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Trocar o pé na areia pelas botas da sorte. "É onde me sinto realizada"

Conheça a história de quem prefere o dia num quartel dos bombeiros a um dia na praia ou na piscina.

Notícias ao Minuto

09:16 - 15/08/16 por Notícias Ao Minuto

País Ema Gomes

Numa altura em que Portugal enfrenta um período dramático em termos de incêndios florestais e em que os bombeiros, mais do que nunca, vestem a pele de soldados da paz, combatendo fogos de em toda a região do continente e ilhas, o Notícias ao Minuto falou com uma jovem bombeira que há sete anos troca o pé na areia pelas “botas da sorte”. Reserva parte do mês agosto para se dedicar a auxiliar a população naquilo que for preciso. 

Ema Gomes, de 23 anos e membro da conselho nacional do partido ecologista Os Verdes, é bombeira voluntária em Cernache de Bonjardim, concelho da Sertã, no distrito de Castelo Branco. Ingressou na corporação em 2009, tinha apenas 16 anos. “Entrei como cadete, um cargo que se prolonga até aos 18 anos e sem muita responsabilidade”, contou numa conversa com o Notícias ao Minuto. Essa fase, explica, “serve mais para puxar o bichinho que já se tem”.

E de onde veio esse 'bichinho'? “É coisa de família. O meu avô também era bombeiro, o meu irmão é”. Foi, aliás, o irmão quem deu o empurrão de que Ema precisava. “Disse-me ‘se queres mesmo ir para os bombeiros, assina aqui’”.

E assim foi, apesar de os pais terem torcido o nariz. Têm noção que é uma profissão de risco, até porque têm de perto o exemplo do avô paterno de Ema que, ao longo dos anos, foi tendo alguns acidentes. “Mas eu estava mesmo determinada e com 16 anos os pais já não podem dizer muitos 'não' [risos]”.

Chega o 'querido mês de agosto' e Ema, que durante o ano faz assessoria de imprensa n'Os Verdes, despede-se do Parlamento e da capital, ruma à terra natal e veste a camisola da paz. “Estas são as minhas férias ideais. Isto já é o meu verão há sete anos. Os meus pais estão sempre a dizer que nunca conseguimos ir à praia por causa dos bombeiros. Sempre que tiver um tempinho vou lá estar com certeza. Prefiro estar nos bombeiros, estar um dia inteiro no quartel a passar o dia na piscina ou na praia”.

Ema não tem qualquer dúvida sobre o que prefere fazer quando veste a camisola da corporação: “A parte que mais gosto é pré-hospitalar. É o que me enche de orgulho e o que me dá força depois para os incêndios”. Mas salienta que “todos” têm de saber fazer de tudo.

Particularmente sobre apagar fogos, Ema Gomes queixa-se de que as equipas de combate a incêndios, que muitas vezes atuam fora da sua zona de ação, noutros distritos, “são pau para toda a obra” e “nem sempre as condições são as melhores”.

“O esforço, as viagens, o cansaço acumulado ... o ser humano tem limites. Nem sempre temos refeições e, às vezes, se não fossem as populações a dar-nos água e comida, não conseguíamos”, destaca a jovem.

Falta de meios. "Quando toca a sirene, todos são chamados ao terreno, por isso todos deviam ter o mínimo dos mínimos"

Daquilo que Ema observa no terreno, “ser bombeiro em Portugal, ou se gosta muito ou então não vale a pena”. “A minha perceção pessoal é de que existem muitas falhas, nomeadamente nos equipamentos de proteção individual [EPI]. De há dois para cá tivemos um avanço, desde o ano em que foi preciso morrerem bombeiros”, lamenta, notando que os equipamentos, uma vez usados um ano inteiro, idealmente deveriam ser substituídos no ano seguinte. “E nenhuma corporação tem dinheiro para os repor todos os anos. O que acontece é que um EPI têm de durar eternamente”.

Dos equipamentos necessários, Ema destaca um em particular – as botas. Refere-se às suas como sendo “as botas da sorte”. “ Uma vez estragadas, entra água e, com o calor, o pé coze, literalmente, elucida-nos, lembrando que isso é o que costuma acontecer aos bombeiros que combatem fogos.

“Para mim, as botas são o equipamento mais importante. Mais do que a sede ou a fome, se não tiver os pés em condições não vou conseguir fazer o meu trabalho. Qualquer coisa que corra mal, vão ser os meus pés a fugir. Se tiver os pés confortáveis sei que posso fazer tudo. Quando toca a sirene, todos são chamados ao terreno, por isso todos deviam ter o mínimo dos mínimos”.

Diferença entre homens e mulheres? "Quando estou fardada somos todos iguais"

Nos bombeiros de Cernache de Bonjardim há cerca de 20 mulheres e uns 60 homens. E como é ser bombeira num quartel de homens? Ema responde com firmeza: “Quando estou fardada somos todos iguais”. Mas acrescenta a ideia de que o corpo humano masculino poderá ter mais força e uma maior resistência ao calor, mas as mulheres têm uma capacidade maior para desenrascar e para fazer várias tarefas ao mesmo tempo. Contudo, “no terreno não há diferença, porque é tudo uma questão de treino, de hábito e de formação. Todos temos de saber as mesmas coisas”.

E de que forma é que o trabalho n'Os Verdes, no Parlamento poderá ter uma ligação aos bombeiros? O trabalho n'Os Verdes é o meu lado profissional, estar nos bombeiros não é um passatempo nem um hobby.  É sim uma atividade em que me sinto realizada. Consigo juntar muito bem as duas coisas. Faz-me sentir na pele o que se está a fazer bem e o que falta fazer", explica Ema, adiantando que o trabalho enquanto bombeira lhe dá "espaço de manobra para sugerir alterações legislativas a nível dos bombeiros". 

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