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"A questão do terrestre ou extraterrestre é sempre muito delicada"

O novo livro de Joaquim Fernandes, 'Ficheiros Secretos À Portuguesa', reúne um conjunto de histórias e casos, até hoje desconhecidos, de "avistamentos de Ovnis, fenómenos 'impossíveis' e outros casos à espera de explicação". O Notícias ao Minuto falou com o autor de forma a tentar entender o inexplicável.

"A questão do terrestre ou extraterrestre é sempre muito delicada"
Notícias ao Minuto

09:10 - 19/11/18 por Sara Gouveia

País Joaquim Fernandes

Já ouviu falar da história das “'estranhas luzes verdes' que rondaram um C-124 da Força Aérea" ou de uma "nuvem bizarra seguida pelos radares"? Do "estranho caso dos relógios parados em Santa Maria ou do 'charuto voador' visto na Praia da Vitória?" Sabia que, em 2004, houve um “intruso aéreo” nos radares civis e militares? 

Joaquim Fernandes, cofundador do Centro Transdisciplinar de Estudos da Consciência (CTEC), da Universidade Fernando Pessoa, compilou os fenómenos inexplicáveis mais pertinentes, que foram relatados ao longo de várias décadas, no seu novo livro 'Ficheiros Secretos À Portuguesa – Avistamentos de Ovnis, fenómenos 'impossíveis' e outros casos à espera de explicação'. 

Recorrendo a documentos oficiais, militares e paramilitares inéditos, o autor pretende dar conta de todos os casos que se manifestaram na Terra, no Ar e no Mar, sem entrar no campo das "crenças ou descrenças" e sem tentar que sejam "uma explicação para os céticos".

O Notícias ao Minuto manteve o espírito aberto e foi falar com o especialista, com o intuito de saber mais sobre a recolha e análise dos casos abordados na obra, tentando ainda desfazer algumas ideias preconcebidas no processo.

Como surgiu a necessidade de escrever sobre estes fenómenos em Portugal?

Ao cabo de mais de 40 anos de estudo desses fenómenos achei que era a altura indicada para divulgar os documentos oficiais, militares e paramilitares que se foram produzindo sobre testemunhos desses fenómenos insólitos. É a primeira revelação de documentos oficiais que apontam essencialmente para preocupações de autoridades militares ou paramilitares, como é o caso da Força Aérea ou GNR, que dão conta de testemunhos feitos por civis ou por militares e que deram origem a relatórios.

Anteriormente já se dedicava a este tipo de análise…

Comecei a interessar-me enquanto jovem, depois com grupos de civis que se interessavam por este tipo de manifestações, chamados fenómenos OVNI (Objeto Voador Não Identificado), e este interesse foidespertando ao longo do tempo, até desencadear organismos como o CTEC (Centro Transdisciplinar de Estudos da Consciência) que, neste momento, reúne nos seus arquivos o espólio de maior importância em Portugal sobre essas manifestações, com cerca de 700 casos registados.

Quis analisar este tipo de observações, o que as pessoas diziam que era observado, de uma perspetiva científica, mas também de uma perspetiva de leitura histórica, que é a minha área, e juntamente com colegas de outras áreas quis fazer uma abordagem rigorosa para tentar explicar estas observações que iam sendo manifestadas. A essência do livro não se pronuncia sobre a natureza dos factos, mas sim sobre os testemunhos que foram sendo apresentados.

Há toda uma soma de manifestações de objetos diversos, que causaram perplexidade e que suscitaram a intervenção das autoridades militares

Que género de casos, para quem possa desconhecer, é abordado neste livro?

Todos os casos que se manifestaram na Terra, no Ar e no Mar, divididos por capítulos, com conjuntos de documentos que se referem a esse tipo de relatos e manifestações. Contém observações de objetos [voadores] durante o dia ou noite, manifestações atmosféricas que causaram apreensão junto das autoridades. Há toda uma soma de manifestações de objetos diversos, que causaram perplexidade e que suscitaram a intervenção das autoridades militares, que depois produziram relatórios oficiais com testemunhos, de pilotos militares por exemplo.

Em que altura foram registados?

O mais antigo recuperei-o de 1948. É preciso salientar a importância de alguns casos portugueses, nomeadamente ocorridos na zona dos Açores e que constam dos arquivos da Força Aérea norte-americana, que os reuniu e disponibilizou no Projeto Livro Azul, que resenha milhares de casos que passaram pelos seus crivos [Project Blue Book foi um estudo conduzido pela Força Aérea dos Estados Unidos (USAF) a fim de investigar objetos voadores não identificados (OVNIS)].

Foi com alguma surpresa que encontrei nesse conjunto de documentos meia-dúzia de situações ocorridas nos Açores. O que é que isso significa? Que as autoridades norte-americanas da Base das Lajes, desde o início da sua instalação, estiveram sempre atentos a estes fenómenos que ocorriam mediante a sua jurisdição aérea e os reportavam para a sede do projeto, sem preocupação científica, mas para deixar um registo de preocupação ao nível da defesa aérea. Até por poder ser uma manifestação de perigo ou hostil no contexto da Guerra Fria, por exemplo, ou um produto inteligente, uma arma secreta desenvolvida pela União Soviética e que teve a sua quota-parte de importância.

Dá o exemplo do estranho caso dos relógios parados em Santa Maria”, o “‘charuto voador’ visto na Praia da Vitória”. Há algum que considere particularmente interessante? Porquê?

Do ponto de vista científico há algumas questões que continuam à espera de resposta, mas isso são outros capítulos. Mas há um ou outro caso nos Açores, sobre a base das Lajes e que têm algum impacto, mas que, na verdade, poderiam ser projetos secretos da URSS, lançados na perspetiva de recolha de informação e que pela intrusão aérea criaram mais preocupação. Isso terá sido o mais relevante.

Especificamente, há um que é o ‘caso do Cabrito’, que fala de um guarda das instalações militares da Base das Lajes que notificou sobre um objeto a baixa altitude, que produzia um zumbido que o atordoou, terá ficado sem sentidos e que é um caso que presume uma interação com a testemunha. Segundo o relato, o objeto, inclusivamente, revelaria umas silhuetas humanóides na parte exterior. Mas há outras interpretações que dizem que seriam os bombeiros da base que tinham feito essa intervenção. Há algumas alternativas de resposta que colocam em questão a possibilidade de estarmos perante a existência de armamento nuclear armazenado na base das Lajes e que o guarda confundiu os bombeiros com entidades a bordo do objeto. Portanto, há aqui uma mistura de situações que não estão muito bem esclarecidas.

Para que não se confunda, este livro não fala de extraterrestres, mas sim de OVNIS (Objetos Voadores Não Identificados). Os documentos e relatos que apresenta pretendem ser uma tentativa de explicação para os mais céticos?

Aqui o que me interessa essencialmente é a manifestação das preocupações das autoridades militares nesse campo e que estão veiculadas através dos documentos oficiais, que nunca tinham sido divulgados e que pela primeira vez na literatura desta matéria são reproduzidas. Não tem a ver com crenças ou descrenças, na gíria podem-se confundir, mas não se trata de extraterrestres ou terrestres. Trata-se, sim, de documentos oficiais, de autoridades que se preocuparam em manifestar as suas reservas através de protocolos bem definidos no âmbito da defesa militar, da segurança e da inteligência.

Não pretendem ser uma explicação para os céticos. De uma maneira ou de outra, tentei canalizar informações atualizadas, do ponto de vista científico, do ponto de vista da sensação de testemunhas mais balizadas, como os pilotos militares, mas não ultrapasso essa dimensão do testemunho que é extravasado nos seus próprios relatórios, onde dão conta da sua perplexidade, da sua surpresa e daquilo que não conseguiram identificar como “normal” dentro da aeronáutica conhecida.

Pudemos entrevistar as testemunhas, fizemos os nossos próprios relatórios, tudo isto com o contributo das próprias autoridades militares, isto é inédito em termos internacionaisOs documentos apresentados no livro são documentos militares e oficiais. Como teve acesso a esses documentos?

Através da via das boas graças que tivemos, desde finais da década de 70, da parte da Força Aérea portuguesa, nomeadamente através do chefe de Estado Maior da Força Áerea portuguesa, o General Lemos Ferreira, depois continuadas pelo General Conceição e Silva, que são duas figuras a quem presto homenagem no livro. Sempre se mostraram muito abertos, ao contrário de potências estrangeiras. Este é um tipo de abordagem impensável de ter, por exemplo, no caso dos Estados Unidos, em que há rutura completa entre a perspetiva militar e da defesa e a organização científica dos civis, que nunca teriam capacidade, como nós tivemos, de entrar numa base militar, neste caso na OTA, e fazer investigação com os pilotos protagonistas do 'caso da OTA' de 1982 [Descreve um avistamento, ou perseguição, testemunhado pelo tenente Júlio Guerra (e outros dois colegas seus), que durou cerca de 20 minutos na zona da base aérea da OTA, em Alenquer. Para esse episódio nunca foi encontrada explicação lógica e razoável].

Isso era impensável e tivemos o privilégio de o fazer em Portugal. Pudemos entrevistar as testemunhas, fizemos os nossos próprios relatórios, tudo isto com o contributo das próprias autoridades militares, isto é inédito em termos internacionais.

Os contactos privilegiados com as chefias militares, que fomos mantendo ao longo do tempo, deram-nos acesso a esses documentos. Bem como a GNR, que aceitou um protocolo de colaboração através de um questionário - que está reproduzido no livro - que as próprias patrulhas tinham nos seus postos e que preenchiam de acordo com os testemunhos de ocorrências que se iam manifestando no interior rural. Muitos dos casos chegaram-nos através desses questionários que a GNR utilizava junto das testemunhas que diziam ter visto algo de estranho.

O livro trata-se de um compêndio de avistamentos de objetos não identificados. Haverá muito mais casos relatados. Que critérios usou para escolher os casos que incluiu no livro?

Foi a dimensão oficial da participação das autoridades militares e o grau de estranheza desses mesmos fenómenos, sem esperar uma resposta definitiva sobre o que as pessoas observaram. E o grau de estranheza é um critério que usamos com várias medidas, sobretudo de ordem física, psicológica, a capacidade e qualidade do testemunho, se é uma pessoa ou mais, se é de dia ou de noite, o comportamento do objeto, são algumas dezenas de critérios que usamos para avaliar esse ‘Índice de Estranheza de Observação’, que não pode ser redutível para qualquer fenómeno conhecido, como um meteoro, um avião.

É uma medida que usa critérios científicos e que são balizados por nós, com recurso a colegas de várias especialidades. O interessante era medir o impacto das observações e das experiências relatadas, quer nas testemunhas, quer depois na intervenção das próprias autoridades militares e paramilitares.

As pessoas olham para o ar e podem ser francamente iludidas, porque a variedade de artefactos é enorme. Há muita coisa no ar que lança confusão. Mas nessas épocas anteriores não havia esse tipo de abundância

Os casos remontam todos ao passado. Aliás o primeiro que aborda tem 70 anos. Considera que hoje em dia seria mais complicado fazer esse tipo de investigação, tendo em conta que os céus estão muito mais saturados – com voos comerciais, com drones, balões meteorológicos, etc..?

Os casos vão de 1948 a 2004, que é a altura do fenómeno associado à abertura do campeonato europeu de futebol (em que um "intruso aéreo foi " detetado" nos radares civis e militares"), e é evidente que hoje em dia, por um lado, há uma multiplicação e uma abundância de drones e aparelhos sofisticados de observação aérea, que confundem muito o observador, portanto torna-se mais complicado discernir aquilo que pode ter um interesse anormal de qualquer coisa que, embora possa ser secreta ou reservada, é de fabrico humano e tecnologicamente terrestre. Mesmo com a abundância de telemóveis as imagens normalmente são inconclusivas e portanto tudo isso torna mais difícil o tipo de análise que fazemos agora.

As pessoas olham para o ar e podem ser francamente iludidas, porque a variedade de artefactos é enorme, desde mini-satélites, drones, aparelhos militares. Há muita coisa no ar que lança confusão. Mas nessas épocas anteriores não havia esse tipo de abundância.

Que reações é que costuma ter por parte do público ao falar destes casos?

Depende das audiências, se estão mais ou menos informadas sobre as matérias, se estão mais ou menos interessadas nestas questões. Há pessoas que são mais curiosas destes fenómenos ao longo do tempo e há outras a quem passa tudo ao lado. Vai tudo depender da sua própria formação e do conhecimento que têm sobre as coisas, dos critérios que colocam na apreciação destes fenómenos. Mas a ciência tem sempre de se mostrar neutra nestes casos, porque há muita coisa que desconhecemos e a que só a ciência no futuro nos poderá dar respostas.

É contactado muitas vezes por pessoas que dizem ter avistado objetos fora do comum? Como é que lida com a informação?

O CTEC recebe regularmente várias informações e procuramos aferir a qualidade da observação, através dos índices, da validade do informador, indo ao terreno para tentar confirmar as situações e recorrendo a protocolos exigentes tendo em conta a complexidade das informações.

Como é que alguém que tenha avistado algo que pareça algum fenómeno inexplicável pode relatar essa ocorrência se se tratar de um civil? Como é que se desenrola esse processo?

Há um formulário que temos disponível na nossa página a que as pessoas podem ter acesso, fazemos uma primeira leitura e contactamos com as testemunhas se for caso disso. Claro que as pessoas podem contactar a Força Aérea, que é a primeira instância oficial a receber essa informação, mas em termos civis fará mais sentido contactar connosco inicialmente, para podermos apreciar o testemunho.

Não excluo nada, estou aberto a todas as possibilidades, inclusive fenómenos que não sejam do domínio terrestre, isso é evidente, mas essa é uma hipótese entre muitas outras e que só o futuro nos poderá confirmar.

Apesar de o livro se tratar de uma coletânea de documentos históricos, acredita que pode haver uma explicação científica para os avistamentos ou até admite que alguns se possam tratar de fenómenos extraterrestres?

Aqui a questão do terrestre ou extraterrestre é sempre uma questão muito delicada. Na situação atual da ciência alguns dos casos relatados não têm explicação corrente, mas daqui a dez ou vinte anos esses fenómenos já podem ter uma resposta positiva, deixam de ser ‘não identificados’ para se saber do que é que se tratou, de acordo com os novos avanços da tecnologia, de acordo com novas revelações, como se aparecer uma potência que assuma ter sido a responsável por ter lançado certo objeto em determinado ano, pode aparecer nova informação que venha dar uma explicação ao que não era possível explicar na época.

Todos os casos considerados no livro mantêm-se em aberto, com a possibilidade de obterem novas explicações. Mas não excluo nada, estou aberto a todas as possibilidades, inclusive fenómenos que não sejam do domínio terrestre, isso é evidente, mas essa é uma hipótese entre muitas outras e que só o futuro nos poderá confirmar.

Há semelhanças entre alguns fenómenos que têm sido descritos ao longo do tempo, não só em Portugal?

Há algumas semelhanças, na descrição da morfologia do objeto, de formas discoidais, formas esféricas, comportamentos em zig-zag, mudanças de velocidade, tudo isso é comum a estas descrições.

Considera que a sociedade portuguesa está disponível a encarar a possibilidade de existirem fenómenos paranormais?

A evolução do conhecimento é imparável e as sociedades vão-se adaptando àquilo que inicialmente é considerado impossível e que se calhar no ano seguinte, ou daí a 50 anos é completamente legítimo e possível. Isso é manifesto em todas as áreas do conhecimento. Mas penso que não estaria preparada, esses fenómenos que são chamados insólitos e não identificados passam sempre por uma perceção de crença, de aceitar ou não, crer ou não, e partir desses critérios é sempre muito complicado.

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