Talibãs devem repor Estado de Direito e "respeitar os direitos humanos"

A Amnistia Internacional (AI) defendeu hoje que as autoridades talibãs no Afeganistão devem restabelecer os quadros jurídicos formais, o Estado de Direito e pôr fim a quatro anos de injustiça e impunidade.

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Lusa
15/08/2025 06:46 ‧ há 1 hora por Lusa

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Amnistia Internacional

Num comunicado enviado às redações, por ocasião dos quatro anos de poder do regime talibã, que chegou a Cabul em agosto de 2021, a organização de defesa e promoção dos direitos humanos lembra que desde que o regime assumiu o Governo, o quadro jurídico "foi totalmente desmantelado e substituído por um sistema de base religiosa moldado pela interpretação estrita da lei islâmica, a 'Sharia'".

 

Entre as críticas, a AI, com sede em Londres, destaca as sentenças proferidas sem julgamento justo ou revisão legal adequada, que resultam "frequentemente em punições públicas, incluindo chicotadas e execuções, realizadas em praças e estádios desportivos".

"Os talibãs devem reverter imediatamente os seus decretos draconianos, acabar com as punições corporais e respeitar os direitos humanos de todas as pessoas no país", argumenta a Amnistia, que apela à comunidade internacional para que tome medidas imediatas, através de pressão diplomática e de um envolvimento baseado em princípios com as autoridades de facto de Cabul.

Para a Amnistia Internacional, o sistema é marcado por inconsistências, impunidade generalizada e falta de responsabilização, de julgamentos arbitrários, injustos e fechados e de preconceitos pessoais na aplicação de punições, como açoites públicos e outras formas de tortura e maus-tratos.

"Após quatro anos de governo talibã, o que resta é uma ordem jurídica profundamente opaca e coerciva, que prioriza a obediência sobre os direitos e o silêncio sobre a verdade", disse Samira Hamidi, ativista regional da Amnistia Internacional para o Sul da Ásia.

"O sistema judicial dos Talibãs está a causar flagrantes injustiças. O sistema judicial não só se afastou dos padrões internacionais de direitos humanos, como também reverteu quase duas décadas de progresso", acrescentou Hamidi.

A organização lembra que, antes de agosto de 2021, as leis afegãs baseavam-se numa Constituição escrita e eram aprovadas por órgãos legislativos eleitos, após as reformas feitas em 2001 que levaram a várias melhorias no país. 

Os tribunais funcionavam em vários níveis - de primeira instância, de recurso e supremos - e eram apoiados por procuradores independentes e estruturas de defesa jurídica, em que as decisões judiciais eram geralmente documentadas, passíveis de recurso e sujeitas a supervisão pública.

"Sob o regime talibã, os processos judiciais são geralmente conduzidos por um único juiz [Qazi], acompanhado por um especialista jurídico religioso [Mufti], que aconselha sobre a emissão de veredictos religiosos ['Fatwas'] com base na interpretação pessoal dos textos religiosos", acrescenta Hamidi.

Em declarações à Amnistia Internacional, um ex-juiz no Afeganistão explicou as grandes discrepâncias nos julgamentos devido ao uso de diferentes orientações do pensamento islâmico - 'fiqh' - e da jurisprudência. 

"Em alguns distritos, as decisões são baseadas no Bada'i al-Sana'i [manual clássico de jurisprudência], enquanto noutros, elas referem-se ao Fatawa-i Qazi Khan [livro de 'fatwas']. O mesmo crime pode resultar em dois veredictos completamente diferentes", sublinhou o ex-juiz.

A AI também lembra que, antes da tomada do poder pelos Talibãs, as mulheres exerciam ativamente funções de juízas, procuradoras e advogadas, representavam entre 8% e 10% do poder judiciário, enquanto quase 1.500 estavam registadas como advogadas e defensoras legais na Ordem dos Advogados Independentes do Afeganistão (AIBA), compreendendo cerca de um quarto do total dos seus membros. 

"Hoje, a maioria foi forçada a esconder-se ou a exilar-se após serem demitidas dos seus cargos depois da tomada do poder pelos Talibãs. Instituições que antes serviam para proteger os direitos das mulheres, como tribunais de família, unidades de justiça juvenil e unidades de violência contra as mulheres, foram desmanteladas, deixando as mulheres quase sem acesso à justiça e a recursos eficazes", lê-se no comunicado da AI.

Sob o regime talibã, os processos judiciais são frequentemente realizados em segredo. Não existe um sistema de supervisão pública e as decisões judiciais não são documentadas nem explicadas, as pessoas são detidas sem mandado, presas sem julgamento e, em alguns casos, simplesmente desaparecem à força. 

"O sistema judicial dos Talibãs mina os princípios básicos de justiça, transparência, responsabilidade e dignidade. Não é construído com base na proteção dos direitos humanos, mas no medo e no controlo. Para muitos afegãos, especialmente mulheres, a justiça já não é algo que possam procurar. É algo sem o qual precisam sobreviver", concluiu Samira Hamidi.

Leia Também: Cerca de 2,2 milhões de afegãs continuam privadas do acesso à educação

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