Transição para vida civil explica insatisfação com serviço militar
A formação obtida nas Forças Armadas e as dificuldades de reinserção no mercado de trabalho são os "fatores críticos" que explicam a insatisfação dos jovens com o serviço militar, defendeu hoje a professora universitária Helena Carreiras.
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País Helena Carreiras
"O salário, sendo importante, não é o fator crítico do ponto de vista da ação, ou seja, não se resolvem problemas atirando dinheiro para cima deles, é o que estes dados também significam", afirmou a professora universitária, especialista em sociologia militar, que coordenou um estudo sobre a satisfação organizacional dos voluntários e dos contratados das FA, no qual foram ouvidos 5.136 elementos do Exército, 1.366 da Força Aérea e 819 da Marinha.
Helena Carreiras, que apresentou hoje o estudo no seminário "Serviço Militar: Escolher um futuro", que decorre em Lisboa, afirmou que os dados revelaram "uma erosão da motivação dos militares contratados ao longo do tempo nas Forças Armadas".
"A insatisfação é sobretudo relativamente à experiência e ao percurso profissional, à qualidade da formação que recebem, à adequação dessa formação às tarefas que desempenham, à valorização, que não é percecionada, para enfrentar o mercado de trabalho em boas condições", afirmou, em declarações aos jornalistas.
Por outro lado, sobressaíram "críticas em relação às condições de trabalho" e a perceção de que "o que explica o nível de satisfação são os fatores associados à formação e à qualificação".
Neste campo, disse, "há a necessidade de atuar ao nível da formação que é dada aos jovens de forma a poderem ter percursos profissionais completos e coerentes" e que permitam uma mais bem sucedida transição para a vida civil depois de terminado o serviço militar, cujos contratos tem a duração de seis anos, com possibilidade de se prolongarem até 18 anos, em categorias e funções a determinar pelos ramos.
Helena Carreiras sublinhou que "o mais importante é atuar sobre a prestação do serviço militar" porque isso "é o que vai determinar a imagem positiva ou negativa e influenciar os níveis de retenção e a capacidade de atração das Forças Armadas".
O estudo demonstrou ainda que, ao nível da insatisfação dos jovens com o serviço militar, há "diferenças importantes entre os ramos e entre categorias -- oficiais, sargentos e praças -- uma realidade que se observa também noutros países europeus, sublinhou.
"Os jovens que vão para a Força Aérea valorizam muito mais as qualificações e o seu percurso profissional ao passo que no Exército o fator da proximidade da residência é o fator mais importante. Na Marinha adquire igual importância a questão da obtenção das qualificações profissionais e o tipo de missões desenvolvidas pelo ramo", disse.
"Sendo o Exército o ramo mais indiferenciado do ponto de vista da variedade de posições e situações e ocupações que oferece, os problemas são sentidos com muito mais intensidade", acrescentou.
A professora universitária alertou que o estudo permitiu perceber que "o que leva os jovens às Forças Armadas são fatores de carater intrínseco" às características da instituição militar e das missões.
"Se não somos capazes de sustentar o percurso profissional dos jovens de forma valorizadora, esse potencial de empenhamento inicial que existe pode perder-se e isso é uma pena, é uma lástima", sublinhou.
O que tem acontecido, disse, é que os jovens "entram motivados mas detetam incongruências entre as expetativas e a realidade" que encontram, acabando por sair com uma "imagem mais negativa" o que sugere que há "ajustamentos a fazer" por parte dos ramos.
Um dado importante, sublinhou, é que 15 anos depois do fim do Serviço Militar Obrigatório, há a necessidade de "revalorizar a instituição militar, no Estado e na construção da democracia", estando em causa a "qualidade da relação entre as Forças Armadas e a sociedade".
Para Helena Carreiras, o "plano de ação para a profissionalização das Forças Armadas", hoje apresentado no seminário, é "um passo de gigante" para melhorar a atratividade e a retenção dos jovens na carreira militar.
No âmbito daquele plano, foi também assinado um "acordo de cooperação interministerial para a profissionalização" entre a secretária de Estado da Defesa Nacional, Ana Santos Pinto, e o secretário de Emprego, Miguel Cabrita, e a secretária de Estado Adjunta e da Educação, Alexandra Leitão.
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