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Fake news são "ameaça para o jornalismo por serem concorrência desleal"

O fundador do Expresso, Francisco Pinto Balsemão, considerou à Lusa que as fake news são uma ameaça global e não apenas para os media e defendeu um código de conduta para os jornalistas nas redes sociais.

Fake news são "ameaça para o jornalismo por serem concorrência desleal"
Notícias ao Minuto

10:29 - 24/01/19 por Lusa

País Pinto Balsemão

Questionado sobre se as fake news [notícias falsas] ameaçam os media, o presidente do Conselho de Administração da Impresa, afirmou: "Eu acho que não é apenas para o negócio da informação, a ameaça é muito mais global, a ameaça é para a sociedade onde vivemos e essa ameaça hoje em dia está organizada".

E explicou: "Há 'hackers' [piratas informáticos] profissionais que são contratados e bem pagos, quer para atacarem pessoas, empresas e instituições e tentarem destruí-las, quer para estarem ao serviço de políticas de grandes países, como é o caso da ingerência russa nas eleições americanas" ou "como foi o caso do Brexit".

Além disso, "já reparou que, se não tivesse havido o caso da Cambridge Analytica, se calhar o Brexit não tinha tido o voto favorável, se calhar Trump não tinha ganhado, portanto, duas páginas da nossa história recentíssima importantes tinham sido viradas de outra maneira", refletiu o 'patrão' do Expresso e da SIC.

E "é isso que me aflige, sobretudo quando nós temos consciência" destes dois casos "sempre citados": eleições presidenciais norte-americanas e Brexit.

"Sabemos que essa ingerência continua a acontecer já depois das eleições americanas. Os 'hackers' contratados aparentemente pelo poder soviético transferiram a sua atuação para o Instagram, que pertence ao Facebook aliás, e tiveram como objetivo principal criar movimentos de simpatia e de apoio à política de Trump no que respeita à utilização individual de armas de fogo e também no que respeita a tudo o que tem a ver com a atuação na parte da imigração, o muro, mas não só. Isto tem efeito e o Facebook ou qualquer dessas grandes organizações que são potentados mundiais não têm o estatuto de editor, não são 'publishers', não têm qualquer obrigação, nem são sancionados em caso de incumprimento como nós somos", prosseguiu.

Para o patrão da SIC, as fake news são "uma ameaça global" e uma "ameaça para o jornalismo porque é uma concorrência completamente desleal".

"Quando nós falamos em ameaça para o jornalismo, estamos a falar em jornalismo na maneira como ambos o entendemos: empresas independentes do ponto de vista político e financeiro, empresas profissionais, competentes, capazes, de qualidade e que cumprem determinadas regras deontológicas e que caso essas regras não sejam cumpridas haja sanções claras e imediatas", continuou.

"Como sabe, em Portugal, os media têm não apenas a ERC, têm uma série de reguladores que constantemente atuam, quanto a mim até excessivamente, sobre a nossa conduta e na maneira de fazer jornalismo", salientou.

"Essa é, portanto, uma ameaça grande para o jornalismo e também uma grande oportunidade de separar o trigo do joio e como o joio é cada vez mais volumoso, mais mal cheiroso, está por toda a parte, é pior que as ilhas de plástico a serem encontradas cada vez maior número nos oceanos", apontou, salientando que "o joio é cada mais pestilento" e cresce em Estados que têm o poder e utilizam as novas tecnologias em campanhas.

Deu o exemplo da República Democrática do Congo, que cortou o acesso à internet para controlar o sistema político e social, ou "como é o caso da China que faz isso quase abertamente", para explicar que a evolução tecnológica, que até inclui reconhecimento facial, permite condicionar a atividade política, a liberdade das pessoas, a liberdade de opinião e até o acesso à informação.

"O jornalismo tem dificuldades, tem uma concorrência grande das redes sociais em termos de rapidez" e do surgimento de notícias que podem ser verdadeiras ou não, considerou, apontando, porém, que as próprias redes sociais têm "muito ajudado" os media "com muitos cidadãos" a darem informações à qual o jornalismo não teria acesso.

"Basta ver o que se utiliza em televisão de imagens recolhidas por telemóveis que, de outra maneira, nunca teríamos possibilidade de dar e que são, essas sim, noticiosas, mas o jornalismo tem dificuldade em controlar e tem dificuldade em competir, cada vez mais é preciso criar regras e é preciso respeitá-las", apontou.

"Eu julgo que essa ameaça para o jornalismo pode-se transformar numa vantagem se soubermos aproveitá-la", considerou.

No combate às fake news, o presidente da Impresa teceu ainda críticas ao comportamento dos jornalistas nas redes sociais.

"Os jornalistas têm de ter um comportamento talvez um pouco diferente e deixar de se apresentarem constantemente nas redes sociais como se aquilo fosse uma espécie de clube de amigos", considerou.

Questionado se considerava necessário um código de conduta, Francisco Pinto Balsemão afirmou: "Penso que sim, cada vez mais acho que os jornalistas não devem intervir nas redes sociais, muito menos acerca de assuntos que eles próprios tratam nas redações. Acho que se devem coibir disso".

Aliás, "há quem diga também que uma das razões porque [Trump] ganhou as eleições nos Estados Unidos foi porque os jornalistas entraram na guerra das redes sociais em vez de fazerem jornalismo e há o grande perigo de com essas intervenções regulares a notícia passar a ser opinativa", sublinhou.

"E uma notícia é uma notícia, uma opinião é uma opinião e isso é uma das regras que quanto a mim é tão óbvia e tão sagrada que deixa de ser respeitada com a necessidade de brilho e de opinião", reiterou.

Balsemão defendeu a importância do 'fact checking' [verificação dos factos].

"Acho que 'fact checking' é cada vez mais importante. Não vejo que haja grandes dificuldades em utilizar empresas fiáveis e controláveis no sentido de saber se estão a fazer bem e que façam a elas o 'fact checking'", considerou.

Mas "acho também que cada vez temos mais facilidades na investigação, é muito mais fácil de investigar hoje, apesar de muitas mentiras que se possam encontrar, do que era há dez anos ou 15 anos isso tem um valor e permite trabalhar de outra maneira", afirmou o fundador do semanário Expresso.

"Por outro lado, até que ponto é que o jornalismo tem ainda possibilidades de competir nas cinco regras", questionou, apontando que o "onde, quem e quando, cada vez aparece mais instantaneamente".

Mas, "o como e o porquê, que são as duas outras componentes [na produção da notícia], deveriam pertencer mais aos jornalistas".

No ano passado, quando o Expresso comemorou o seu aniversário, o semanário escreveu que queria "ser um porto de abrigo para pessoas inteligentes", recordou.

"Acho que, pelo menos, no caso de um semanário - e mesmo no caso de um diário, das televisões e das rádios e dos 'sites' que estes meios todos hoje em dia dispõem - ser um porto de abrigo, o sítio onde as pessoas possam parar um pouco e pensar e tirar as suas conclusões é cada vez mais importante", rematou.

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