A consulta pública da Estratégia Nacional de Educação para a Cidadania (ENEC) e das Aprendizagens Essenciais (AE) de Cidadania e Desenvolvimento, que decorreu entre 21 de julho e 05 de agosto, recebeu 10.120 contributos, revelou hoje o Ministério da Educação, Ciência e Inovação (MECI).
Sete em cada dez sugestões focaram-se na Estratégia Nacional de Educação para a Cidadania (7.073 contributos), sendo as restantes relativas às AE da disciplina.
Em resposta à Lusa, o MECI garante que a Direção-Geral da Educação (DGE) está agora "a analisar os contributos recebidos, a partir dos quais serão ponderadas alterações aos documentos colocados em consulta pública".
Na quinta-feira à noite, em entrevista à SIC, o ministro da Educação, Fernando Alexandre já tinha garantido que as sugestões seriam tidas em conta no processo.
"Até ao final do mês será submetida para apreciação do Conselho de Ministros uma Resolução para aprovar a Estratégia Nacional de Educação para a Cidadania" e serão também homologadas as Aprendizagens Essenciais de Cidadania e Desenvolvimento: "Ambos os documentos vão vigorar a partir de setembro, para o ano letivo 2025/2026", acrescenta hoje o MECI.
A decisão de rever a disciplina foi anunciada no ano passado pelo primeiro-ministro, que defendeu ser preciso libertar a disciplina de "amarras ideológicas".
Poucos dias depois, o ministro Fernando Alexandre explicou que a revisão se inseria num processo mais amplo que incluía todas as disciplinas.
A partir do próximo ano letivo, Cidadania e Desenvolvimento passa a ser regulada por Aprendizagens Essenciais, em linha com uma nova Estratégia Nacional de Educação para a Cidadania, que substitui os atuais documentos orientadores da disciplina.
Lançada em 2017 pelo ministro socialista Tiago Brandão Rodrigues, a Cidadania e Desenvolvimento funciona como área de trabalho transversal no 1.º ciclo, disciplina no 2.º e 3.º ciclos, e como componente de formação no secundário, cabendo às escolas decidir se é lecionada enquanto disciplina autónoma ou de forma multidisciplinar.
Essa organização não será alterada, mas os até agora 17 domínios, alguns obrigatórios e outros facultativos, passam a ser integrados em oito dimensões obrigatórias: Direitos Humanos, Democracia e Instituições Políticas, Desenvolvimento Sustentável, Literacia Financeira e Empreendedorismo, Saúde, Media, Risco e Segurança Rodoviária, e Pluralismo e Diversidade Cultural.
O novo guião da disciplina parece dar menos atenção a temas polémicos como a sexualidade, tratada apenas no contexto da saúde e da violação dos direitos humanos, e maior destaque à literacia financeira ou ao empreendedorismo.
Sem quaisquer referências às palavras "sexual" ou "sexualidade", a aparente ausência da Educação Sexual nas novas aprendizagens essenciais foi, desde logo, o tema que mais preocupou associações e especialistas.
Durante a consulta pública, multiplicaram-se as posições em defesa da educação sexual, com a Associação Nacional de Estudantes de Medicina, a Sociedade Portuguesa de Sexologia Clínica ou a Associação Portuguesa de Fertilidade a sublinharem o impacto comprovado na prevenção de comportamentos de risco e da violência de género.
Também a União de Mulheres Alternativa e Resposta e várias outras associações ligadas à defesa dos direitos humanos e das mulheres, como a Associação Portuguesa de Mulheres Juristas criticaram as mudanças.
A Ordem dos Psicólogos Portugueses recomendou a inclusão explícita da educação sexual e da saúde mental no currículo escolar, com aprendizagens progressivas desde o primeiro ciclo e conteúdos e ações adaptados às diferentes idades, considerando que, na proposta do executivo, "a referência à sexualidade nos currículos é restrita, limitada e tecnicamente imprecisa".
O ministro da Educação assegurou que os conteúdos relacionados com a educação sexual não desaparecem dos currículos e, na quinta-feira, em entrevista à SIC, afirmou que "se a formação para a educação sexual em Portugal dependesse da disciplina de Cidadania era um desastre".
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