Em declarações à Lusa - feitas com recurso a um tradutor - a propósito da sua passagem pelo Porto, questionada sobre se há pressão por ser atualmente uma referência para as meninas no seu país natal, Amena Karimyan reconheceu que "há pressão", mas não tem "outra forma de atuar".
"Não posso esquecer aquelas mulheres que ainda estão no Afeganistão. Se o fizer, é trair-me e trair o meu passado. Eu estive lá, eu sei como é, mas agora é a vez delas. Isto é algo que eu faço para elas, para as meninas, para o Afeganistão", disse à Lusa na Universidade Católica do Porto, onde foi protagonista da conferência "Ciência, Liberdade e Futuros Prósperos".
Amena Karimyan, engenheira civil e astrónoma, promove o ensino da astronomia junto de jovens no Afeganistão em contextos marcados pela repressão e pelo conflito, tendo liderado uma equipa feminina premiada na Olimpíada Internacional de Astronomia e Astrofísica e, no mesmo ano, foi distinguida pela BBC como uma das 100 mulheres mais inspiradoras e influentes do mundo.
"Temos de perceber que nos podemos sacrificar nalgumas situações da vida, mas temos uma visão maior. Vemos as meninas e as mulheres no futuro, e gostaríamos de lhes dar uma pequena esperança para o futuro", prosseguiu.
Amena Karimyan fugiu do Afeganistão para o Paquistão quando os talibãs voltaram ao poder, em 2021, tendo sido capturada e alvo de torturas e posteriormente libertada, prosseguindo a sua viagem para a Europa.
Atualmente a viver na Alemanha, continua com o seu Grupo Astronómico Kayhana, em que dá aulas de astronomia, remotamente, a jovens no Afeganistão e não só.
"Claro que há alguns riscos nestas atividades, em geral. Fazemos o nosso melhor ao reduzir os riscos, não publicando as identidades, a maioria dos nossos membros são anónimos", contou à Lusa.
A prioridade são "as vidas deles e a sua segurança, e depois, em segundo lugar" vem a astronomia e as restantes atividades.
Questionada sobre as suas vivências na Europa, admite que sente "discriminação" e que não é "tratada da mesma forma como outro estudante na Europa", tendo de "de gastar muito mais esforço para ser equivalente aos outros".
"Recebi muito apoio, felizmente, sobretudo de pessoas da academia, professores de Astronomia e Ciência em geral. Aqui em Portugal também, na Alemanha, na Áustria, Espanha. Há algum apoio, especialmente da parte da sociedade que é menos política e mais científica", conta à Lusa.
Como migrante, refere que algumas pessoas "não apoiam" a imigração, tendo de "gastar muito tempo e energia nisso", mas através da divulgação da sua história pôde "arranjar algum apoio" para fazer o que quer fazer, mas por vezes ainda é "desafiante ter apoio para o grupo e para as atividades" devido às limitações e restrições.
"Mas eu faço o meu melhor para continuar esta viagem por causa do objetivo de todo o projeto", disse.
Amena ainda tem o sonho de ser a primeira afegã a ir ao espaço e à Lua, mas reconhece que "há burocracia, políticas, educação e preparação" necessárias.
"Claro que vou fazer o meu melhor, mas posso sempre ser uma boa cientista, professora ou engenheira", completou.
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