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As (quatro) cientistas portuguesas que querem melhorar a vida de todos

Num momento em que a atualidade debate cada vez mais a mulher e o seu papel na sociedade, há mais quatro portuguesas em destaque. Os seus projetos na área da saúde e ambiente são os grandes vencedores da 15.ª edição das Medalhas de Honra L’Oréal Portugal. Venha conhecer as cientistas Patrícia Costa Reis, Diana Madeira, Joana Cabral e Joana Caldeira, e os seus projetos inovadores.

Notícias ao Minuto

09:45 - 27/02/19 por Ana Lemos

País Prémios

Será que a ativação crónica do sistema imunitário nos doentes com lúpus pode estar relacionada com a permeabilidade do seu intestino? E a matemática será capaz de representar as redes funcionais em que se organiza o cérebro humano? Poderá a tecnologia ajudar a regenerar os discos intervertebrais? Conseguirão os organismos marinhos adaptar-se, ao longo de gerações, a um oceano pressionado pelas alterações climáticas e pela poluição?

Na 15.ª edição das Medalhas de Honra L’Oréal Portugal foram distinguidos os projetos científicos de quatro portuguesas que procuram respostas a estas dúvidas na área do lúpus, dos discos intervertebrais, das redes cerebrais e da vida nos oceanos. E apesar de serem de regiões bem diferentes do país têm um objetivo comum: melhorar a qualidade de vida da população.

Com esta distinção, que já premiou 49 mulheres, a L’Oréal Portugal quer não só apoiar pesquisas inovadoras no feminino e motivá-las a prosseguir estudos relevantes nas áreas da saúde e ambiente, contribuindo, em simultâneo, para “inspirar uma ciência e uma sociedade mais inclusiva e equitativa destacam na ciência”.

De referir que as quatro investigadoras - doutoradas e com idades entre os 30 e os 36 anos - foram selecionadas entre mais de 70 candidatas e entraram, assim, para o leque de mais de três mil cientistas que já foram apoiadas pelo programa L’Oréal-UNESCO para as Mulheres na Ciência em 117 países.

Quem são as quatro cientistas e os caminhos inovadores que estão a trilhar

Patrícia Costa Reis, a pediatra e professora de Lisboa, quer perceber se os doentes com lúpus têm uma maior permeabilidade do intestino. O que, a confirmar-se, poderá ser responsável pela passagem de bactérias aí existentes (no intestino) para a circulação sanguínea e, assim, contribuir para a ativação crónica do sistema imunitário. O lúpus, sublinhe-se, é uma doença autoimune complexa, na qual o sistema imunitário está cronicamente ativado e ataca o próprio organismo.

Ao analisar a permeabilidade do intestino e o conjunto dos microrganismos ali existentes, poderá estabelecer as bases necessárias para novas estratégias terapêuticas, como antibióticos ou vacinas que alterem o microbioma, e ajudem a controlar o sistema imunitário e a atividade da doença.

Além da importância destes dados (...) para o desenvolvimento de novas formas de tratamento mais eficazes e com menos efeitos adversos, a confirmar-se esta relação, terá também impacto do ponto de vista científico, pois permite re-equacionar a forma como pensamos a autoimunidade e levará a novos estudos noutras doenças deste foroMelhorar o controlo do lúpus e a qualidade de vida dos doentes é o objetivo de Patrícia Costa Reis que, enquanto investigadora, professora e pediatra, conhece bem o impacto do lúpus e dos efeitos dos medicamentos hoje usados na vida dos doentes, em particular nas crianças. Dor crónica, fadiga, depressão, consultas recorrentes e internamentos são algumas das razões que contribuem para uma vida diferente, em que o insucesso escolar nos mais novos e o desemprego nos mais velhos são ainda elevados.

Diana Madeira, a investigadora no CESAM/ECOMARE, quer compreender o modo como, ao longo de várias gerações, os organismos marinhos estão a responder às alterações climáticas e à poluição. A sua pesquisa visa conhecer os mecanismos moleculares e celulares que os invertebrados marinhos induzem para responder a estas pressões ambientais e de que forma esses mecanismos estão relacionados com a sua capacidade de sobrevivência e o seu sucesso reprodutivo. Até porque, sublinha, a maioria dos estudos realizados até então têm analisado apenas o que sucede aos organismos marinhos ao longo de uma geração.

“Este limite temporal implica outros limites, quer os que se relacionam com a nossa capacidade de previsão sobre o que poderá acontecer a longo prazo, quer os que dizem respeito ao nosso conhecimento sobre a vulnerabilidade e agilidade que têm os diferentes organismos marinhos para lidar com o stress ao longo de várias gerações”Saber, por isso, como estes organismos marinhos respondem às pressões do oceano numa escala de tempo mais alargada – ao longo de várias gerações – permitirá conhecer a sua vulnerabilidade às alterações globais e o porquê dessa vulnerabilidade. Mais. Ajudará a descobrir quais os mecanismos de plasticidade que alguns conseguem desenvolver ao longo de gerações para melhor sobreviverem e se reproduzirem. Questões essenciais para melhorar a gestão dos recursos marinhos e a sustentabilidade dos oceanos, numa lógica de longo prazo.

Joana Cabral, a investigadora no ICVS, acredita que a matemática é a chave para perceber a complexa rede que é o cérebro humano e os seus cerca de 100 mil milhões de neurónios. Apesar das caracterizações cada vez mais detalhadas da sua estrutura e atividade, o seu funcionamento ainda não se consegue explicar. Mas Joana Cabral quer fornecer um modelo teórico unificador e capaz de representar os mecanismos biofísicos que governam a atividade cerebral.

“Sabemos como cada neurónio é capaz de disparar um sinal elétrico e conhecemos também o Conectoma estrutural, que explica a existência de ligações nervosas entre as diferentes partes do cérebro, mas continuamos sem saber como se organiza a atividade conjunta de milhares de neurónios, através da qual se formam os padrões que estão, em última análise, na origem dos nossos comportamentos”

Partindo da premissa de que o nosso cérebro está organizado em redes funcionais, que se ativam em simultâneo e de forma recorrente em pessoas saudáveis, sabe-se também que as mesmas estão alteradas em indivíduos com diferentes doenças neurológicas e psiquiátricas, pelo que percebê-las poderá vir a ter um impacto preponderante no entendimento dessas doenças. Joana Cabral vai recorrer a modelos matemáticos que representam o comportamento de sistemas dinâmicos acoplados e vai aplicá-los ao Conectoma estrutural.

“Quero verificar se os padrões de atividade cerebral aparentemente distintos, registados com electroencefalografia (EEG) e fMRI, são expressões diferentes da dinâmica subjacente da rede cerebral”, explica. Ao validar se o modelo matemático pode ajudar a desvendar mais um mistério do cérebro, comparará os resultados das suas simulações teóricas a dados reais, obtidos através de fMRI e EEG no Hospital de Braga e processados na Universidade do Minho.

Joana Caldeira, a engenheira biomédica do INEB e do i3S, quer utilizar a tecnologia de edição genética CRISPR (CRISPR/Cas9) para a regeneração dos discos intervertebrais. Com esta ferramenta reativará genes típicos do microambiente fetal para potenciar as atuais terapias regenerativas com células estaminais. Saliente-se que, mais de 70% da população mundial é afetada por dor lombar causada pela degeneração dos discos intervertebrais e os tratamentos atuais não são eficazes a longo prazo.

Com esta tecnologia revolucionária poderemos criar uma envolvente acolhedora para as células estaminais utilizadas nas terapias de regeneração do disco, o que promoverá o seu alojamento e sobrevivência no local pretendido”

Um tratamento eficaz nesta área permitiria beneficiar milhões de pessoas, reduzindo o número de anos vividos com incapacidade. No caso da doença degenerativa do disco, estes anos ultrapassam em média os registados em doenças como a SIDA, a tuberculose e o cancro de pulmão. Da mesma forma, o projeto de Joana, batizado como CRISPR4DISC, ajudaria a diminuir perdas globais anuais que, segundo números da investigadora, deverão rondar os 150 mil milhões de euros/ano, em parte decorrentes de cerca de 150 milhões de dias de baixa médica.

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