A instância judicial, com sede em Estrasburgo, França, recebeu uma queixa de uma mulher, nascida em 1983, que acusou o seu supervisor de violação e de violência sexual.
A mulher, identificada pelas iniciais E.A., era técnica de farmácia no Hospital Briey (Meurthe-et-Moselle) em 2010, quando iniciou uma relação sadomasoquista com um chefe de departamento, identificado como K.B., nascido em 1967.
A mulher apresentou uma queixa contra K.B. em 2013 por "violação com tortura e atos de barbárie de pessoa que abusa da sua autoridade", "violência física e psicológica" e "assédio e agressão sexual".
Entretanto, o arguido, condenado em primeira instância por violência intencional e assédio sexual, foi absolvido em 2021 pelo Tribunal de Recurso de Nancy.
Os jurados decidiram que, como os dois envolvidos assinaram um contrato que regia os termos da sua relação, esta foi consensual. Tendo esgotado todas as vias de recurso em França, a queixosa recorreu para o TEDH.
Num acórdão hoje proferido, o tribunal europeu deu razão à queixosa, apontando as "lacunas do quadro jurídico" francês, bem como "as falhas encontradas na sua aplicação", entre as quais as "condições de apreciação do consentimento da requerente pelos tribunais".
O TEDH sublinhou que o consentimento deve "refletir a livre vontade de ter uma relação sexual determinada, no momento em que esta ocorre e tendo em conta as circunstâncias".
"Por conseguinte, nenhuma forma de compromisso assumido --- incluindo sob a forma de um contrato escrito --- é suscetível de caracterizar um consentimento atual para uma determinada prática sexual, sendo o consentimento, por natureza, revogável", sublinhou o tribunal.
A França, considerada culpada de violação dos artigos 3.º (proibição da tortura) e 8.º (direito ao respeito pela vida privada) da Convenção Europeia dos Direitos Humanos, terá de pagar à requerente 20.000 euros por danos morais e 1.503,77 euros pelas despesas judiciais.
Esta é a segunda vez nos últimos meses que a França é condenada pelo TEDH pela resposta judicial a acusações de violência sexual.
Em abril, o tribunal europeu decidiu que o sistema judicial francês "falhou em proteger" três menores que denunciaram violações.
Segundo os juízes de Estrasburgo, as circunstâncias do incidente e o consentimento das adolescentes não foram suficientemente tidos em conta.
Com a decisão de hoje, a advogada da queixosa, Marjolaine Vignola, afirmou esperar que tal deliberação possa "motivar o Governo francês a tornar efetiva uma lei que proteja mais as mulheres" e levar os juízes a "melhorar a sua interpretação da lei".
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