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Buscas no resort de Trump. "O detergente da má justiça"

Um artigo de opinião assinado por Dantas Rodrigues, sócio-partner da Dantas Rodrigues & Associados.

Buscas no resort de Trump. "O detergente da má justiça"
Notícias ao Minuto

10:29 - 18/08/22 por Notícias ao Minuto

País Artigo de opinião

"Os EUA são pioneiros na criopreservação ou crioconservação, processo em que células ou tecidos biológicos são mantidos através de congelação a temperaturas negativas. Utilizando a técnica de ressuscitar mortos, o Departamento de Justiça, através da sua unidade de polícia de investigação (FBI), resolveu acordar Donald Trump, 45.º presidente daquele país, de uma espécie de stand-by eleitoral em que se encontra na Flórida. 

O FBI, autorizado por um juiz federal, foi à sua casa de Mar-a-Lago, em Palm Beach, em busca de provas específicas, discos rígidos de computador e outros suportes de informação, a fim de o poderem acusar de crimes contra o Estado por posse ilícita ou abusiva de documentos que guardou dos tempos em que chefiava o Estado americano. O momento não podia ser mais apropositado, já que, em Novembro próximo, terão lugar as eleições intercalares que irão ditar o controlo do Congresso. Os polícias encontraram onze pastas de expediente classificado, quatro com a categoria de "muito secreto", três com a categoria de "secreto" e mais três com a categoria de "confidencial", todos esses documentos destinados a serem apenas consultados em instalações especiais do governo, ou seja, nos respetivos Arquivos Nacionais.

O governo dos EUA, como qualquer governo de outro país qualquer, tem três níveis principais de classificação das suas papeladas, níveis esses que, por ordem crescente, refletem a sensibilidade dos conteúdos de que tratam. O facto de serem classificadas, significa que o seu uso indevido poderá eventualmente causar danos à segurança nacional. 

As provas, no caso concreto a prova judicial que possa vir a resultar de uma análise pericial dos documentos apreendidos, criará a convicção, sobretudo nas televisões e outros meios de comunicação social, de que a condenação de Donald Trump é mais que provável. E, se assim for, isto é, se a prova for clara e convincente para os juízes, a probabilidade de vir a ser condenado é de 75 por cento, face àqueles em que a prova é precária.

Haverá algum magistrado nos EUA que condene um ex-presidente por levar consigo e guardar em sua casa documentos respeitantes ao seu mandato? Não creio que coisa semelhante seja possível

Mas será mesmo assim? Haverá algum magistrado nos EUA que condene um ex-presidente por levar consigo e guardar em sua casa documentos respeitantes ao seu mandato?

Não creio que coisa semelhante seja possível, por pertencer ao âmbito dos poderes do presidente classificar ou desclassificar unilateralmente qualquer tipo de documento antes de deixar o seu cargo. Por outro lado, nenhuma lei federal proíbe a posse de documentos desclassificados. A Lei de Espionagem, quanto à guarda dos mesmos por parte de um ex-governante, constitui uma norma de conduta ambígua, imprecisa. Para haver crime teria de existir segurança jurídica, o mesmo é dizer, teria de ser mais precisa a redação da dita lei, proibindo liminarmente a posse de documentação considerada confidencial. A justiça penal, para ser equitativa, tem, em primeiro lugar, de ser legal. Não o sendo, então tudo não passa de uma intolerável intervenção do Departamento de Justiça.

Donald Trump sabe pisar com cuidado terrenos que se encontram, política e socialmente, minados. Sabe muito bem que não deve submeter-se a interrogatórios, como o fez ao recusar responder às perguntas formuladas por Letitia James, procuradora-geral de Nova Iorque, a respeito de um inquérito civil sobre suspeitas de irregularidades financeiras e fiscais praticadas pelo grupo empresarial de que é proprietário, e no decorrer do qual poderiam ser recolhidos indícios para uma eventual acusação por ter prestado informações falsas sobre o valor do património societário imobiliário, ora inflacionando-o para obter condições mais favoráveis em empréstimos bancários e seguros, ora subvalorizando-o para obter incentivos fiscais.

Assim resguardou-se na 5.ª Emenda para não prestar declarações no inquérito. As Emendas são alterações à Constituição de 1789, sendo as dez primeiras uma Carta de Direitos ('Bill of Rights'), porquanto oferecem um leque de privilégios e de garantias a todos os cidadãos americanos.

A 5.ª Emenda "salvaguarda os cidadãos de serem sujeitos a processos criminais sem conhecerem os factos e as provas de que são acusados, e atribui o direito de permanecerem em silêncio, protegendo-se da auto-incriminação." O estar em silêncio, para o Supremo Tribunal Federal, não pressupõe a culpa.

Pode não se gostar de Donald Trump por ser um ultraconservador, pelas suas simpatias por déspotas como Vladimir Putin, por ter conseguido a anulação do Direito à Interrupção Voluntária da Gravidez após 50 anos da sua prática, por defender a posse de armas pelos cidadãos como um direito fundamental à sua defesa e por, sistematicamente, dar instruções ao Partido Republicano para bloquear qualquer legislação ambiental. Mas nada disso legitima o 'lawfare' (uso das leis, do sistema de justiça para fins de perseguição política e, consequentemente, para destruição da imagem pública).

Nicolau Maquiavel escreveu no seu famoso livro intitulado 'O Príncipe' o seguinte: "Há duas maneiras de lutar: ou com força ou com as leis". Agora, cinco séculos volvidos, procura-se as leis, limpa-se as mãos e afugenta-se o adversário com o detergente da má justiça."

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