Presidente timorense culpa mais ricos por danos climáticos
Países frágeis como Timor-Leste são as principais vítimas colaterais do impacto climático da exploração do planeta pelos países mais poderosos, mas têm igualmente que assumir parte de responsabilidade, disse o chefe de Estado timorense.
© Lusa
Mundo Timor-Leste
"Nós e as nossas nações irmãs dos pequenos Estados em desenvolvimento e menos desenvolvidos, dos Estados frágeis, somos as principais vítimas colaterais de décadas de exploração, depredação e destruição, de poderes maiores. Mas sejamos honestos e não culpemos todas as nações maiores e mais ricas. Nós também devemos aceitar parte da culpa", afirmou, na quarta-feira à noite, José Ramos-Horta.
"Somos nós que queimamos as nossas florestas, derrubamos as nossas árvores por ganância extrema e para satisfazer os outros, somos nós que desperdiçamos o bem mais precioso da humanidade, a água potável", afirmou o presidente timorense, considerando essencial a adoção de novas atitudes e comportamentos.
"Nós é que despejamos descuidadamente plástico e outros resíduos nos rios e mares. Nós, em Timor-Leste, e centenas de milhões no mundo em desenvolvimento, devemos parar de apontar o dedo e mudar o nosso próprio comportamento, conservar energia, usar menos ar condicionado, parar de desperdiçar bens públicos", afirmou.
José Ramos-Horta falava na receção oferecida a embaixadores residentes e não residentes em Timor-Leste e responsáveis de agências das Nações Unidas, no histórico Palácio de Lahane, em Díli.
Ao defender um amplo programa de reflorestação, com árvores nas cidades, vilas e montanhas, e árvores de fruto nas escolas e em todas as aldeias, Ramos-Horta considerou que os timorenses deviam implementar uma "economia verde e sustentável, centrada no povo", promovendo uma "agricultura sustentável como prioridade" do país.
Uma "política da água, de proteção das fontes de água, gera novas fontes de água do solo, da chuva e do mar", frisou.
A poucos meses das legislativas, e sobre o que considerou serem prioridades do país, Ramos-Horta defendeu "uma casa decente para cada família vulnerável, água limpa para todos, emprego para os jovens, a eliminação da pobreza extrema, da subnutrição e do analfabetismo", bem como uma "educação básica de qualidade e educação profissional para todos, incluindo educação digital, língua inglesa e outras línguas".
"Vejo Timor-Leste como uma nação de poliglotas, com todos os timorenses no futuro a dominarem as nossas duas línguas oficiais [português e tétum], bem como o indonésio e o inglês. E a nossa juventude deve ser motivada para aprender mandarim, coreano, árabe", afirmou.
Uma visão que Timor-Leste quer partilhar com os parceiros internacionais a quem apelou para que se juntem aos timorenses, contribuindo para o desenvolvimento de um país que "é um oásis de tranquilidade", disse.
Ramos-Horta destacou a paz e a harmonia das "relações exemplares" de Timor-Leste com os vizinhos, a ausência de violência política motivada ou de casos de violência religiosa e étnica, bem com os internacionalmente reconhecidos níveis de liberdade de imprensa.
"A nossa democracia é dinâmica, mas ainda pertencemos à categoria 'frágil'. E por qualquer definição ainda somos um país menos desenvolvido", disse.
"Um exemplo óbvio da nossa fragilidade é melhor ilustrado, ironicamente, pelo número excessivo de agências de segurança com funções sobrepostas, exacerbadas pelo seu flagrante desrespeito por mandatos claramente definidos. Tive dificuldades em localizar o número de agências ou estruturas de segurança civil e militar, todas com armas de fogo e todos envolvidos em assuntos policiais essencialmente menores", afirmou.
Sobre as legislativas, previstas para maio e cuja data deverá anunciar ainda este mês, Ramos-Horta disse que vai assegurar-se de que "não haverá tentativa de interferência por ninguém", pedindo à comunidade internacional a implementação de missões de observadores.
A nível interno, disse que a Comissão de Justiça e Paz, da Igreja timorense, quer ter observadores em todo o país, e "precisa de apoio financeiro ou outro".
Sem pormenorizar, Ramos-Horta disse que as eleições presidenciais de 2022, nas quais foi eleito, "não foram livres de interferência política e manipulação", referindo que "muitos casos de interferência flagrante foram relatados".
"Tenciono observar de hora a hora as eleições parlamentares. Em parceria com a Comissão Nacional de Eleições, levantarei a bandeira vermelha sempre que detetarmos irregularidades", avisou.
O timorense reiterou ainda a defesa da Carta da ONU, a promoção da lei do mar, acrescentando que o país "rejeita firmemente a militarização do mar do Sul da China".
"Aderiremos a qualquer posição de consenso adotada pela nossa organização regional comum ASEAN [Associação de Nações do Sudeste Asiático]. Timor-Leste defende ativamente a centralidade da ASEAN. A este respeito, Timor-Leste apoia plenamente a posição da ASEAN sobre o golpe militar e as violações grosseiras, sistemáticas e generalizadas dos direitos humanos contra civis e opositores políticos em Myanmar [antiga Birmânia]", disse, sublinhando que Timor-Leste "exige o regresso do regime constitucional".
O chefe de Estado comprometeu-se a reforçar as relações com vários parceiros na região, com a Índia, onde Timor-Leste vai estabelecer uma embaixada, e com os parceiros da Lusofonia.
"As relações com Portugal e outros países de língua portuguesa mantêm-se tão fortes como sempre. Tive o prazer de ter assistido à tomada de posse do presidente [Luiz Inácio] Lula [da Silva] e tive a honra de viajar de Lisboa para o Brasil com o Presidente Marcelo Ribeiro de Sousa", lembrou.
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