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Corrupto? "Não fui" e "todos os amigos constroem um mundo em comum"

O antigo primeiro-ministro, José Sócrates, garantiu esta noite em entrevista à RTP que não foi um governante "corrupto" e reiterou que o Ministério Público não tem "testemunhos" e "documentos" a provar aquilo de que o acusa.

Corrupto? "Não fui" e "todos os amigos constroem um mundo em comum"
Notícias ao Minuto

21:27 - 13/10/17 por Lusa com Notícias ao Minuto

País José Sócrates

O antigo chefe de Governo José Sócrates garantiu hoje que não foi um primeiro-ministro corrupto, defendendo que não há nenhum documento no processo de investigação que prove que o dinheiro em causa era seu.

"Não fui [um primeiro-ministro corrupto], honrei sempre o meu cargo com aquilo que me pareceu ser o interesse do país", afirmou José Sócrates numa entrevista à RTP.

Segundo o antigo-primeiro-ministro, que foi acusado esta semana pelo Ministério Público de 31 crimes, entre os quais corrupção passiva enquanto detentor de cargo público, "grande parte desta acusação não passa de insultos do Ministério Público (MP)".

"O embuste inicial do MP é que eu tinha uma fortuna escondida. Com base em que prova o MP pode fazer uma afirmação destas? Nem nestas folhas nem em nenhum documento encontrará alguém a dizer que o dinheiro é de facto do engenheiro José Sócrates", disse.

Para Sócrates, aquilo que o MP fez não foi uma perseguição a um crime, mas sim "uma perseguição a um alvo". Até porque, sublinhou, o MP "escondeu que nenhuma conta tinha o nome de José Sócrates".

A identificação dos beneficiários das contas de Carlos Santos Silva - outro dos acusados pelo MP na chamada 'Operação Marquês' - indica apenas um beneficiário: o próprio Carlos Santos Silva, frisou. E quando questionado sobre a linguagem em código utilizada com o 'amigo', Sócrates reiterou que "isso foi tudo uma construção do MP, não é verdade. Eu não tenho nenhuma memória disso. Nós temos um modo de falar, todos os amigos constroem um mundo em comum".

O antigo vincou ainda que as acusações do Ministério Público pretendem criminalizar o período político em que chefiou o Governo e que são mentiras que têm "tudo a ver com Direita e com Esquerda". "Todas as grandes imputações que me fazem pretendem criminalizar uma gestão política, um período político", afirmou em entrevista à RTP.

Segundo defendeu, o Ministério Público fundamenta "toda a acusação em várias mentiras", pondo de lado aquilo que não interessa à acusação. "Eu devo ser a única pessoa no mundo que é acusado de ter uma fortuna escondida e que pediu três empréstimos à CGD", ironizou, sublinhando que "isso é posto de lado" na acusação.

Rejeitando as várias acusações de corrupção passiva enquanto primeiro-ministro, José Sócrates negou ter defendido os interesses de Ricardo Salgado e do BES, ter tido qualquer intervenção na aprovação do empreendimento de Vale de Lobo ou na Oferta Pública de Aquisição da PT pela Sonae ou ter sido quem nomeou Armando Vara para a CGD.

"Nunca me encontrei com o dr. Ricardo Salgado antes de 13 de outubro de 2006. Dizem que fiz acordo entre 1 de março e 18 de abril", disse Sócrates, acrescentando que foi ver "o registo das entradas na residência do primeiro-ministro" e só em outubro houve uma reunião.

Sócrates negou ainda tido qualquer intervenção na aprovação de Vale do Lobo, no Algarve, alegando que "não conhecia os seus dirigentes nem os seus acionistas" e que nunca discutiu o assunto com ninguém. Também a acusação de que terá nomeado o antigo ministro Armando Vara para a administração da Caixa Geral de Depósitos (CGD) foi rejeitada, apontando essa decisão ao seu ministro das Finanças de então: Teixeira dos Santos.

"Não fui que o nomeei", afirmou, lembrando que Teixeira dos Santos já garantiu não ter sido pressionado, tendo a escolha sido decisão sua.

Sócrates negou também qualquer benefício às empresas do Grupo Lena, assegurando que o então administrador Carlos Santos Silva nunca lhe falou de nenhum concurso em que estivesse envolvido. Segundo adiantou, enquanto liderou o Governo, Sócrates nunca aceitou qualquer empréstimo do empresário com quem o Estado tinha negócios. "Isso seria censurável e eu não o faria", declarou.

Questionado sobre a razão pela qual os alegados empréstimos de Carlos Santos Silva eram feitos em numerário e não por transferência bancária, Sócrates considerou que se tratava de uma relação normal e que explicou que essa decisão lhe foi pedida pelo empresário.

"Não foi para ocultar de ninguém", afirmou, adiantando que "as quantias eram muito modestas", tendo apenas uma vez chegado aos cinco mil ou 7.500 euros.

O antigo primeiro-ministro negou ainda que o dinheiro tivesse sido usado para pagar férias, viagens, quadros ou roupas e justificou a fatura encontrada na sua casa de um quadro de Júlio Pomar com um acordo feito com Carlos Santos Silva.

"O engenheiro Carlos Santos Silva comprou um quadro de Júlio Pomar e, uns meses depois, eu convenci-o a trocar esse quadro por cerca de sete ou oito quadros que eu tinha em minha casa e que a mulher dele gostava mais. Isso é muito fácil de provar porque os quadros estão em casa dele", disse.

Sobre as contas na Suíça em nome de Carlos Santos Silva que tinham como beneficiário principal, em caso de morte, o primo de José Sócrates, João Paulo Pinto de Sousa, o antigo primeiro-ministro sublinhou não ter responsabilidades nos negócios entre os dois.

[Carlos Santos Silva] "era sócio do meu tio nas salinas de Benguela, que o meu primo vendeu a um familiar dele, Hélder Bataglia, negócio ao qual sou completamente estranho", afirmou.

"Eles abriram uma conta na Suíça, onde depositaram seis milhões de euros em nome de Carlos Santos Silva, mas cujo dinheiro só podia passar de facto para Carlos Santos Silva quando fossem vendidas as salinas", referiu.

No final da entrevista, José Sócrates considerou que "não vai sobrar folha sobre folha" desta acusação e disse que este processo foi excecional. "Quero que todos os portugueses saibam que este processo não foi justo, foi um processo excecional", afirmou, acrescentando que "o Direito não foi seguido para todos" e que Portugal "não é um Estado de Direito, é um Estado de exceção".

Sócrates, o antigo primeiro-ministro acusado de 31 crimes

O Ministério Público acusou na quarta-feira o antigo primeiro-ministro José Sócrates por 31 crimes, repartidos por corrupção passiva de titular de cargo político, branqueamento de capitais, falsificação de documentos e fraude fiscal qualificada.

A acusação sustenta que Sócrates recebeu cerca de 34 milhões de euros, entre 2006 e 2015, a troco de favorecimentos a interesses do ex-banqueiro Ricardo Salgado no GES e na PT, bem como por garantir a concessão de financiamento da Caixa Geral de Depósitos (CGD) ao empreendimento Vale do Lobo, no Algarve, e por favorecer negócios do Grupo Lena.

Além de José Sócrates, foram acusados na Operação Marquês o empresário Carlos Santos Silva, amigo de longa data e alegado testa de ferro do antigo primeiro-ministro, o ex-presidente do BES Ricardo Salgado, os antigos administradores da PT Henrique Granadeiro e Zeinal Bava e o ex-ministro e antigo administrador da CGD Armando Vara.

A acusação deduz um pedido de indemnização civel a favor do Estado de 58 milhões de euros a pagar por José Sócrates, Ricardo Salgado, Carlos Santos Silva, Armando Vara, Henrique Granadeiro e Zeinal Bava, entre outros arguidos.

No total, na Operação Marquês foram acusados 28 arguidos, 19 pessoas e nove empresas, por um conjunto de 188 crimes.

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