha sido exatamente Assunção Cristas que o tenha dito, de uma intenção do CDS em aproximar-se do PS. Há, depois, um outro posicionamento de Assunção Cristas que é de ir sozinha às eleições e, no discurso que ela faz no Congresso, passa de uma forma muito clara: quer ser primeira-ministra.

Portanto, para ser primeira-ministra, Assunção Cristas adotou uma estratégia, que é agradar a todos. Ela quer ir à Direita, quer ir ao Centro e quer ir à Esquerda. Isto é perigoso porque o CDS é um partido clássico no espetro. No espetro da Direita é o partido mais ideológico, o PSD não é um partido ideológico, é um partido muito mais pragmático. Portanto, nós consideramos, no CDSXXI, que a maneira de nos afirmarmos no espetro é exatamente através dos valores que são os nossos valores identitários.

Quando eu me refiro às questões dos valores da vida, em que Assunção Cristas nem sequer esteve presente na votação da gestação de substituição, obviamente que é grave. Porque a líder de um partido que defende, em primeira linha, a vida não pode fazê-lo. Tem de estar presente, tem de assumir a responsabilidade daquilo que o seu partido defende.

Qual é a posição que o partido deve defender nesse caso?

O partido deve defender intransigentemente os valores da vida e da família. O CDS é um partido que defende a vida e a família e, relativamente a estas duas questões, o CDS não pode transigir, porque se transigir são exatamente as mesmas situações que se verificam noutros partidos do espetro relativamente a estes temas, como, por exemplo, o PSD. Mas como disse, o PSD é um partido muito mais pragmático, que para ter poder acaba por fazer tudo. O CDS não.

Há várias questões que têm de ficar bem definidas para que o eleitorado do CDS se reveja no partido. E o eleitorado do CDS é um eleitorado conservador, um eleitorado assumidamente de Direita e cristão. Isto não pode perder-se sob pena de o partido ficar esvaziado daquilo que é a sua identidade e a sua matriz.

Aquilo que é a velha tradição da Direita na Europa, em Portugal já não tem representação e muito menos é representada pelo atual CDSPortanto, nem o PSD nem a alternativa proposta por Pedro Santana Lopes preenchem o espaço que diz estar vazio à Direita?

Não. Considero que, neste momento, tem de existir uma nova Direita. Neste momento, os partidos do espetro, quer os que têm representação parlamentar quer os que ainda não têm, e refiro-me concretamente ao partido de Pedro Santana Lopes, não representam efetivamente essa Direita.

Relativamente ao PSD, temos uma guinada à Esquerda. Ou seja, o atual presidente do PSD é assumidamente uma pessoa que concorda com o Bloco Central, portanto, concorda com uma convergência com o PS. E ele próprio assume que o PSD não é de Direita, que o PSD é um partido de Esquerda. Aliás, uma grande apoiante dele [Manuela Ferreira Leite] disse há uns dias que prefere que o PSD tenha um mau resultado eleitoral do que assumir-se como um partido de Direita.

Relativamente ao CDS, nós verificamos que a lógica e o discurso de Assunção Cristas é no sentido de atingir o eleitorado do centro-esquerda. Ou seja, ela também pisca o olho à Esquerda, exatamente para conseguir eleitores, para conseguir votantes. E fora da representação parlamentar temos um partido que agora se forma, que é efetivamente o Aliança, que não sabemos exatamente ainda qual é o programa, mas que se apresenta como um partido neo-liberal, que se aproxima muito daquilo que foram as iniciativas tomadas pelo Pedro Passos Coelho e pelo Paulo Portas e que, no fundo, atentam contra as questões sociais. Contra os mais velhos, contra os mais desfavorecidas, e isso não é uma política com cariz humanista.

Aquilo que é a velha tradição da Direita na Europa, em Portugal já não tem representação e muito menos é representada pelo atual CDS. O atual CDS está desvirtuado, há uma descaracterização do atual CDS e é isso que o CDSXXI quer retomar.

Escreveu, num dos seus artigos de opinião, que faz falta em Portugal “um partido verdadeiramente de Direita que possa ser a afirmação dos valores nacionais”. Quais são esses valores nacionais?

Acredito que existe uma diferença entre ser patriota e ser nacionalista. Ser patriota é alguém que aspira àquilo que deverá ser a coesão nacional relativamente ao país, àquilo que são os seus valores, a sua identidade e a sua cultura. O nacionalismo tem mais a ver com aquilo que são questões de raça e, portanto, eu aí não me identifico minimamente. Nós no CDSXXI identifica-mo-nos com patriotismo, com aquilo que são os valores morais que devem estar assentes na atuação política e na atuação governativa. Há uma grande diferença.

Agora, se me pergunta quais são as grandes questões nacionais, eu respondo-lhe. As grandes questões nacionais têm a ver com a segurança, com a defesa, com a imigração. Têm a ver com a família, cada vez mais há atentados graves à família, que é a célula mais importante da sociedade.

De que atentados é que fala?

Refiro-me concretamente ao facto de, neste momento, nós termos um desvirtuamento relativamente ao conceito de família. Não percebemos muito bem o que é que alguns grupos sociais querem relativamente à questão da família. E nós, no CDSXXI, referi-mo-nos à família tradicional, àquilo que tem que se manter em Portugal.

Fala, por exemplo, do casamento homossexual?

Não, neste momento não estou a referir-me ao casamento homossexual. Estou a referir-me àquilo que são atentados à família no que diz respeito à sua essência, ou seja, temos de defender aquilo que é a família tradicional. Àquilo que são os valores que a família tradicional defende, na sua coesão, na sua génese, nas perpetuações das gerações naquilo que são os valores cristãos e humanos. É a isso que me refiro. É evidente que há questões, como o casamento homossexual, que eu não queria agora entrar por aí, mas que têm que ver com…

Não condeno nem a orientação sexual de Adolfo Mesquita Nunes nem as suas declarações enquanto cidadão. O que realmente eu já discuto é que as faça enquanto dirigente nacional de um partidoMas que não se enquadram, necessariamente, naquilo que acabou de descrever?

Não se enquadram, necessariamente, naquilo que acabei de dizer. Aliás, nós no CDSXXI seguimos aquilo que é a doutrina social da Igreja. Embora a doutrina social da Igreja possa, eventualmente, não refletir muitas vezes aquilo que é a evolução da sociedade e, portanto, nesse sentido, ser fundamentalista também é um erro. A própria Igreja evoluiu, assume os que erros que cometeu ao longo da História. Não consideramos que deva haver fundamentalismos. Agora, obviamente que, no que diz respeito a questões como aquelas que referi, somos intransigentes na sua defesa.

Como encara o facto de Adolfo Mesquita Nunes [vice-presidente do CDS] se ter assumido como homossexual, no que diz respeito ao CDS?

Não tenho rigorosamente nada a ver com o facto de o Adolfo Mesquita Nunes, ou outra pessoa qualquer, num órgão de comunicação social, dar a sua opinião ou eventualmente explicar, no caso, a sua orientação sexual. Agora, a partir do momento em que as pessoas têm funções institucionais, como é o caso de Adolfo Mesquita Nunes, em que está em causa o partido que ele representa, acho que todas as considerações que ele faça relativamente à sua vida pessoal refletem-se na imagem que o partido tem perante os portugueses, perante o seu eleitorado. No que diz respeito a isso é que eu considero que deverá haver cuidado.

Não condeno nem a orientação sexual de Adolfo Mesquita Nunes nem as suas declarações enquanto cidadão. O que realmente já discuto é que as faça enquanto, ou na qualidade, de dirigente nacional de um partido. Fosse ele CDS ou outro partido qualquer, porque, como nós sabemos, há uma ministra do atual Governo que assumiu a sua orientação sexual. Não será só Adolfo Mesquita Nunes, neste momento, haverá outras pessoas que o fazem. E, portanto, a partir do momento em que têm funções institucionais, já discuto que essas declarações tenham cabimento.

De que forma vê a questão das migrações, em particular, o papel que Portugal tem adotado?

Vejo com alguma preocupação. Queria deixar bem claro que nós no CDSXXI somos inclusivos, não somos discriminatórios. Agora, fiz um estudo àquilo que tem sido o trabalho do Observatório de Segurança, Criminalidade Organizada e Terrorismo (OSCOT) nos últimos tempos e o Observatório tem sido muito claro. E tem dado diretivas no sentido de ter cuidado com aquilo que é a entrada de alguns imigrantes que poderão atentar contra a segurança do Estado.

E mais: o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), que peneira a entrada dessas pessoas em Portugal neste momento não tem nem condições físicas, nem condições de equipamento para avaliar a perigosidade ou o risco que algumas pessoas poderão implicar com a entrada no nosso país. Ao contrário do que o nosso Governo diz, que dá condições a estes organismos para fiscalizarem e avaliarem as condições de acesso e de entrada destes imigrantes em Portugal, isso não existe. Basta verificar aquilo que disse o SEF e verificar aquilo que diz o Observatório.

É preciso ter muito cuidado quando dizemos que as fronteiras têm de estar abertas. As fronteiras não podem estar abertas ou, pelo menos, não o podem estar nos termos em que isso acontece neste momento. Realmente, Portugal ainda não é um daqueles países com sinal encarnado relativamente à possibilidade de atentados terroristas mas pode vir a ser. Mais: não podemos privilegiar os imigrantes relativamente ao nossos nacionais. Eu não concordo com isso.

Acha que acontece?

Acho que acontece muitas vezes. Acho que os nacionais têm sempre prevalência sobre os imigrantes. Agora, é evidente que dentro daquilo que é o universo dos imigrantes, com certeza que há pessoas sérias, pessoas honestas, que querem vir trabalhar para Portugal. Mas também sabemos que a grande percentagem dos imigrantes que vêm para Portugal, e refiro-me concretamente a refugiados, estão em Portugal durante pouco tempo e depois passam para outros países. É tudo isto que tem ser muito bem avaliado e visto com responsabilidade e não é isto que o ministro Eduardo Cabrita [Ministro Administração Interna] tem feito.

O que quer dizer com isso?

Quero dizer que nos últimos tempos houve um aumento significativo de entrada de pessoas em Portugal que, volto a dizer, não foram fiscalizadas como deviam ser. Não sabemos se a grande maioria da população de imigrantes que vivem em Portugal está cá com motivações sérias, honestas, de trabalho, ou se está com outras intenções. As nossas fronteiras têm de ser condicionadas àquilo que são os interesses nacionais e à segurança do Estado. 

Se fosse presidente do CDS, tinha assumido, declaradamente, o meu apoio a BolsonaroCriticou, no ano passado, na altura das eleições presidenciais no Brasil, uma fotografia de várias deputadas que se manifestavam contra a eleição de Jair Bolsonaro, mas não chegou a marcar uma posição sobre a ideologia do atual presidente brasileiro. Revê-se na ideologia de Jair Bolsonaro?

O presidente Bolsonaro é um homem que, em primeiro lugar, ao contrário da grande maioria dos candidatos à presidência do Brasil, não apresenta qualquer tipo de questões de nível cadastral, ou seja, é um homem que teve até agora uma conduta impoluta. E isso no Brasil já é um mérito. Porque, realmente, um político que se candidata à presidência do Brasil e que não tem cadastro é um grande mérito.

Segunda questão. A grande luta de Bolsonaro é o grande cancro que neste momento existe no Brasil que é a corrupção, ou seja, enquanto não controlarmos esse grande cancro que existe no Brasil, o Brasil vai continuar numa derrapagem. Não há dúvidas que isso vai acontecer, portanto, um candidato que se propõe combater de uma forma frontal aquilo que é o maior cancro do Brasil, que é a corrupção, já é um candidato que merece apoio.

Relativamente àquilo que muita gente diz, que Bolsonaro é um extremista e um radical, tive ocasião de estudar o percurso político de Bolsonaro. E, efetivamente, o Bolsonaro de há vinte e tal anos não é o mesmo Bolsonaro de hoje. Hoje em dia temos um Bolsonaro muito mais razoável, muito mais humanista, um Bolsonaro que não assume as posições radicais que assumia há 20 anos. Nós, em Portugal, temos um problema que é o seguinte: vivemos numa ditadura de Esquerda. Ou seja, tudo o que não esteja dentro daquilo que são os cânones da Esquerda imediatamente é apelidado de extrema-direita. Isto também tem de acabar, porque se existe democracia para a Esquerda também tem de existir democracia para a Direita. Vivemos num país que deve ser plural, que deve aceitar as ideias de todos, desde que, obviamente, não ofenda as liberdades de cada um.

Aqui Assunção Cristas tomou uma posição que, quanto a mim, foi absolutamente surpreendente. Ela disse que se estivesse no Brasil se abstinha, quando todos sabemos que no Brasil o voto é obrigatório. Acho que, neste caso, o líder do CDS tinha de tomar uma posição clara, relativamente à pessoa que representava a Direita no Brasil, que era Bolsonaro. Eu, se fosse presidente do CDS, tinha assumido, declaradamente, o meu apoio a Bolsonaro.

Agora, se me perguntar se concordo com tudo o que diz Bolsonaro, digo logo que não. Desde logo tenho algumas dúvidas relativamente àquilo que poderá ser as privatizações em massa que ele pretende fazer. E a linha neo-liberal que o seu ministro da Economia defende. Agora se me pergunta relativamente às questões da família, às questões do aborto, às questões do endurecimento da pena, eu concordo. 

Não se admite que as pessoas sejam condenadas por crimes hediondos e ao fim de cinco, seis, sete anos, estejam cá foraDefende o aumento da moldura penal máxima, para crimes violentos. Com que intuito?

Um dos países da Europa que tem uma moldura penal menos alta, menos significativa, é Portugal. Nós temos uma pena máxima de 25 anos de prisão. Não temos o cúmulo material, temos o cúmulo jurídico. A pessoa não pode ser condenada por uma pena superior a 25 anos de prisão. E isto praticamente não existe em nenhum país da Europa, aqui ao lado, em Espanha, a pena máxima de prisão é de 40 anos. O intuito é exatamente este, que as pessoas sejam punidas pelos crimes que praticaram. Não se admite que as pessoas sejam condenadas por crimes hediondos – homicídios qualificados, violações, abusos sexuais de menores – e ao fim de cinco, seis, sete anos, estejam cá fora. Isto mostra a fraqueza do próprio sistema.

(…) Se me pergunta se podem existir erros? Evidente que podem existir erros, mas, de uma forma geral,  acredito na justiça e acredito no trabalho dos magistrados. Quer o trabalho do Ministério Público que investiga, quer o trabalho do magistrado que julgar o processo.

Acredita que um aumento da moldura penal máxima teria algum efeito na taxa de crimes violentos? É por isso que pede este aumento da moldura penal?

Não, considero que o aumento da medida da pena, muitas vezes, poderá ajudar à não repetição do crime. Porque aquilo que eu verifico, até em termos profissionais, é os arguidos dizerem ‘bem, tenho aqui comida e roupa lavada, saio daqui a cinco ou seis anos, vou lá para fora e eles vão ver’. E, realmente, saem e são reincidentes na prática do crime. Aliás, há uma medida que foi adotada por Bolsonaro agora, em que intensificou o trabalho dentro das prisões, por parte dos reclusos. Essas medidas são fundamentais até por uma questão de política posterior de reinserção social. As pessoas precisam de perceber que o crime que praticaram não só é socialmente condenável como lhes deve a eles próprios corresponder a um castigo. É essa uma das funções das prisões, que não são hotéis, nem pensões.

O Relatório Anual de Segurança Interna (RASI) que foi divulgado este ano diz que entre 2008 e 2017 a criminalidade violenta e grave diminuiu 37,1%, o valor mais baixo dos últimos dez anos. Justifica-se uma moldura penal maior, ainda assim?

Realmente é verdade, a criminalidade mais violenta diminui, mas isso não quer dizer que o que eu acabei de referir não seja seguido. Quando refere a criminalidade violenta eventualmente os crimes de violação não estão incluídos, ou de abusos sexuais. Há uma panóplia de crimes que são absolutamente hediondos e repugnantes e que não estarão aí incluídos, e que eu considero que deverão ter uma medida de pena muito mais agravada. Volto a dizer, sobre os crimes de abuso sexual de menores, de que muita gente fala, não vejo ninguém na Assembleia da República, da Esquerda à Direita, a avançar com um aumento da medida da pena.

Relativamente a essas situações deveria haver uma revisão das medidas da pena. E mais: tudo isto obedece a uma reforma da justiça penal. Dentro da justiça, em geral, nós verificamos que há duas questões que devem ser objeto de análise e de reforma mais ou menos urgente. Na questão da corrupção, ou seja, crimes de colarinho branco, praticados por agentes políticos, autarcas, magistrados, todos estes crimes devem ser alvo de atenção e reforma urgente. E depois os crimes que se referem aos mais frágeis, como as crianças. Continuamos a verificar que os crimes de abuso sexual de menores continuam a crescer e muitos deles não são alvo de denúncia, por medo. Esses é que têm que ser, efetivamente, alvo de uma reforma profunda e de um aumento da medida da pena.

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