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Revolução russa: Lenine esteve na origem do totalitarismo

Nos 100 anos de Revolução bolchevique, diversas obras de historiadores sustêm que a repressão de massas e o autoritarismo constituem uma componente integrante do projeto leninista que triunfa em 1917.

Revolução russa: Lenine esteve na origem do totalitarismo
Notícias ao Minuto

10:00 - 23/10/17 por Lusa

Mundo Stéphane Courtois

O investigador francês Stéphane Courtois, militante maoista entre 1968 e 1971, um dos autores do "Livro Negro do Comunismo" (1997) e de muitos outros títulos sobre regimes comunistas, publicou este ano "Lénine, l'inventeur du totalitarisme" (Lenine, o inventor do totalitarismo), em que explora o "delírio lógico" de Vladimir Ilyich Ulianov (Lenine, 1870-1924), e considera o seu longo percurso fundamental para entender a tomada do poder pelos bolcheviques.

Em recente entrevista à revista Le Figaro/Histoire, o diretor de investigação no CNRS (universidade de Paris X) considera que o marxismo não é suficiente para entender este "itinerário de radicalização revolucionária", sendo determinante a componente psicológica, feita "de violência, de ressentimento, de ódio", e que no caso de Lenine se revela mais tarde "e de forma muito violenta", em particular contra os Romanov, "emitindo uma ordem pessoal para os eliminar" em 1918.

Para justificar esta abordagem à personalidade do líder da Revolução de Outubro, Courtois recorda o ano de 1886, marcado em janeiro pela morte do pai, Ilya Ulyanov, devido a hemorragia cerebral (que também o vitimaria) e em maio pela condenação à morte e execução por enforcamento do irmão mais velho Alexander (Sasha), acusado de preparar um atentado à bomba contra o czar Alexandre III.

A partir de 1905, após o degredo na Sibéria, a clandestinidade e o exílio no estrangeiro, longe da sociedade russa, Lenine revela "uma retórica implacável, excitado pela sua megalomania e hipernarcisimo", que se acentuará.

Do jacobino radical da Revolução Francesa Maximilian de Robespierre, retomará Lenine "a virtude do terror", defende Courtois.

A ideologia é transformada em plano de ação, que é o programa político de Marx. E no seu "Que Fazer?" apresenta o princípio do partido de revolucionários profissionais. "Uma novidade absoluta, longe das sociedades secretas do século XIX e mesmo de Marx", assinala.

A "disciplina militar clandestina", a "dedicação total ao partido" passam a ser norma. E, na revolução de 1905, "seleciona desde essa época Estaline, com Lenine como pensador e Estaline como homem de mão, à imagem do duo que formará com Trotski em 1917".

Na sua abordagem histórico-psicológica, Coutrois sustenta que o critério fundamental para Lenine consiste na "adesão absoluta à sua pessoa", emergindo "o líder totalitário, com o culto da personalidade", de "elementos que fundam o totalitarismo", que assim se teria instalado antes do controlo do poder por Estaline.

Pelo contrário, os seus colegas de esquerda insistem nas circunstâncias que conduziram os bolcheviques a utilizar, de urgência e sem um plano programado, meios repressivos, que deveriam ser provisórios, para defender a revolução emergente contra os exércitos "brancos", as forças estrangeiras e as rebeliões camponesas.

A abordagem de Courtois é inversa, e com este recente livro pretende destruir o "mito" do "bom Lenine" contra o "mau Estaline".

Assim, Lenine teria retomado o "gosto da Revolução Francesa num cenário de escalada, a designação de inimigos internos e de suspeitos, a violência, e por fim o terror como meio de governo, que vai aplicar a partir de 07 de novembro de 1917", definido como "um golpe de força dos bolcheviques" e que apenas resultou "devido aos falhanços políticos do campo democrático, que se divide".

A Revolução de Outubro estará na origem de um "governo inédito", descrito como "um partido único formado unicamente por revolucionários profissionais, sem participação da sociedade civil. Liquidam em algumas horas a Assembleia constituinte, a primeira eleita por sufrágio universal. Desde então, o regime totalitário está instalado".

A criação em dezembro de 1917 da Tcheka, a polícia política do novo regime e dirigida por Felix Dzerzhinsky, proveniente de uma família da aristocracia polaca, constituirá o corolário lógico desta evolução, em pleno conflito interno e com a intervenção de corpos expedicionários de mais de dez países em apoio aos "exércitos brancos".

"A guerra civil traduz-se pela introdução do comunismo de guerra, com a liquidação, deportação ou internamento de todos os opositores, e a requisição dos bens dos "ricos" e das colheitas, sustenta Courtois.

"A guerra civil não será fruto das circunstâncias, como a Revolução Francesa. Lenine teoriza a guerra civil de forma radical, e será ele que permitirá exterminar a burguesia enquanto classe e subtrair-se ao processo democrático. Submeter-se ou ser exterminada, esta a alternativa anunciada por Lenine desde 1905".

Neste período, entre 1918 e 1921, a instauração do "comunismo de guerra" irá conduzir um país "arruinado e esgotado, a uma situação de total falhanço, com a fome a atingir 30 milhões de pessoas", assegura o historiador. E por estar "consciente que o seu delírio lógico conduziu ao caos, começa a sofrer uma série de ataques cerebrais que o conduzem à morte em janeiro de 1924".

Conclui Courtois: "Das suas três grandes paixões (a paixão revolucionária de destruir a sociedade, a paixão utópica de poder construir uma sociedade perfeita, a paixão cientista de estar convencido que obedecia a uma visão justa do mundo, da história e da sociedade), apenas se concretizou a primeira. E a que preço...".

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