Violência doméstica: Neto de Moura transferido. 'Capítulo' encerrado?
O juiz Neto de Moura deixará de julgar casos de violência doméstica, uma decisão do Tribunal da Relação do Porto conhecida esta quarta-feira. Entretanto, os números de mulheres mortas às mãos dos maridos/companheiros voltou a subir.
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País Justiça
Neto de Moura já havia pedido, no ano passado, para deixar de julgar casos de violência doméstica, pelo menos durante um tempo. O pedido foi, no entanto, recusado pelo Supremo Tribunal de Justiça, num acórdão que data de 14 de junho de 2018.
Volvido meio ano e conhecido novo acórdão polémico – e que culminou com a decisão de Neto de Moura de processar todos os que o criticaram publicamente, desde políticos a humoristas -, o Tribunal da Relação do Porto (TRP) acabou por decidir transferir o juiz da secção criminal para a secção cível, afastando assim o desembargador dos casos de violência doméstica.
Neto de Moura, que se encontrava na 1.ª secção criminal, recorde-se, tem sido criticado por decisões judiciais em casos de violência doméstica.
Num dos casos, o juiz desembargador Neto Moura foi autor de um acórdão em que minimizou um caso de violência doméstica pelo facto de a mulher agredida ter cometido adultério.
No acórdão, datado de 11 de outubro de 2017, o juiz invocou a Bíblia, o Código Penal de 1886 e até civilizações que punem o adultério com pena de morte, para justificar a violência cometida contra a mulher em causa por parte do marido e do amante, que foram condenados a pena suspensa na primeira instância.
"O adultério da mulher é uma conduta que a sociedade sempre condenou e condena fortemente (e são as mulheres honestas as primeiras a estigmatizar as adúlteras) e por isso vê com alguma compreensão a violência exercida pelo homem traído, vexado e humilhado pela mulher", lê-se na decisão do tribunal superior, também assinada pela desembargadora Maria Luísa Abrantes.
Na sequência deste caso, o Conselho Superior da Magistratura instaurou um processo de inquérito, tendo deliberado aplicar ao juiz a sanção de advertência registada.
Num outro caso, noticiado mais recentemente, surgiram críticas à decisão do juiz desembargador Neto de Moura de mandar retirar a pulseira eletrónica a um homem que foi condenado pelo crime de violência doméstica, depois de ter rompido o tímpano à companheira com um soco.
No acórdão, o juiz do Tribunal da Relação do Porto alega que os colegas que condenaram o agressor a usar pulseira eletrónica não justificaram na sentença a necessidade imprescindível de aplicar essa medida para proteger a vítima.
"Manifesta conveniência de serviço"
O presidente do Tribunal da Relação do Porto (TRP) justificou com a "manifesta conveniência de serviço" a transferência do juiz da secção criminal para a cível, onde não são julgados casos de violência doméstica.
No despacho, a que a agência Lusa teve acesso, o presidente do TRP, Nuno Ataíde das Neves, refere que a mudança de Joaquim Neto de Moura da 1.ª secção criminal para a 3.ª secção cível daquele tribunal superior foi uma medida que "obteve a concordância" do juiz desembargador.
Na decisão com data de 6 de março, comunicada aos restantes desembargadores do TRP e ao Conselho Superior da Magistratura, Nuno Ataíde das Neves salienta que, tal como prevê a Lei da Organização do Sistema Judiciário, cabe ao presidente do Tribunal da Relação distribuir os juízes pela secção tendo em conta o seu grau de especialização, a conveniência do serviço e a preferência manifestada.
"Considerando aqueles critérios, assume-se com especial relevância o da conveniência de serviço, em ordem à preservação da confiança dos cidadãos no sistema de justiça", fundamenta o presidente daquele tribunal superior.
Políticos e humoristas alvo de processos
Perante a enxurrada de críticas em relação às decisões polémicas do juiz, Neto de Moura vai avançar com processos contra todos aqueles que, publicamente, mancharam a sua honra pessoal e profissional.
Na lista negra cabem nomes como Mariana Mortágua, Joana Amaral Dias, Ricardo Araújo Pereira e Bruno Nogueira. Todos os visados reagiram à intenção do desembargador sem retirarem uma vírgula às críticas anteriores. O humorista Ricardo Araújo Pereira não só reafirmou o que havia dito como ainda foi mais longe criando um jogo ‘Salve o Neto’.
Toda a polémica em torno de Neto de Moura tem mantido o tema da violência doméstica na ordem do dia e a notícia do afastamento do juiz do julgamento destes casos acontece no dia em que mais uma mulher foi assassinada pelo marido, em Vieira do Minho. A mulher, com cerca de 40 anos, foi estrangulada até à morte, no início da noite de quarta-feira, na casa onde vivia com o marido em Salamonde.
Uma outra mulher foi esta quarta-feira encontrada morta, no hall de um prédio, em Corroios, estando a Polícia Judiciária a investigar o caso. A hipótese de a morte ter ocorrido em contexto de violência doméstica parece estar, no entanto, para já, afastada.
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