Numa intervenção por videoconferência durante a Assembleia Geral da Amnistia Internacional, organização de defesa e promoção dos direitos humanos com sede em Londres, Guterres alertou para o facto de a região atravessar não só uma crise humanitária, mas também "uma crise moral que desafia a consciência mundial".
"Desde o início, condenei repetidamente os horríveis ataques do Hamas de 7 de outubro [de 2023]. Mas nada pode justificar a explosão de mortes e destruição que temos testemunhado desde então. A dimensão e o alcance ultrapassam tudo o que vimos na história recente", afirmou o secretário-geral da ONU.
"Não consigo explicar o nível de indiferença e inação que vemos por parte de demasiadas pessoas na comunidade internacional. A falta de compaixão. A falta de verdade. A falta de humanidade", afirmou.
Na mesma intervenção, Guterres recorreu à ironia para lembrar que as crianças dizem em Gaza que "querem ir para o paraíso", porque lá, prosseguiu o representante, "pelo menos, dizem elas, há comida".
"Não se trata apenas de uma crise humanitária. É uma crise moral que desafia a consciência mundial. Continuaremos a falar sempre que for possível. Mas as palavras não alimentam crianças famintas", frisou.
O secretário-geral descreveu ainda as condições em que operam os "heroicos" trabalhadores humanitários da ONU, que continuam a fazer o seu trabalho "em circunstâncias inimagináveis".
"Muitos estão tão anestesiados e exaustos que dizem não se sentirem nem mortos nem vivos. Participamos em videochamadas com os nossos próprios humanitários que estão a morrer à fome diante dos nossos olhos", relatou.
Guterres denunciou também a morte de "mais de mil palestinianos, abatidos quando tentavam procurar comida" desde 27 de maio, data em que começou a operar a Fundação Humanitária de Gaza (GHF), uma entidade apoiada por Israel e pelos Estados Unidos com a qual a ONU se recusa a colaborar.
"Precisamos de ação, de um cessar-fogo imediato e permanente, da libertação imediata e incondicional de todos os reféns, de acesso humanitário imediato e sem entraves", apelou o representante, assegurando que, em caso de cessar-fogo, a ONU está preparada para aumentar "substancialmente" as suas operações humanitárias.
Num novo balanço do conflito, divulgado na quinta-feira, o Ministério da Saúde de Gaza, controlado pelo Hamas, informou que registou 59.587 mortos e 143.498 feridos. Na contagem incluem-se pelo menos 115 mortos por fome ou desnutrição desde o início da ofensiva israelita, em outubro de 2023.
A guerra em curso em Gaza foi desencadeada pelos ataques liderados pelo grupo extremista palestiniano Hamas em 7 de outubro de 2023 no sul de Israel, que causaram cerca de 1.200 mortos e mais de duas centenas de reféns.
A retaliação de Israel, que também impôs um bloqueio à entrega de ajuda humanitária, provocou igualmente a destruição de quase todas as infraestruturas de Gaza e a deslocação forçada de centenas de milhares de pessoas.
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