No início de dezembro, o Conselho de Segurança (CS) da ONU promoveu um balanço dos 24 anos de atividade desta instância judicial 'ad hoc' criada em 25 de maio de 1993 e foram admitidas algumas falhas.
No debate, concluiu-se que as diversas condenações pelos graves crimes cometidos em território da antiga Jugoslávia -- em particular nas guerras da Croácia (1991-1995) e Bósnia-Herzegovina (1992-1995) --, não levaram as sociedades dos Balcãs a confrontar-se com o seu passado.
Perante o CS, o procurador-geral do TPIJ, o belga Serge Brammertz, reconheceu que o tribunal não apaziguou as tensões na região.
Acontecimentos recentes demonstraram que alguns acusados por crimes de guerra continuam a ser entronizados nos seus países, e que a ausência de guerra não significa necessariamente a paz.
Em 11 de dezembro decorreu em Zagreb uma homenagem ao general croata bósnio Slobodan Praljak, condenado por crimes de guerra e que se suicidou em direto no tribunal de Haia em 29 de novembro ao lado de cinco outros acusados, quando a instância confirmava em recurso uma sentença de 20 anos de prisão.
Nessa cerimónia na capital da Croácia, compareceram dois ministros do Governo da Croácia, generais e deputados, avolumando o trágico desfecho na hora de encerramento deste tribunal. Em paralelo, o primeiro-ministro conservador croata, Andrej Plenkovic, referia-se a uma "profunda injustiça moral contra os seis croatas da Bósnia e contra o povo croata".
No dia 13 de dezembro, o líder nacionalista radical da Sérvia Vojislav Seselj desferiu outro golpe à justiça do tribunal internacional ao não comparecer na primeira audiência no edifício em Haia.
Selejl, que passou 12 anos nas prisões de Haia após se ter entregado voluntariamente e assumido a sua defesa, tinha sido absolvido em primeira instância num caso que incluía crimes contra a humanidade e de guerra.
O processo em apelo de Seselj será um dos primeiros casos perante o Mecanismo para os tribunais penais internacionais, estabelecido pelas Nações Unidas em 2010 e com competência para retomar todos os casos deixados pelo TPIJ e pelo Tribunal pela Internacional para o Ruanda (ICTR).
Os últimos veredictos da instância judicial, relacionados com o general sérvio bósnio Ratko Mladic, condenado em 20 de novembro a prisão perpétua, e os ex-dirigentes croatas da Herzegovina, provaram que os líderes políticos da região não desejam uma reconciliação efetiva.
No entanto, o fim desta instância judicial deverá significar um incremento da atividade do Tribunal especial sobre o Kosovo, destinado a julgar os antigos combatentes dos separatistas albaneses do Exército de libertação do Kosovo (UÇK) suspeitos de crimes de guerra.
Desde a sua fundação, o TPIJ indiciou 161 pessoas, 90 das quais foram condenadas (56 já cumpriram a pena), 19 absolvidas, 13 reenviadas para uma jurisdição nacional, e 37 morreram -- incluindo o ex-presidente da Sérvia Slobodan Milosevic, o primeiro chefe de Estado a ser detido e julgado pela justiça internacional por crimes de guerra e que apareceu morto na sua cela em 11 de março de 2006 --, ou foi-lhes retirada a acusação. Dois novos processos já transitaram para o MICT.
Mas as potências que atuaram na "sombra" também decidiram perdoar, esquecer ou encerrar 'dossiers' relativos às guerras jugoslavas da década de 1990.
A comunidade internacional que dizem representar parece ter-se fatigado de ver desfilar os fantasmas do colapso da Jugoslávia, e parece desejosa de sair deste "pântano" o mais depressa possível.
Na segunda-feira, no decurso de um simpósio na Holanda que fez o balanço da sua atividade, a juíza pioneira do TPIJ, a costa-riquenha Elizabeth Odio Benito, admitiu em declarações à Efe que os bombardeamentos da NATO na antiga Jugoslávia (em 1995 e 1999) não foram incluídos nas investigações porque essa decisão dependia de "circunstâncias políticas que os juízes não controlam".
Em paralelo, o juiz-presidente do TPIJ, o maltês Carmel Agius, qualificava de "estupidez" a denúncia de politização deste tribunal.
No entanto, a contestação dos veredictos na Croácia e na Sérvia permaneceram um fator determinante que fragilizou a credibilidade do tribunal.
Críticos, em particular de Belgrado, referem que mais de dois terços dos incriminados são de origem sérvia (68%, contra 21% de croatas, 7% de muçulmanos bósnios e 2% de albaneses), enquanto os defensores do tribunal justificam que, estatisticamente, os sérvios perpetraram mais crimes.
As autoridades sérvias consideram que o TPIJ está motivado por considerações políticas e falhou em contribuir para a reconciliação da região.
"Em mais de 20 anos de trabalho, o tribunal não tomou em consideração dois fatores: durante a celebração do primeiro aniversário da independência da Croácia, em 1992, na principal praça de Zagreb, o então presidente Franjo Tudjman reconheceu perante mais de 100.000 pessoas que a guerra poderia ter sido evitada, mas que tinha decidido de outra forma. Segundo facto: em 1992, Alija Izetbegovic, então presidente da Bónia-Herzegovina, anulou a sua assinatura do plano de Carrington-Cutileiro inicialmente concluído pelas três partes em conflito na Bósnia-Herzegovina. Assim, foi deliberadamente perdida uma ocasião para firmar a paz e evitar a guerra civil e as suas vítimas", argumentou Nela Kuburovic, ministra da Justiça da Sérvia.
A ministra fazia referência ao político conservador britânico Lord Peter Carrington e ao diplomata português José Cutileiro, respetivamente presidentes das fracassadas conferência de paz para a ex-Jugoslávia e miniconferência para a Bósnia-Herzegovina em 1992.
Apesar destas observações, o comunicado oficial do Conselho de Segurança da ONU no início de dezembro assinalava, a propósito, que a glorificação dos crimes de guerra é uma vergonha com a qual a região terá um dia de se confrontar.