Este trabalho, da autoria de Trevor Sutton, investigador do Center on Global Energy Policy da Universidade de Columbia (EUA) e especialista em comércio, políticas industriais e clima, e Sagatom Saha, investigador da mesma instituição e especialista em geopolítica da transição energética, aponta o "efeito Bruxelas", ou seja, a capacidade de a União Europeia (UE) "influenciar normas globais, estendendo os efeitos da sua regulamentação além das suas fronteiras".
Segundo os autores este efeito "tem sido evidente nas políticas ambientais e de sustentabilidade, como é o caso do Pacto Ecológico Europeu (PEE), com o objetivo de descarbonizar a economia até 2050", lembrando que a ambição climática da UE começou a influenciar a sua política comercial, abrindo espaço para o "comércio verde".
No 'paper', que integra o estudo "A transição energética da Europa: equilibrar o 'trilema'", da Fundação Francisco Manuel dos Santos em parceria com a Brookings Institution, os autores alertaram que a liderança da Europa no domínio do comércio verde tem "enormes implicações globais", sendo que "se for bem-sucedida, pode inspirar outras economias a adotar práticas de sustentabilidade semelhantes; mas, por outro lado, pode aumentar tensões comerciais e penalizar economias emergentes", lê-se num comunicado.
Os autores acreditam que Bruxelas "precisa de equilibrar ambições climáticas e interesses comerciais", indicando que segundo a Organização Mundial do Comércio (OMC), 20% a 30% das emissões globais "estão ligadas ao comércio, principalmente à produção de bens como aço e alumínio, e ao transporte internacional".
Apontam que a "abertura da economia levou ao aumento das emissões entre os parceiros comerciais, nomeadamente por via do estímulo à procura de matérias-primas responsáveis por emissões de carbono elevadas e de produtos como os automóveis e os aviões".
Os autores relembram ainda que "a situação atual é um produto dos tempos", visto que "o sistema mundial de comércio moderno foi criado antes de a maioria dos governos terem tomado consciência das alterações climáticas".
O 'paper' lembra que a UE espera que "a transição energética impulsione o crescimento" e que o PEE ajude numa economia europeia moderna, mais eficiente e competitiva, mas realça que o apoio político a este pacto tem diminuído.
"Nas últimas eleições europeias, os apoiantes do PEE, incluindo os Verdes europeus, sofreram perdas eleitorais significativas, e o Partido Popular Europeu, o grupo político de Von der Leyen, tem criticado cada vez mais os objetivos climáticos e da energia limpa, argumentando que a carga e os custos da regulamentação associada à transição para as emissões líquidas nulas colocam as empresas europeias em desvantagem competitiva face à concorrência estrangeira", adiantaram.
Por outro lado, alertam para riscos relacionados com setores sujeitos a "regras mais rígidas", que "enfrentam custos elevados, e, sem mecanismos de compensação, podem perder competitividade global, ameaçando as aspirações e a eficácia da estratégia europeia".
Para os autores, a UE terá de "equilibrar políticas comerciais com a sua política geral em relação à China", que é "um importante mercado de exportação para os fabricantes europeus", mas, ao mesmo tempo, "uma ameaça à segurança europeia e à competitividade da indústria".
Também o sul global tem criticado as medidas europeias, acusando Bruxelas de "imperialismo regulatório" ou "protecionismo verde".
Já as relações comerciais com os EUA poderão agravar-se mais, tendo em conta que o país se retirou do sistema mundial de comércio.
Mas Bruxelas "não pode dar-se ao luxo de implementar uma política comercial que afaste simultaneamente os Estados Unidos, a China e o Sul Global", alertaram.
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