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"Estado não lhe entra pela casa dentro sem mais. Não a rouba"

António Costa explicou, em entrevista à TVI, algumas das medidas apresentadas esta quinta-feira pelo Governo para o setor da Habitação. E 'respondeu' a Cavaco: "Se a preocupação é ver pessoas da direita democrática, designadamente do seu partido, a ficarem condicionadas e limitadas pela ação do Chega, também acho perigoso."

"Estado não lhe entra pela casa dentro sem mais. Não a rouba"
Notícias ao Minuto

21:48 - 16/02/23 por José Miguel Pires com Lusa

País Habitação

Em entrevista à TVI nesta quinta-feira, António Costa explicou os contornos de algumas das medidas que o Governo apresentou para fazer face aos problemas no setor da Habitação, nomeadamente o programa de arrendamento compulsivo de imóveis vazios por parte do Estado, uma das várias medidas aprovadas em Conselho de Ministros no mesmo dia.

"O Estado não lhe entra pela casa dentro sem mais. O imóvel é seu, está vazio, porventura porque não tem dinheiro para fazer as obras, não quer arrendar, e o Estado diz: ‘Precisamos do seu imóvel e queremos arrendar a sua casa’. Mas tem toda a opção de dizer que não", explicou António Costa, sobre a medida que prevê que o Estado subarrende imóveis que estejam devolutos.

Questionado sobre se o proprietário é, ou não, obrigado a subarrendar o seu imóvel caso esteja vazio, António Costa disse: "O Estado só toma a posse administrativa se, ao fim de 'x' anos, as pessoas não colocarem a casa no mercado de arrendamento, e não há nenhuma razão para não o fazer, porque há muitas pessoas à procura de casa, e não é legítimo ter as casa vazias. Mas quando o Estado toma a posse administrativa, paga-lhe a renda a si. Não lhe rouba a casa. O Estado arrenda-lhe a casa e paga-lhe a renda."

Sobre se a medida poderá, ou não, ser inconstitucional, António Costa afastou a possibilidade, argumentando que "as normas sobre as obras coercivas já estão na lei há dezenas de anos". "Haveria [inconstitucionalidade] se o Estado ocupasse a sua casa, cobrasse a renda ao inquilino e não lhe pagasse nada. O Estado vai-lhe pagar a casa ao valor do mercado, subarrenda e, se [o Estado] fez obras, desconta na renda, porque, quando lhe entrega a casa, não é uma casa degradada, mas sim uma casa valorizada”, garantiu o primeiro-ministro.

Medidas não vêm com atraso

Questionado sobre se estas medidas surgem já de forma atrasada, António Costa rejeitou, argumentando que "o problema da Habitação foi-se agravando muito, muito rapidamente nos últimos anos".

"Agora, entre colocar o dinheiro no PRR, elaborar os projetos, fazer os concursos para as obras, pôr as obras para andar, isto leva tempo", continuou António Costa, ironizando: "Quando, em 2015, falamos de uma nova geração de políticas de Habitação, ninguém ligou nenhuma. Porque não era uma realidade bem definida. Quando investimos para aprovar a lei de bases da Habitação em 2019, ninguém deu atenção."

Taxa fixa = perigo?

O chefe de Governo falou ainda sobre a proposta do Governo de obrigar os bancos a oferecer taxas fixas na aquisição de créditos de Habitação para os seus clientes, afastando um possível perigo de que os bancos ofereçam taxas "exorbitantes".

"Neste momento há, pelo menos, um banco com taxa fixa razoável e há outros que estão a preparar o mesmo. Não é uma questão de bom senso da banca, é do interesse comercial, que é não perder clientes", considerou, considerando ser necessário "um equilíbrio entre a intervenção do Estado e o funcionamento do mercado", até porque fixar uma taxa fixa para todos "provavelmente dificultaria mais o problema do que deixando os bancos concorrerem entre si para oferecerem taxas fixas competitivas".

"É o momento para o país estar eufórico e feliz? Claro que não pode ser"

Portugal vive momento infeliz?

Sobre a consternação que se vive nas ruas, com greves de setores como os Transportes ou o Ensino, António Costa dispara: "É o momento para o país estar eufórico e feliz? Claro que não pode ser". Agora, a culpa é, principalmente, defende, da inflação, dos efeitos da pandemia da Covid-19 e da guerra na Ucrânia.

“As pessoas manifestam-se pelo seu estado de alma”, defendeu Costa, afastando qualquer pendor político nos movimentos de protesto que têm marcado a realidade no país nas últimas semanas, que se deve a que os professores tenham acumulado "15 anos de frustração".

António Costa comentou as queixas dos docentes, que têm estado em greve nas últimas semanas, acusando um "diálogo muito difícil sobre essa matéria", porque "as carreiras estiveram congeladas em dois momentos", ressalvando: "Não fui eu nem o meu Governo que congelámos, o que fizemos foi descongelar. Desde 2018 repusemos o relógio a contar."

"Aquilo que eu disse em 2018, e que mantenho, é que ia descongelar e que entregaria o país ao meu sucessor em condições de não ter de congelar outra vez a carreira dos professores", garantiu Costa, pedindo que não se deem "passos maiores do que a perna".

"Além de termos reposto o relógio a contar, nós conseguimos fazer contas para que os professores pudessem recuperar o equivalente de tempo que todos os outros funcionários tinham recuperado", sublinhou.

Instado a responder se o Governo pretende, "sim ou não", repor o tempo integral de serviço dos professores, António Costa respondeu que a pergunta "não é de sim ou não" e, se fosse, era "não".

"Acha justo, e há alguma razão para que eu possa fazer, para uma carreira específica, o que não posso fazer para todas as outras carreiras? O país tem de fazer opções", sublinhou.

Costa salientou que quase todas as carreiras estiveram congeladas, "com exceção das forças de segurança e Forças Armadas", e reiterou que o que foi recuperado para os professores "foi exatamente o mesmo que tinha sido contado para as outras carreiras".

"Se quiséssemos dar a todas as outras carreiras o equivalente aos seis anos, seis meses e 24 dias que os professores reivindicam, isso tinha um custo que era 1.300 milhões de euros de despesa permanente todos os anos", salientou.

O chefe do executivo reforçou que o custo não seria de "1.300 milhões de euros agora, era todos os anos".

"Naquilo que eu antevejo ser, e como sabe tenho fama de ser otimista, a evolução da situação financeira do país, eu não vejo que o país tenha condições para acrescentar 1.300 milhões de euros de despesa permanente para todo o sempre", disse.

O primeiro-ministro salientou ainda que a sua obrigação "não é chegar a acordo com os sindicatos, é resolver os problemas dos professores que se traduzem em problemas do país e do sistema educativo".

Sobre o desafio feito pelo secretário-geral da Fenprof, Mário Nogueira, para que António Costa participe nas negociações com os sindicatos, o primeiro-ministro salientou que já intervém, "todos os dias", nessas negociações.

"Cada vez que o senhor ministro da Educação se senta com os sindicatos, ou que o senhor secretário de Estado da Educação se senta com os sindicatos, sou eu, o ministro das Finanças, a ministra da Administração Pública... é todo o Governo que lá está. Esta ideia que cada membro do Governo é um bocado do Governo, não é assim", salientou.

Costa garantiu que, "quando o Governo fala, fala a uma só voz e a posição que o Governo transmite é a posição do conjunto do Governo".

O líder do Executivo vincou outras medidas aprovadas esta quinta-feira pelo Governo para ajudar as famílias a braços com o aumento do custo de vida, como a bonificação em 50% quando a taxa efetiva a pagar pelos detentores de crédito habitação exceder a taxa testada, ou seja, a percentagem encontrada pelo teste de stress que as instituições financeiras estão obrigadas a fazer.

Apontou também o mecanismo aprovado pelo Governo para beneficiar na amortização dos créditos, referindo-se à isenção das mais-valias quando haja a venda de uma casa e esse valor for aplicado na amortização do valor em dívida.

A situação até agora vigente obriga o detentor de mais-valias a aplicar as mesmas na aquisição de habitação no prazo de três anos, sob pena de ser aplicado o imposto.

"Só por um milagre os portugueses fariam uma avaliação positiva num contexto em que estamos a sofrer um pico inflacionista como há muito tempo não sofríamos"

Desorientação não é palavra que se possa empregar, diz Costa

O primeiro-ministro aproveitou ainda o espaço na entrevista para argumentar que os 'casos e casinhos' que marcaram o seu Executivo desde as eleições legislativas de janeiro de 2022 “foram incidentes lamentáveis que foram corrigidos", mas que "nem um tanque com o maior grau de blindagem está livre de incidentes".

Ainda assim, o foco é a "execução do programa", assegurou, disparando: "Só por um milagre os portugueses fariam uma avaliação positiva num contexto em que estamos a sofrer um pico inflacionista como há muito tempo não sofríamos."

Isso sim, defendeu, "desorientação" é uma palavra que não se pode empregar. Porque "uma coisa é haver problemas na composição da equipa", outra coisa é se existisse "instabilidade nas políticas".

Costa 'responde' a Cavaco Silva

"Não sei a que se referia concretamente Cavaco Silva. Perigosa em quê? E para quem? Cada um tem a sua forma de estar no poder. A minha é distinta, seguramente, da de Cavaco Silva. Eu tenho uma cultura democrática de respeito pelo direito de reivindicação e de greve, mas é um direito legítimo", assegurou António Costa, respondendo às palavras do antigo Presidente da República, que acusou algum "perigo" na atual situação política nacional.

Agora, com o Chega - o próprio primeiro-ministro trouxe à entrevista o partido liderado por André Ventura - "nada, nada, nada", garantiu, atirando a farpa de volta a Cavaco Silva: "Se a preocupação de Cavaco Silva é de ver pessoas da direita democrática, designadamente do seu partido, a ficarem condicionadas e limitadas pela ação do Chega, também acho perigoso."

Declarações sobre imigração? Costa diz estar "preocupado"

O primeiro-ministro admitiu ter ficado "um pouco preocupado" com as declarações de responsáveis sociais-democratas sobre imigração, manifestando-se convicto de que "o eleitorado do PSD nunca consentirá" que o partido se deixe "contaminar pelas ideias do Chega".

O primeiro-ministro referiu que tem chamado a atenção de que "um dos maiores problemas que existe hoje nas democracias liberais na Europa é a forma como esses movimentos de extrema-direita conseguem condicionar as direitas democráticas", acrescentando que o risco dos partidos de extrema-direita não é de se "tornarem maioritários", nem de "ganharem eleições", mas precisamente o de "condicionarem" os restantes partidos.

Neste ponto, Costa aludiu a declarações recentes do líder do PSD, Luís Montenegro, e do presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Carlos Moedas - sem nunca os mencionar -, mostrando-se "um pouco preocupado" ao ver "alguns líderes partidários do PSD a fazerem certos comentários sobre imigração".

"Fico um pouco preocupado, para ser sincero, mas acredito, e tenho a profunda convicção de que o PSD profundo, o eleitorado do PSD, nunca consentirá uma deriva do PSD que o leve a absorver ou a deixar-se contaminar pelas ideias do Chega, e que o Chega lá continuará no seu cantinho, devidamente acantonado, como deve estar", sublinhou.

Após a entrevista, em declarações nos bastidores transmitidas na CNN Portugal, Costa reforçou esta mensagem, reiterando a sua surpresa com o facto de "responsáveis do PSD" que participaram na reforma recente da lei da imigração dizerem "agora coisas como se desconhecessem o que é que a lei diz".

"O país precisa, obviamente, como todos temos consciência, de imigração. Há hoje um conjunto de funções essenciais na nossa atividade, na nossa sociedade, onde há uma enorme carência de recursos humanos e onde os recursos humanos vêm do exterior e com grande sucesso", destacou.

Costa reconheceu que "há problemas de integração que nem sempre são fáceis de resolver", mas salientou que "há verbas importantes no Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) para todas as autarquias, poderem investir na dotação do país de melhores condições habitacionais".

Continuando com a alusão às palavras de dirigentes do PSD, proferidas após um incêndio na Mouraria, em Lisboa, que provocou a morte de dois homens de nacionalidade indiana, Costa vincou que "não é cada vez que há um problema que se vai pôr tudo em causa".

"Houve um problema, é gravíssimo - perda de vidas humanas, falta de condições de habitabilidade -, é obviamente necessário reforçar as fiscalizações da Proteção Civil, as fiscalizações das condições de habitabilidade e, sobretudo, acelerar a execução dos investimentos que estão previstos", disse.

"Porque nós queremos que as pessoas trabalhem em Portugal, contribuam para o desenvolvimento da nossa economia, mas que possam viver com dignidade", disse.

[Notícia atualizada às 23h47]

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