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"É um íman que me puxa. À chegada, esquecem-se todas as dores nos pés"

Há dores e bolhas nos pés e a emoção faz derramar lágrimas pelo caminho. Mas o sentimento é “inexplicável” e o “misto de emoções” compensa todo o sofrimento. O relato de quem percorre centenas de quilómetros em peregrinação até ao Santuário de Fátima.

Notícias ao Minuto

08:35 - 12/05/17 por Goreti Pera

País Peregrinação

Glória Cardoso tem 68 anos, mas não deixa que a idade a trave e que as pernas cedam. Desde 1976 que, quase ininterruptamente, faz uma peregrinação por ano até ao Santuário de Fátima. Já conta 40 peregrinações entre Lajeosa do Dão, em Viseu, e Fátima, a quase 200 quilómetros de distância.

É um íman que me puxa. Enquanto tiver forças para ir a pé, irei. É onde vou buscar energia para o resto do ano”, desabafa, manifestando a convicção de que todo o esforço vale a pena e de que o misto de sentimentos compensa o sacrifício.

“Sente-se algo mágico, que não se explica. É um misto de emoções muito grande. Durante os quatro dias de peregrinação, vêm à cabeça as alegrias, as tristezas, a família, os amigos e aqueles que já partiram. À chegada ao santuário esquecem-se todas as dores nos pés”, confidenciou ao Notícias ao Minuto.

No grupo de peregrinos que a acompanha, Glória é apelidada de “dinossauro das peregrinações”. É a mais velha peregrina e aquela que “motiva e dá alento” aos mais novos na caminhada. Assim a descreve Ana Parente, que herdou da irmã o gosto pelas peregrinações.

São dias em que esvaziamos a mente e nos libertamos de todas as responsabilidades. Apesar do sofrimento, quando chegamos ao santuário somos invadidos por uma paz inexplicável que nos alivia as dores”, explica.

No longo historial de peregrinações de Glória, há diferentes motivações. Já peregrinou por promessa e já o fez puramente por fé e prazer, tanto a propósito do 13 de maio, em que se celebra a primeira aparição de Nossa Senhora de Fátima aos pastorinhos, como por ocasião do 13 de outubro, que marca o Milagre do Sol.

Nos últimos anos, o grupo tem partido de Lajeosa do Dão a 7 de outubro, para chegar a Fátima no dia 10. São quatro dias de caminhada, com tempo para “meditar e refletir, rezar, cantar, rir e chorar”, sempre “com a casa às costas, como um caracol”.

“O essencial é levar roupa, medicamentos, lanterna, colete refletor, calçado suplente e linha e agulha para rebentar as bolhas nos pés”, aponta Ana no relato que faz da intensa aventura: “Vamos de mochila às costas, sem carros de apoio. Caminhamos até sítios onde podemos fazer refeições e dormir. Durante o dia, vamos ligando para residenciais ou hotéis e fazendo as reservas, mas também passamos algumas noites em habitações de apoio aos peregrinos ou casas de particulares, a quem damos uma pequena contribuição pela hospitalidade”.

"Ninguém fica para trás. Todos juntos somos um"

Entre peregrinos prevalece o lema ‘Ninguém desiste e ninguém fica para trás’. É assim para Ana e Glória, mas é assim também para Graça Viana, que cumpriu esta sexta-feira o sexto dia de peregrinação inserida num grupo de 43 pessoas que passará em Fátima o 13 de maio.

“O espírito do grupo é o espírito cristão: apoiar e não deixar ninguém para trás”, aponta a peregrina de 45 anos, natural de Pinhal Novo, no distrito de Setúbal, que aproveitou o centenário das aparições de Fátima para “cumprir um objetivo de vida e concretizar um sonho dos pais”.

“É a primeira vez que faço peregrinação. Sou devota de Nossa Senhora de Fátima e considero que é um caminho para a luz”, explica, adiantando que “a vinda do Papa Francisco não foi a motivação do grupo”.

“Sou escuteira e as caminhadas fazem parte do nosso trabalho ao longo do ano. Muitos dos meus colegas vão há alguns anos. Mesmo para quem está habituado, custa. Mas seguimos uma regra que nunca se quebra: um guia vai à frente com uma cruz e outro responsável vai atrás com uma bandeira. Os peregrinos vão todos entre a cruz e a bandeira, ninguém fica para trás, todos juntos somos um. E levamos sempre uma enfermeira”, contou Graça ao Notícias ao Minuto no dia em cumpriu metade da caminhada.

Enfermeira, é precisamente a profissão de Paula Parente, que conta com 10 peregrinações no currículo. “Há alguns anos, esperava pelas férias de verão para recarregar baterias. Agora, espero por outubro, pela peregrinação”, conta, relatando uma experiência que, admite, “não se faz com uma perna às costas”.

“Como sou enfermeira, tenho de tratar dos pés de toda a gente: furar bolhas, fazer pensos, almofadas as bolhas”, indica. Os passos que dá para percorrer os quase 200 quilómetros requerem alguns cuidados e fazem temer pela segurança.

“Gostava de poder ir ver o Papa Francisco, mas nos moldes em que nós vamos não é viável. As residenciais e hotéis estão lotados. Há muita gente e demasiada confusão”, justifica Paula.

“Há muita gente que, por muito que queira, não vai conseguir ver o Papa Francisco pessoalmente. Acabamos por não estar lá com a mesma concentração e tememos pela nossa segurança tendo em conta os ataques que estão a acontecer na Europa. Não podemos pensar que só acontece aos outros”, complementa Teresa Querido, peregrina do mesmo grupo oriundo do distrito de Viseu.

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