Apesar das consultas políticas desta semana, "não há nenhum indício que sugira que o Governo de [François] Bayrou não cairá na próxima semana. Solicitou ao Parlamento uma moção de confiança (...) que a maioria dos grupos parlamentares não está disposta a conceder", disse à Lusa Émeric Bréhier, diretor do Observatório da Vida Política da Fundação Jean-Jaurès.
Se for chumbada, Bayrou será obrigado a demitir-se pela falta de apoio para a proposta de orçamento que prevê um corte de quase 44 mil milhões de euros para reduzir a dívida externa e inclui também medidas como a eliminação de dois feriados nacionais e o congelamento das prestações públicas.
"Que um Estado precisa de um orçamento, ninguém pode contestar. A Constituição prevê disposições para o caso de o Parlamento, ao fim do prazo previsto de 70 dias, não ter conseguido aprovar uma Lei de Finanças e uma Lei de Finanças da Segurança Social", afirmou Bréhier.
O especialista disse não ver razão para o Presidente francês, Emmanuel Macron, usar "o poder constitucional para dissolver novamente a Assembleia Nacional".
Isto porque, "uma vez que o tenha utilizado, não poderá voltar a fazê-lo durante um ano", numa altura em que "nada indica que novas eleições legislativas possam conduzir a uma Assembleia menos fragmentada, com uma maioria absoluta ou, pelo menos, uma maioria mais clara", logo "queimaria uma cartada que poderá usar mais tarde para um novo Governo", referiu.
Segundo o politólogo francês, o Partido Socialista (PS), que poderá impedir a queda do Governo com o voto de 66 deputados, "não apoiará o primeiro-ministro", porque "considera que um esforço orçamental de 44 mil milhões é demasiado importante e poderá abrandar um crescimento já frágil".
Se o Governo cair, caberá a Macron decidir se nomeia outro chefe de Governo, que terá de tentar obter uma maioria na Assembleia Nacional (dividida em três blocos: esquerda, centro-direita e extrema-direita), o que parece impossível dada a atual fragmentação, ou se convoca legislativas antecipadas.
"A escolha do Presidente é soberana. Mas, evidentemente, ele deve encontrar uma mulher ou um homem capaz de, pelo menos, tentar construir uma maioria parlamentar, se não estável, pelo menos caso a caso. E que seja capaz de chegar a compromissos em matéria orçamental", disse o politólogo, defendendo duas hipóteses: "uma personalidade proveniente do 'bloco central' e do aliado Republicanos" ou "proveniente da esquerda - fora da França Insubmissa [LFI, esquerda radical]".
Questionado sobre a possibilidade de Macron se demitir como a oposição pede perante a possível quarta queda de Governo desde que foi reeleito em 2022, Émeric Bréhier defende que "juridicamente, poderá fazê-lo".
"Esse argumento está a ganhar força. Há muito tempo que a União Nacional (RN, extrema-direita), tal como a LFI, insistem nesse sentido. Alguns membros do partido Republicanos estão a ceder. No entanto, não creio que o Presidente vá ceder a essa pressão", defendeu.
Para Vincent Martigny, politólogo da Universidade Nice Côte d'Azur e da Escola Politécnica, citado pelo jornal Ouest-France, Macron pode nomear o ministro da Defesa, Sébastien Lecornu, ou outra personalidade da sua confiança, "mas a situação voltaria a ser rapidamente a mesma, a menos que esse primeiro-ministro apresentasse um plano significativamente diferente".
"Provavelmente já é demasiado tarde" para uma opção de esquerda compatível com Macron, como Bernard Cazeneuve, "dado que as posições se estão a radicalizar com a aproximação das presidenciais de 2027, disse Mathieu Gallard, diretor de investigação do instituto de sondagens Ipsos, citado pelo mesmo jornal.
Os centristas podem ter de aceitar um primeiro-ministro socialista para garantir uma maioria, mesmo apresentando exigências como um orçamento que reduza para metade a consolidação orçamental de Bayrou, impostos sobre a riqueza e a revogação da reforma das pensões.
Se obtiver a confiança parlamentar, Bayrou, que está no cargo há nove meses, terá de ultrapassar este mês uma moção de censura anunciada pelo LFI, que também custou o cargo ao antecessor Michel Barnier, em dezembro de 2024.
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