Família portuguesa dá a volta ao mundo com insuficiência renal na bagagem
Casal vendeu tudo e partiu à descoberta do mundo com um bebé de dois anos. A viagem vai ser documentada num blog para inspirar outros doentes renais.
© Instagram / All Aboard Family
País Viagens
Filipe tinha apenas 12 anos quando descobriu que sofria de Nefropatia por IGA, uma doença autoimune, crónica e sem cura que afeta os rins. Durante anos foi controlando os valores da creatinina, experimentou várias terapêuticas, inclusivamente com cortisona, mas, com o aproximar dos 30, os rins deixaram de filtrar toda e qualquer substância, e foi-lhe diagnosticada insuficiência renal. A partir daí começou a fazer hemodiálise, três vezes por semana, quatro horas por dia...
Apesar dos tratamentos e dos cuidados que tem de ter com a alimentação, Filipe encarou a doença, nunca abdicando da felicidade e de concretizar os seus sonhos. E a prova está na aventura que abraçou, na passada sexta-feira, com a companheira, Catarina, e o filho, Guilherme, de dois anos.
O casal alfacinha e o pequeno Gui partiram para a aventura de uma vida. Vão dar a volta ao mundo e, até março de 2020, querem passar por todos os continentes e visitar cerca de 30 países.
Nos primeiros dias desta peripécia, o casal falou com o Notícias ao Minuto. A partir das Bahamas, Filipe confessou que sempre gostaram de viajar, mas que a decisão propriamente dita partiu de um impulso.
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“Desde que nos conhecemos que começámos a viajar e a explorar o mundo a dois. Eu sempre fui mais aventureiro e já pedia à Catarina há muito tempo para irmos viver para Bali. A Catarina trabalhava numa multinacional, num serviço de apoio ao cliente que adorava e tem uma ligação muito forte à família. Um dia chegou mais chateada a casa e disse-me: ‘Filipe, já decidi. Vamos dar a volta ao Mundo’. Nesse mesmo dia, fomos comprar um mapa gigante para começarmos a planificar”, recorda.
Contudo, depois do impulso, veio o planeamento. É que, apesar da doença de Filipe não ser impeditiva de realizar este sonho e ter uma criança ainda bebé também não o ser, uma viagem com estes contornos tem ser “pensada ao pormenor”.
“Não podemos sair de mochila às costas e ir mudando de sítio conforme queremos. Tudo tem uma logística e, por sorte, temos o apoio da Diaverum [multinacional de origem sueca presente em Portugal] que nos está a dar suporte em tudo o que está relacionado com a hemodiálise. Primeiro, temos de pensar para onde queremos ir, depois temos de ver se existe ou não hemodiálise e se pode ou não ser um local de risco para evitar o contágio de outras doenças”, conta Filipe, sublinhando que é às vezes onde menos esperamos que surgem problemas.
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É o caso de Toronto, no Canadá. “Por incrível que pareça”, foi nesta cidade, que visitou antes de iniciar a volta ao mundo, que encontrou os piores tratamentos de hemodiálise. Contudo, parece que não é preciso sair de Portugal para doentes com insuficiência renal terem problemas. Filipe assegura que o nosso país é “um dos melhores do mundo em tratamentos de hemodiálise, mas a nível do Sistema Nacional de Saúde, fora da clínica onde é atendido, “há pouca ajuda e muita burocracia”.
Já sobre o pequeno Gui, o antigo guia turístico garante que “viajar com crianças é mais simples do que se pensa”, desde que se viaje com “uma boa farmácia na mala” e que se tenha alguns cuidados extra, o truque “é descomplicar”.
E foi descomplicando que o casal decidiu entrar nesta aventura. Catarina despediu-se do trabalho onde estava há dez anos, venderam o 'tuk tuk' no qual Filipe mostrava a cidade aos turistas e a casa, e colocaram o plano em andamento.
Complicado foi a família aceitar tamanha “loucura”. Apesar de os apoiarem, não concordam com a aventura e para a mãe de Catarina está a ser difícil lidar com a distância.
“A nossa família pensou que estávamos loucos. Foi um processo muito difícil para a minha mãe. Ainda o é, mas já está a conseguir, lentamente, ultrapassar. Para o meu pai e para os pais do Filipe foi algo com que não concordaram, mas que nunca nos deixaram de dar apoio e de ajudar no que fosse preciso. A minha relação com a minha mãe é muito forte e, para ela, ficar longe de nós e do Guilherme é algo muito difícil. Vai ter de aprender a lidar com saudades, mas tenho tentado, de alguma forma, tranquilizá-la. É normal, faz parte do processo...”, revela Catarina.
E já que falamos em amor, o Notícias ao Minuto quis saber como é que se mantém uma relação amorosa perante uma doença como a do Filipe.
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“Continua a ser tudo igual. Nada mudou na nossa relação porque quando se ama, ama-se com o coração e não com os olhos. O Filipe continua a ser para mim a mesma pessoa que era há nove anos e amo-o ainda mais. Estamos os dois juntos em tudo o que fazemos e em tudo o que acontece nas nossas vidas. As pessoas riem-se quando dizemos expressões como ‘estivemos grávidos’, ‘quando vamos para o tratamento’, porque vemos sempre as coisas como sendo da relação e não de um ou do outro”, sublinha.
E foi essa paixão que deu origem ao All Aboard Family, um projeto pensado a dois, que segundo o casal, tem tudo a bordo: “A doença, o bebé, o sonho, a família e a aventura”. O objetivo é dar ao pequeno Guilherme um diário com memórias para mais tarde recordar e inspirar todos os doentes renais a viver e a viajar. “Mostrar que podem correr atrás dos sonhos e que não existem limites nem limitações, que está tudo na nossa cabeça”, nota Filipe.
Apesar de não pensarem “muito” no futuro, porque segundo Filipe, “podem surgir muitas oportunidades”, quando voltarem o casal quer escrever um livro sobre a experiência e organizar workshops para ajudar famílias a planificar viagens.
O dia a dia da aventura desta família pode ser acompanhado através do blog All Aboard Family e da conta de Instagram.
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