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Se o cachalote tivesse sido rebocado para alto mar, teria sobrevivido?

Uma carta aberta ao ministro do Ambiente e da Acção Climática e ao Presidente do ICNF avança com sugestões de protocolo para situações como a do cachalote que morreu na praia da Fonte da Telha.

Se o cachalote tivesse sido rebocado para alto mar, teria sobrevivido?
Notícias ao Minuto

19:43 - 19/04/22 por Marta Amorim

País cachalote

Sexta-feira Santa, feriado em Portugal, temperaturas perto dos 25ºC e praias cheias em Portugal. 

Avizinhava-se um dia de praia memorável, mas na Fonte da Telha, Costa da Caparica, uma desgraça começou a formar-se cerca das 6h da manhã, quando um cachalote foi avistado demasiado perto da costa. 

A Polícia Marítima ainda tentou encaminhar o animal para águas mais profundas, mas tal não foi possível. Permaneceu na rebentação durante horas até ficar totalmente encalhado. Morreu por volta das 21h30, perante os olhos de população que ali se juntou todo o dia. 

Pelo menos 11 entidades, na sua maioria organizações não governamentais e de cariz ambiental, escreveram uma carta aberta ao ministro do Ambiente e da Ação Climática e ao Presidente do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), na qual avançam com sugestões de protocolo para este tipo de situações. 

A carta sugere que neste tipo de casos "seja autorizado o transporte – por reboque - do animal para mar alto, uma vez que tendo probabilidade de morte elevada, a mesma não será mais baixa ou menos dolorosa se permanecer em terra, encalhado, com todo o stress e colapso de órgãos internos associado", pode ler-se. Este processo foi proposto por vários pescadores que se encontravam na local, mas tal não foi autorizado pela Polícia Marítima que estava em coordenação com o ICNF. 

O ICNF, autoridade responsável neste tipo de casos, apareceu no local 10 horas depois do alerta. 

Sofia Silva, Science Coordinator da Sea Shepherd Portugal, - movimento internacional de ação direta de conservação do oceano - diz que esperavam  "uma atuação mais célere e eficaz [por parte do ICNF] no que diz respeito à presença de efetivos no local e ao bem-estar do animal".

No entanto, ressalva Sofia Silva em declarações ao Notícias ao Minuto, "o que acabou por acontecer também foi de encontro ao ocorrido em muitas situações similares". "Situações destas são por si só indicativas de que o animal não se encontrava bem, fosse por causas naturais, humanas ou mistas", revela a responsável, ressalvando que o desfecho "estaria dependente das condições de saúde do animal, algo difícil de concluir apenas por observação parcial". 

"Por vezes existem problemas/lesões internas determinantes que nem sempre são percetíveis pelo exterior. Dessa forma não conseguimos dizer se o desfecho poderia de facto ter sido outro que não a morte. O que podemos afirmar é que o processo pelo qual o animal passou poderia ter sido bem diferente", continua. 

Por diferente, refere-se à "coordenação e cooperação entre as entidades competentes e até o envolvimento de entidades/organizações privadas que estavam no local, prontas a ajudar". "Portugal é um país de muito papel e pouca ação", diz, afirmando que não são raros os casos em que animais são encontrados em situações aflitivas de luta pela sua sobrevivência.

Nestes casos, "agentes marítimo-turísticos – que passam grande parte da sua vida no mar" não podem sequer intervir e tentar libertá-los, "sem que seja pedida autorização ao ICNF", com pena de serem gravemente multados caso desrespeitem este processo.

Nesta situação, frisa, "cada segundo conta", e não existe a possibilidade de "espera de se atender uma chamada ou aguardar que os órgãos responsáveis apareçam no local", sendo que "inúmeras vezes nem sequer acontece".

Neste sentido, e como é apontado na carta aberta aos órgãos competentes, este grupo de especialistas quer "estar ao dispor para criar pontes e lutar" para "proteger os oceanos".

O que mudaria caso o cachalote fosse rebocado para mar aberto?

Neste caso em específico, "passaram-se cerca de 16 horas, desde o avistamento do animal até à sua morte". Segundo a especialista, as horas seguintes imediatamente ao seu avistamento "seriam determinantes, não só para o sofrimento do animal como para a problemática da exposição a risco biológico para a população – potencial de zoonoses, doenças transmissíveis de animais para humanos)". 

Mas, rebocando o animal para mar aberto, isto não quer efetivamente dizer que este não poderia voltar a aproximar-se da costa posteriormente.

"Mas tal poderia também não acontecer", refere. "Nem todos os cetáceos que morrem no mar, dão à costa. Na verdade, estima-se que tal apenas aconteça com 8-10%, algo que por si só nos deveria fazer pensar, tanto nos números de arrojamentos como na sua tendência crescente ao longo dos ano", afirma a science coordinator. 

Muitos acabam por afundar ou ser predados por outros animais, fazendo  "parte da cadeia alimentar, mas também de todo um ecossistema". "Se a morte fosse realmente inevitável, acreditamos que este seria o cenário ideal para o final deste animal", frisa. 

Na eventualidade de se repetir o arrojamento após transporte para longe da costa, e sendo baixas as hipóteses de ainda estar vivo, poder-se-ia "garantir é que nesse caso não teria morrido após horas de stress e agonia extrema por esmagamento interno dos seus órgãos - os cetáceos não conseguem suportar a pressão do seu peso contra o chão".

Após o arrojamento, o procedimento seria o normal: sinalização, recolha de amostras/possível necropsia local e remoção do corpo do animal, ressalvando a responsável que para esta última etapa "ainda não existem opções ideais, sendo a colocação num aterro a mais utilizada, apesar de todos os riscos para a saúde pública inerentes". 

Contactado pelo Notícias ao Minuto, o ICNF remeteu esclarecimentos para mais tarde. 

Leia Também: Cadáver da baleia que arrojou na Fonte da Telha totalmente removido

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