"O Governo do Presidente [nigeriano], Bola Tinubu, tem mantido estes menores detidos desde agosto por protestos contra a fome e a corrupção, sem acesso a assistência jurídica ou à família. Devido às terríveis condições de detenção, muitos deles necessitam de cuidados médicos urgentes", declarou na sexta-feira a Amnistia Internacional (AI), em comunicado.
A organização não governamental de defesa dos direitos humanos referiu que quatro dos jovens detidos desmaiaram durante a audiência, num tribunal federal na capital, Abuja, "sublinhando a sua fraca saúde, física e mental".
"Deter ilegalmente menores e submetê-los a julgamentos fictícios é uma nova dimensão dos persistentes ataques do Governo nigeriano aos direitos humanos", afirmou a AI.
OS 76 manifestantes foram acusados de dez crimes, incluindo traição, destruição de propriedade, perturbação da ordem pública e motim, de acordo com a folha de acusação vista pela agência de notícias Associated Press (AP), a qual indica que os menores têm entre 14 e 17 anos.
Todos os arguidos se declararam inocentes das acusações de traição ou de incitamento ao motim.
A pena de morte foi introduzida na Nigéria na década de 1970, mas desde 2016 que não se registam execuções no país.
Akintayo Balogun, um advogado baseado em Abuja, disse que a Lei dos Direitos da Criança não permite que qualquer menor seja sujeito a um processo criminal e condenada à morte.
"Por isso, levar menores a um tribunal superior federal é errado, 'ab initio', exceto se o Governo conseguir provar que os rapazes têm todos mais de 19 anos", afirmou Balogun à AP.
O tribunal acabou por conceder uma fiança de 10 milhões de nairas (5.422 euros) a cada um dos arguidos e impôs condições rigorosas que ainda não foram cumpridas, disse Marshal Abubakar, advogado de alguns dos rapazes.
"Um país que tem o dever de educar os seus filhos decide castigá-los. Estas crianças estão detidas há 90 dias sem comer", afirmou Abubakar.
No início de setembro, o Ministério Público nigeriano acusou dez outros manifestantes de traição e de desestabilização do país, em julgamentos descritos pela AI como "tentativas bizarras e intermináveis de privar as pessoas do direito ao protesto pacífico".
Só no primeiro dia de protestos, no início de agosto, foram mortas pelo menos 21 pessoas, disse na altura à agência de notícias EFE a Frente de Ação Unida da Sociedade Civil, um dos grupos que liderou as marchas, enquanto a AI estimava em 13 o número de mortos.
Dias depois do início das manifestações, o Presidente comprometeu-se a resolver as preocupações dos jovens, garantindo que algumas medidas controversas que tomou desde que chegou ao poder em maio de 2023 - como a retirada do subsídio aos combustíveis - eram necessárias para "salvar a economia".
Porém, o custo de vida na Nigéria só tem aumentado durante o mandato de Tinubu, com a inflação a atingir um máximo histórico de 33,95% em junho, fazendo subir os preços de produtos básicos como o arroz, o milho e o inhame, tornando-os incomportáveis para muitos nigerianos.
A Nigéria é o país mais populoso de África, com mais de 213 milhões de habitantes, e um dos principais produtores de petróleo, bem como uma das maiores economias, do continente.
No entanto, quatro em cada dez nigerianos vivem abaixo do limiar de pobreza, de acordo com o Banco Mundial.
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