"Todos os que tiveram responsabilidade na área da imigração, obviamente, têm nesta altura um sentimento comum: uma enorme preocupação pela polarização que se atingiu na sociedade portuguesa, quanto ao tema do acolhimento e integração dos imigrantes em Portugal, com todas as consequências daí decorrentes", afirmou à Lusa o antigo alto comissário Rui Marques, sobre a carta de princípios "Consenso Imigração", hoje apresentada.
"Parece-nos fundamental procurar caminhos de consenso, de propostas equilibradas, sensatas, justas e humanas, para um bom acolhimento, uma boa integração, uma boa inclusão dos imigrantes em Portugal", explicou o ex-dirigente do ACM.
Os elementos deste grupo de trabalho "sentem-se corresponsáveis com todos aqueles que hoje, no Governo ou na oposição, no Estado ou na sociedade civil, têm responsabilidades sobre esta matéria".
O objetivo é "encontrarmos as melhores soluções que são necessárias e que não se podem limitar à regulação de fluxos e à regularização administrativa das situações pendentes, mas também num foco muito relevante na questão da integração e de inclusão social dos imigrantes em Portugal", acrescentou.
"Num tempo marcado por discursos de medo, de simplificações e generalizações perigosas e de crescente polarização em torno do fenómeno migratório, afirmamos a necessidade urgente de construir um espaço de pensamento, diálogo e propostas que recupere o valor do consenso informado, da dignidade humana e da convivência intercultural", pode ler-se no documento hoje apresentado.
Portugal é um "país incontrolavelmente ligado a dinâmicas migratórias de entrada e de saída" e "enfrenta hoje uma crise demográfica com acentuado envelhecimento da população e necessidades de mão de obra cruciais para o contínuo desenvolvimento da economia e desenvolvimento social".
Por isso, este grupo de trabalho "nasce como um espaço de reflexão da sociedade civil, enquanto expressão plural e independente, reunindo pessoas e instituições, a partir de uma significativa diversidade política e ideológica, comprometidas com uma visão positiva, realista e humana da imigração em Portugal.
Na Carta de Princípios está a "dignidade humana como fundamento", o "conhecimento rigoroso como base para a ação", procurando combater a desinformação e a polarização.
Assinam esta carta de princípios quatro alto comissários, a ex-secretária de Estado Catarina Marcelino, as investigadoras Lucinda Fonseca e Catarina Reis Oliveira e os dirigentes associativos Eugénia Quaresma e Paulo Mendes.
No documento, os autores reconhecem os "contributos sociais, económicos e culturais das pessoas migrantes para o desenvolvimento do país", salientando que a "imigração legal, se bem gerida nos seus fluxos e devidamente integrada, não é uma ameaça, mas uma oportunidade de desenvolvimento para o país, que exige políticas públicas justas, realistas e inclusivas".
Nas próximas semanas, segundo Rui Marques, o grupo de trabalho vai apresentar propostas sobre políticas de integração do Estado e sobre os processos de reagrupamento familiar, uma matéria em que o Governo AD já disse querer novas regras, mais restritivas.
"Tem que ser possível introduzir uma dimensão de racionalidade na discussão sobre políticas de imigração", disse à Lusa Rui Marques, reconhecendo que "se percebe algumas das preocupações da sociedade de acolhimento" em relação ao acréscimo de imigrantes, que quadruplicaram desde 2017.
Esse crescimento "traz consigo um conjunto de desafios" e é "necessário introduzir aqui um diálogo racional, construtivo em torno de soluções que permitam regular a imigração e permitir boas dinâmicas de acolhimento e integração", defendeu.
Contudo, "enquanto existirem forças que exploram matemática da imigração para obter ganhos político-partidários, para fraturar a sociedade portuguesa, para dividir nós contra eles, será mais difícil esse caminho", disse ainda.
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