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Museus criticam falta de "autonomia real" em proposta do Governo

A falta de uma "autonomia real", fiscal e jurídica, na proposta de decreto-lei do Ministério da Cultura para o novo regime de autonomia dos museus, é uma das principais críticas de representantes do setor da museologia contactados pela agência Lusa.

Museus criticam falta de "autonomia real" em proposta do Governo
Notícias ao Minuto

10:16 - 08/09/18 por Lusa

País Representantes

O projeto de diploma foi apresentado pelo Ministério da Cultura ao setor nos últimos meses e pretende constituir "uma verdadeira mudança de paradigma", que venha a gerar "um novo dinamismo na gestão dos equipamentos culturais", de acordo com o preâmbulo do documento a que a Lusa teve acesso.

Para as duas principais entidades que representam o setor e os profissionais da museologia em Portugal - o ICOM - Conselho Internacional de Museus e a Associação Portuguesa de Museus (APOM) - o documento "não é uma revolução", mas "institui grandes inovações", pecando, no entanto, por não criar uma autonomia fiscal e jurídica.

O que está em causa é o novo regime jurídico de autonomia de gestão dos museus, monumentos, palácios e sítios arqueológicos, que deverá abranger as 30 designadas "unidades orgânicas", tuteladas pela Direção-Geral do Património Cultural (DGPC) e pelas Direções Regionais de Cultura (DRC).

Contactado pela agência Lusa, Luís Raposo, presidente do ICOM-Europa - que assinou conjuntamente um parecer sobre a proposta de diploma com o ICOM-Portugal - considerou "fundamental que os museus sejam entidades autónomas, com quadros de pessoal, estatutos e orçamento próprios".

Raposo recordou que esta autonomia já existiu nestes organismos, em Portugal, mas perdeu-se, há cerca de uma década, numa "evolução desastrosa", e com a criação mais recente da DGPC, um enorme organismo que tutela os museus e o património, que "foi a machadada final".

Embora o ICOM pense que esta proposta de decreto-lei do Governo não represente um regresso à situação em que os museus se encontravam, principalmente por não ganharem autonomia fiscal e jurídica, o responsável considera que "traz um progresso assinalável".

Os pontos mais positivos que destacou, nas declarações à Lusa, foram o reforço da delegação de poderes nos diretores, que passam também a poder recorrer às receitas produzidas pela sua própria entidade para aplicar na programação.

"O facto de os diretores poderem usar os seus recursos para programação e assuntos correntes dá uma maior liberdade na gestão de cada unidade, sendo que esses meios não serão usados nem em salários nem em empreitadas de grande fôlego, que passam a provir do Orçamento do Estado", apontou.

Luís Raposo ressalvou que, mesmo mantendo-se o princípio da solidariedade entre as entidades - porque muitas delas têm receitas reduzidas -, "há museus, mosteiros e outros monumentos que têm conseguido receitas muito significativas devido ao recente grande aumento do turismo, que os devem beneficiar".

"As competências e responsabilidades dos diretores são alargadas e definidas por lei, o que reduz muitíssimo a burocracia", salientou.

O ICOM também concorda com a limitação de mandatos dos diretores - que passam a ter comissões de serviço de cinco anos, num máximo de dez (agora é de três anos, mas sem limite de renovação) - e que a sua seleção passe a ser feita através de um concurso nacional e internacional ao qual qualquer cidadão, com o perfil adequado, poderá candidatar-se.

Luís Raposo apontou ainda que é "justo" que alguns diretores passem a ser equiparados a subdiretores-gerais, e que se tenha posto fim ao estatuto jurídico especial do Museu Nacional de Arte Antiga (MNAA), cujo diretor tem vindo a ocupar, por inerência, também um cargo de subdiretor-geral na DGPC.

Os dois ICOM aplaudem ainda a constituição de um conselho geral não remunerado em cada unidade orgânica para apoiar o diretor "e que fará a ligação entre a entidade patrimonial e a comunidade envolvente", bem como a reconfiguração do júri que escolhe os cargos dirigentes.

"Este processo de consulta tem sido sério e as nossas sugestões têm sido ouvidas, e até atendidas", avaliou o presidente do ICOM-Europa sobre o documento que o Governo quer levar a Conselho de Ministros em novembro, para poder entrar em vigor em 2019.

Por seu turno, a APOM também avaliou a proposta de decreto-lei e a respetiva portaria, tendo enviado dois pareceres e questões ao Ministério da Cultura.

Na mesma linha do ICOM, a associação defende que "a verdadeira autonomia passa por uma independência fiscal e jurídica, mas o que vai acontecer é uma gestão acordada" com a DGPC, disse à agência Lusa o presidente, João Neto.

"Somos a favor de um regime de autonomia real, e com condições para os museus", salientou, acrescentando que a proposta de diploma "tem inconsistências jurídicas", segundo os advogados da entidade, que levanta várias questões sobre os artigos.

"Como é que os recursos vão chegar para tudo, se 90% das entidades estão em défice? (...) O que vai acontecer a um diretor que não cumpre os objetivos? Vai ser despedido?" questiona, argumentando que, "criar planos a cinco anos é um grande risco para quem assina, quando se desconhecem os recursos que vão existir nesse período".

Quanto ao concurso internacional, a APOM não se opõe, "desde que o diretor tenha experiência, conhecimento sobre a instituição para onde vai e também da língua portuguesa".

"Não queremos que sejam concursos para gestores financeiros, mas sim para museólogos com experiência em gestão", defendeu o responsável.

João Neto diz que a APOM não está contra o documento, que considera importante, "mas deveria ter sido criado com maior cuidado, com estudos prévios, e de forma transparente".

"Não estamos contra este projeto de autonomia, mas queremos uma melhora substancial" no conteúdo, defendeu, nas declarações à Lusa.

De acordo com a proposta de decreto-lei, nos 90 dias seguintes à entrada em vigor, o diretor-geral da DGPC e o diretor regional das DRC procedem à abertura do procedimento concursal para a seleção e provimento dos diretores das unidades orgânicas.

Fonte do gabinete do ministro da Cultura, Luís Filipe Castro Mendes, contactada pela agência Lusa recordou que o Governo "comprometeu-se publicamente com a entrada em vigor desta reforma durante 2019", e o processo está a avançar como previsto.

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