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"Capitalismo sem concorrência é exploração", diz Biden no Estado da União

No seu primeiro discurso do Estado da União perante um Congresso dividido, o presidente norte-americano promoveu as conquistas legislativas dos seus dois anos de mandato e prometeu o regresso em força da produção e manufatura no país. 

"Capitalismo sem concorrência é exploração", diz Biden no Estado da União
Notícias ao Minuto

06:52 - 08/02/23 por Lusa

Mundo EUA

"Estamos a garantir que a cadeia de abastecimento para a América começa na América", afirmou Joe Biden, num discurso em que passou bastante tempo a falar da economia, infraestruturas e emprego, e onde anunciou propostas e medidas. 

Uma delas foi referente ao fabrico doméstico. "Estou a anunciar novos requisitos para que todos os materiais de construção usados em projetos de infraestrutura federais sejam fabricados na América", afirmou Biden. "Madeira serrada, vidro, placa de gesso, cabos de fibra ótica feitos na América", disse. 

Este foi um dos pontos transversais ao discurso do Estado da União: o foco na produção doméstica, no regresso aos bons empregos de colarinho azul e o aceno a uma classe trabalhadora que se tem sentido "esquecida", bem como muita insistência nas reformas da saúde. 

Tudo num contexto em que, apesar da queda da inflação, do crescimento económico e do desemprego historicamente baixo, muitos americanos sentem que o país está em má forma económica e a caminho de uma recessão. 

No plano económico, Biden lançou farpas às grandes empresas que aumentaram preços nos últimos anos ao mesmo tempo que mantiveram os salários do funcionários no mesmo patamar. O presidente democrata defende que isto aumentou o preço da comida para os americanos, uma vez que as pequenas empresas desapareceram. "Já me ouviram dizer isto antes: capitalismo sem concorrência não é capitalismo. É exploração. E eu estou determinado em acabar com a exploração".

O Estado da União, visto por dezenas de milhões de americanos, foi a oportunidade de Joe Biden de mudar a narrativa e também de encostar os republicanos à parede na disputa sobre o teto da dívida pública, que tem se ser levantado para que o país possa pagar as contas. 

"Alguns dos meus amigos republicanos querem tomar a economia como refém, a não ser que eu aceite os seus planos económicos", apontou Biden. 

"Em vez de fazerem os ricos pagarem a sua parte, alguns republicanos querem que a Medicare e a Segurança Social desapareçam", disse. 

Vários congressistas republicanos reagiram com apupos e vaias a estas declarações, sendo que a extremista Marjorie Taylor Greene gritou mesmo "mentiroso!". 

O presidente sorriu e interpelou os agitadores, incentivando-os a contactarem o seu gabinete para receberem uma cópia daquela proposta. Perante a negação do outro lado da bancada, Biden disse apreciar "a conversão" de congressistas que agora "veem" que isto não deve ser feito. A proposta, do senador republicano Rick Scott, está disponível no plano 'Rescue America' de 2022. 

O momento foi um dos mais analisados a seguir ao discurso. O ex-jornalista da Fox News Chris Wallace disse que os republicanos "caíram na jogada" do presidente e o pivô da CNN Jake Tapper considerou que os agitadores "ficaram a parecer mal e deram a Biden uma oportunidade de parecer vigoroso"

Estas trocas contrastaram com os apelos do presidente ao bipartidarismo e ao trabalho conjunto com os republicanos para melhorar a vida dos americanos. Muitas das propostas de que falou, desde a descida dos preços da insulina ao fim das taxas escondidas nas reservas de viagens, não são controversas. 

"Assinei mais de 300 leis bipartidárias desde que assumi a presidência", afirmou Biden. "Meus amigos republicanos, se trabalhámos juntos na última sessão do Congresso, não há razão para não trabalharmos também neste". 

A mensagem e o tom do presidente agradaram ao público, com as sondagens pós-discurso da CNN a resultarem numa avaliação positiva de 72% dos eleitores. Foi um ponto percentual acima do desempenho no ano passado. 

A energia combativa de Biden foi temperada em certos momentos-chave, como a altura em que apresentou os pais de Tyre Nicholls, um afro-americano que morreu espancado por quatro polícias em Memphis. O presidente elogiou a coragem da mãe de Nicholls, que lhe disse que ele era "uma alma bonita e algo bom sairá daqui". 

Também esteve presente Brandon Tsay, um jovem que lutou com o atirador que matou 11 pessoas num estúdio de dança em Monterey, Califórnia. A história foi o mote para falar da violência armada e da necessidade de "banir as armas de assalto". 

Biden também se antecipou a alguns ataques republicanos. "Se vocês não vão aprovar a minha extensa reforma da imigração, ao menos aprovem o plano para fornecer o equipamento e agentes necessários para proteger a fronteira". 

Em muitas ocasiões, o democrata falou de "terminar o que foi começado", algo que foi entendido como uma alusão à recandidatura para um segundo mandato como presidente. 

Também se mostrou otimista e não poupou elogios ao espírito e à alma da América, um país que emerge "mais forte" das crises e é marcado pelo "progresso e resiliência". 

Biden abordou o fim da emergência de saúde devido à pandemia de Covid-19, a revogação do direito federal ao aborto e a crise de mortes provocadas pelo abuso de opiáceos, em especial Fentanil. 

O chefe de Estado fez ainda referência à China, depois de ter sido abatido um alegado balão de espionagem no espaço aéreo norte-americano. "Se a China ameaçar a nossa soberania, agiremos para proteger o nosso país", afirmou. Alguns comentadores apontaram para a brevidade com que o tema foi tratado, um dos pontos fracos do discurso tendo em conta a seriedade da situação. 

Também na política externa, Biden saudou a liderança norte-americana na ajuda à Ucrânia e na aliança transatlântica contra a invasão russa e a tirania, garantindo que as democracias estão mais fortes. "Apostar contra a América nunca foi uma boa aposta", disse, levando a audiência a irromper em cânticos de "USA! USA!". O democrata prometeu continuar a apoiar a Ucrânia "pelo tempo que for preciso". 

"Porque a alma da nação é forte, a sua espinha dorsal é forte e o povo da nação é forte, o Estado da União é forte", concluiu o presidente. "Somos os Estados Unidos da América e não há nada que fique além da nossa capacidade se o fizermos juntos", acrescentou.

O tom otimista de Biden foi rejeitado por Sarah Huckabee Sanders, governadora do Arkansas e ex-secretária de imprensa da Casa Branca de Donald Trump, que entregou a resposta republicana. 

Sanders traçou o retrato de uma América acossada pela "esquerda radical" e em risco de perder as suas liberdades, perante um Joe Biden "fraco", incapaz de proteger as fronteiras e dominado pela opressão da "turba woke" (socialmente progressista). 

"A América é grande porque somos livres, mas a nossa liberdade está sob ataque", resumiu, depois de falar de reformas na educação, que rejeitem "a doutrinação" das crianças, e de uma nova geração de republicanos prontos a lutar pelos cidadãos. 

"A escolha não é entre a direita e a esquerda, é entre normal e maluco", apontou Sanders, argumentando que os republicanos são os normais e os democratas os malucos. 

O comentador Van Jones considerou que a resposta a fez parecer "mesquinha" de uma forma desnecessária e o estratega David Axelrod afirmou que pode ter resultado com a base do partido republicano mas que falhou em chegar ao eleitorado em geral. 

Nas reações, o ex vice-presidente Mike Pence disse que o discurso mostrou que "é tempo para uma nova liderança republicana" e apontou "a liderança externa falhada" de Joe Biden, espelhadas na guerra da Ucrânia e na retirada "desastrosa" do Afeganistão. 

Já Nikki Haley, antiga embaixadora dos EUA nas Nações Unidas, criticou o plano económico de Biden e as suas políticas relativas à fronteira, dizendo que ele passou "dois anos a recusar-se a resolver a crise que criou".  

O Estado da União é tradicionalmente a arma de comunicação direta mais poderosa de um presidente. No discurso do ano passado, 38 milhões de americanos assistiram à transmissão televisiva.

Leia Também: Biden assegura apoio dos EUA à Ucrânia pelo "tempo que for preciso"

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