António Guterres discursou hoje numa reunião ministerial sobre o papel crítico da UNRWA, convocada pela Jordânia, Espanha e Brasil, na qual saiu mais uma vez em defesa desta agência amplamente atacada por países como Israel e Estados Unidos.
Nesta reunião realizada à margem da Assembleia-Geral da ONU, Guterres frisou que gerações de refugiados palestinianos contam com a UNRWA para a educação, assistência médica e outros serviços essenciais.
De acordo com o chefe da ONU, o impacto total da UNRWA vai muito além da educação que era fornecida a milhares de raparigas e rapazes em toda a região, dos alimentos e assistência financeira a 2,6 milhões de pessoas, ou das 10,5 milhões de consultas por ano nas suas clínicas.
"A UNRWA é uma força de estabilidade na região mais instável do mundo. A sua presença operacional contribui para a governação da Autoridade Palestiniana na Cisjordânia, para os esforços do Líbano em cumprir os requisitos de um cessar-fogo nos campos de refugiados, para os esforços da Síria para trilhar um caminho para uma paz duradoura, e para o papel da Jordânia na construção da estabilidade regional", disse.
Apesar de tudo isso, a UNRWA está a ser forçada a operar sob uma pressão extrema e crescente, lamentou o líder das Nações Unidas, recordando que, em Gaza, os funcionários da agência estão a ser mortos em ataques israelitas e as suas instalações destruídas.
Além disso, a UNRWA enfrenta défices orçamentais "e uma enxurrada de desinformação", sublinhou.
Nesse sentido, e face às restrições insustentáveis que atravessa, o antigo primeiro-ministro português apelou aos Estados-membros para que tomem medidas imediatas para ajudar a agência.
"A UNRWA é vital para qualquer perspetiva de paz e estabilidade na região. Peço-lhes que façam tudo o que puderem para apoiar o seu trabalho. Como? Primeiro, demonstrando solidariedade e fornecendo apoio político", sugeriu.
Em segundo, Guterres pediu financiamento que ajude a UNRWA a cumprir o seu mandato.
"Deve ser financiada com urgência. Completamente. E de forma previsível", insistiu, lembrando que a realidade no terreno está "mais sombria do que nunca".
Até que uma solução política seja alcançada em relação à Palestina, a UNRWA continua a ser crucial para "alcançar o melhor resultado possível e a evitar o pior", observou.
Guterres concluiu o seu discurso recordando os mais de 370 trabalhadores da UNRWA mortos no terreno.
"Não tenho palavras para expressar a profundidade da minha admiração, respeito e gratidão. (...) Cada um deles sofreu perdas inimagináveis. Casas e comunidades destruídas. Famílias inteiras apagadas da existência", lamentou.
No entanto, mesmo perante este cenário de horror, os funcionários da UNRWA continuam ao serviço, muitas vezes sem dormir e sem comer, movidos por um profundo sentido de dever e compaixão, relatou ainda o secretário-geral.
"Continuam a servir o povo de Gaza com uma coragem e um altruísmo que inspiram o mundo. Jamais esqueceremos o seu heroísmo", assegurou.
Israel proibiu formalmente a UNRWA de operar no seu território, acusando a agência de ter membros do grupo islamita Hamas infiltrados.
O financiamento dos Estados Unidos à UNRWA está suspenso desde janeiro de 2024, quando a administração do então Presidente Joe Biden o suspendeu na sequência de acusações de Israel de que funcionários do organismo em Gaza tinham participado no ataque liderado pelo Hamas, em 07 de outubro de 2023, que desencadeou a atual guerra no enclave.
Após uma investigação interna, a ONU concluiu que nove dos 19 funcionários assinalados poderiam ter estado envolvidos nos ataques, mas esclareceu que o gabinete de investigação não estava em condições de verificar de forma independente a maior parte das informações apresentadas por Israel.
Além disso, a agência foi submetida a um processo independente de revisão dos seus mecanismos de neutralidade, liderado pela ex-ministra dos Negócios Estrangeiros francesa Catherine Colonna, que concluiu que a UNRWA possui um dos sistemas mais desenvolvidos de entre as agências da ONU para manter a sua neutralidade, mas fez uma série de recomendações para o reforçar.
Leia Também: Guterres alerta que IA "pode ser transformada" em arma e pede controlo