De acordo com um relatório do Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA), a que a Lusa teve hoje acesso, cerca de 4,9 milhões de moçambicanos enfrentam atualmente níveis elevados de insegurança alimentar aguda devido aos fenómenos climáticos associados ao `El Niño´.
"Em resposta à seca induzida pelo `El Niño´, foi lançado um apelo contra a seca em setembro para responder às necessidades humanitárias urgentes nos distritos mais severamente afetados. O apelo identificou três milhões de pessoas que necessitavam de assistência imediata em áreas afetadas pela seca", refere aquela agência da Nações Unidas, acrescentado que cerca de 1,4 milhões de pessoas são alvo da ajuda humanitária daquele organismo.
Segundo o OCHA, em abril, subsistiam lacunas significativas na resposta humanitária no país, onde cerca de 35% dos 1,4 milhões de pessoas visadas para ajuda foram alcançadas.
"Os progressos realizados em setores específicos também refletem estas lacunas", explica-se no relatório, acrescentando-se que dos 1,4 milhões de pessoas "visadas", o cluster de Segurança Alimentar e Meios de Subsistência "atingiu aproximadamente 36%, o cluster de Nutrição 14%, o cluster de higiene atingiu 4%, enquanto o cluster de Proteção atingiu menos de 0,1%".
De acordo com aquela agência, estes números sublinham "lacunas críticas" em vários setores que salvam vidas e realçam a necessidade "urgente" de recursos adicionais para assegurar uma resposta multissetorial coordenada.
"O apelo contra a seca continua a ser gravemente subfinanciado. Até abril, foram assegurados 29 milhões de dólares [25,2 milhões de euros] - ou 13% dos 222 milhões de dólares [193 milhões de euros] necessários", acrescenta.
O Presidente de Moçambique, Daniel Chapo, pediu na terça-feira ações imediatas e conjuntas entre os países africanos para travar a "crescente" ameaça da seca e o avanço "implacável" da desertificação no continente.
"Países da África austral, como o Zimbabué, a Zâmbia, Malaui, Moçambique e África do Sul enfrentam frequentemente secas severas induzidas pelo fenómeno 'El Niño'. Paradoxalmente, países do Corno de África --- como a Etiópia, a Somália e o Quénia --- enfrentam secas severas há anos, onde se observa a ocorrência do fenómeno 'La Niña'", explicou.
Segundo Chapo, o 'El Niño', que atingiu o continente entre 2023 e 2024, provocou uma das secas "mais severas" das últimas décadas na África Austral: "Mais de 30 milhões de pessoas, em toda a região, foram afetadas, enfrentando fome aguda, desnutrição e necessidades humanitárias crescentes".
Moçambique é considerado um dos países mais severamente afetados pelas alterações climáticas globais, enfrentando ciclicamente cheias e ciclones tropicais durante a época chuvosa, mas também períodos prolongados de seca severa.
Só entre dezembro e março, o país foi atingido por três ciclones, que, além da destruição de milhares de casas e infraestruturas, provocaram cerca de 175 mortos, no norte e centro do país.
Os eventos extremos provocaram pelo menos 1.016 mortos em Moçambique entre 2019 e 2023, afetando cerca de 4,9 milhões de pessoas, segundo dados do Instituto Nacional de Estatística.
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