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"Fazer sozinha"? Foi violada e teve de mudar de estado para abortar

Hospitais brasileiros rejeitaram interromper mais do que uma vez a gravidez de Maria Clara, vítima de violação. Projeto de lei que visa limitar ainda mais o direito ao aborto no país está a causar polémica.

"Fazer sozinha"? Foi violada e teve de mudar de estado para abortar
Notícias ao Minuto

18:25 - 17/06/24 por Notícias ao Minuto

Mundo Brasil

Um projeto de lei que prevê 'apertar' o direito ao aborto no Brasil está a mexer com o país, tendo já milhares de manifestantes saido à rua num combate contra esta ideia. Em causa está um documento no qual está previsto que a interrupção voluntária da gravidez seja tratada como homicídio a partir das 22 semanas de gestação.

O projeto em questão não prevê sequer exceções para casos de violação. Várias manifestações têm acontecido em grandes cidades, com os protestos a apontarem uma das grandes questões, a gravidez na adolescência. Segundo dados do sistema público de saúde brasileiro, a cada hora nascem 44 bebés de mães adolescentes no Brasil, dos quais dois são de gestantes entre 10 e 14 anos.

Esta segunda-feira, o g1 traz a história de uma mulher que passou por muitas barreiras até fazer a intervenção, para a qual se teve que deslocar de estado.

A imprensa brasileira dá-lhe o nome fictício de Maria Clara - esta mulher foi violada e foi-lhe negado um aborto por três hospitais de São Paulo, o que a fez levar o caso à justiça.

Maria Clara conta que só descobriu que estava grávida com 24 semanas. "Não tive nada de diferente, não tive barriga, não tive sintoma, não tive nada", recorda.

A primeira barreira foi num hospital que é o referenciado para os casos de violência sexual, local onde a médica não lhe disse de quanto tempo ela estava grávida, e aconselhou-a a procurar ajuda da Defensoria Pública de São Paulo. A mulher procurou esta ajuda, que a reencaminhou para um outro hospital, onde mais uma vez a intervenção - prevista pela lei - lhe foi negada.

"Fiz a triagem e o médico relatou a mesma coisa: que não poderia fazer o aborto no hospital porque estava muito avançada a gestação. Eu já estava perdendo as esperanças. Já não estava muito bem psicologicamente e saí de lá mais abalada. Até então, eu estava achando que eu estava errada em tudo", explicou ao g1.

Com a ajuda da Defensoria Pública, Maria Clara foi encaminhada para uma terceira unidade hospitalar, onde garante que recebeu o pior tratamento. Segundo o que contou, foi obrigada a ouvir os batimentos cardíacos do feto. "Como o atendimento estava agendado, achei que eu ia chegar e iam estar me esperando. O atendimento foi péssimo, tive que falar perto de pessoas e o pior de tudo foi precisar ouvir o coração do feto. Eu pedi para ele [profissional de saúde] parar e tirar, levantei e saí da sala", referiu.

Foi lá que a tentaram convencer a não realizar  o aborto, o que a levou a ter alguns pensamentos desesperantes. "Fui embora para casa acabada, não sei nem explicar. Eu já estava pensando como fazer em casa sozinha porque eu não tinha condições", contou.

Maria Clara conta que no meio destes pensamentos, acabou por ser contactada pela Defensoria Pública, que lhe falou de um projeto no outro estado. A mulher foi contactada rapidamente e explicaram-lhe que o procedimento seria realizado noutro estado. "Foi tudo muito rápido e muito bem explicado. Parecia que eu estava fora do Brasil. Foi ótimo. Desde a abordagem do começo, os exames… Foi super respeitoso", afirmou.

O g1 falou ainda com a defensora pública do Núcleo de Promoção e Defesa dos Direitos das Mulheres, Paula Sant'Anna, que comparou a situação a um caso de tortura. "Há uma tendência de culpabilizar que aquela menina ou mulher demorou para procurar o sistema de saúde. Na verdade, muitas vezes elas procuram, mas recebem informações equivocadas, agendamentos longínquos, precisam de ajuda para chegar até o serviço de referência e não conseguem. Então, é sobre isso que a gente tá falando quando a gente fala de barreiras para acesso a esse abortamento", explicou a responsável.

Também a organização não-governamental Vivas defendeu que os serviços não estão preparados para atender as vítimas de violência sexual. "O que a gente tem encontrado são mulheres passando situações de violência. Elas chegam em serviços que estão totalmente despreparados para atendê-las em várias situações, entendimento do que é violência sexual, entendimento do que a lei pede. Então a gente tem serviços onde o boletim de ocorrência que não é necessário é pedido", explicam.

Leia Também: Brasileiras nas ruas contra proposta para equiparar aborto a homicídio

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