A guerra de invasão realizada pela Rússia do Presidente Vladimir Putin desde 24 de fevereiro de 2022 na vizinha Ucrânia "não tem nada que ver com a luta contra o nazismo: não passa de uma cobertura" para uma "loucura imperial" e "crimes atrozes", declarou Frank-Walter Steinmeier, num discurso comemorativo proferido no Bundestag, a câmara baixa do parlamento alemão.
Steinmeier dirigiu também palavras muito duras aos Estados Unidos presididos pelo magnata republicano Donald Trump, que criticou por pôr em causa a ordem mundial e os valores estabelecidos após os horrores da Segunda Guerra Mundial (1939-1945).
"O facto de os Estados Unidos, que desempenharam um papel importante na formação desta ordem, estarem agora a afastar-se dela é um choque de proporções sem precedentes", afirmou o chefe de Estado alemão.
"Trata-se, nem mais nem menos, de uma dupla rutura histórica - a guerra de agressão protagonizada pela Rússia e a rutura dos valores norte-americanos - que marca o fim do longo século XX", considerou.
Steinmeier expressou "profunda gratidão" aos "soldados aliados - norte-americanos, britânicos" - e aos "movimentos de resistência europeus" que libertaram a Alemanha do terror nazi, e sublinhou "o papel fundamental do Exército Vermelho", que perdeu "pelo menos 13 milhões de soldados e outros tantos civis" e libertou o campo de extermínio de Auschwitz.
"É precisamente por esta razão que nos opomos firmemente às atuais falsificações históricas do Kremlin", insistiu.
"Mesmo que isso seja reafirmado amanhã [sexta-feira] durante as celebrações da vitória em Moscovo, a guerra contra a Ucrânia não é uma continuação da luta contra o fascismo", sublinhou o chefe de Estado alemão.
O Kremlin realiza na sexta-feira grandes celebrações em Moscovo, com a presença de líderes estrangeiros, em que Putin manterá o culto patriótico da vitória de 1945 e defenderá que a invasão em grande escala da Ucrânia é uma extensão da guerra contra Adolf Hitler.
O embaixador russo em Berlim não foi convidado para a cerimónia no Bundestag, que decorre num dia excecionalmente proclamado feriado na capital alemã.
No discurso, Steinmeier salientou a importância de defender a memória de 08 de Maio de 1945 contra os extremismos que "querem virar a página" da memória coletiva e banalizar o Holocausto.
"Isso seria trair as lições do passado", advertiu.
O discurso deixou indiferentes os membros de extrema-direita do partido Alternativa para a Alemanha (AfD), atualmente o maior grupo da oposição no Bundestag, cujos deputados não aplaudiram, na maioria, o chefe de Estado.
Na Alemanha e na Europa, "o fascínio pelo autoritarismo e pelas sereias populistas está de novo a ganhar terreno", afirmou Steinmeier com preocupação.
"Assistimos com horror ao facto de mesmo a mais antiga democracia do mundo poder rapidamente ser posta em risco quando a justiça é desprezada, a separação de poderes suprimida e a liberdade científica atacada", acrescentou, numa referência aos Estados Unidos.
"Hoje, já não devemos, portanto, perguntar-nos: o 08 de Maio libertou-nos? Devemos antes perguntar-nos: como podemos continuar a ser livres?", defendeu o Presidente alemão.
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