Meteorologia

  • 27 ABRIL 2024
Tempo
17º
MIN 11º MÁX 17º

Brasil. Uma tatuagem de Anitta trouxe ao de cima um escândalo financeiro

A discussão começou quando o cantor de sertanejo usou um anúncio pessoal feito pela Anitta para criticar a Lei Rouanet, "principal ferramenta de fomento à cultura do Brasil" - apesar de também recorrer a outros tipos de financiamento público. O ataque entre artistas abriu uma 'caixa de Pandora' sobre uso indevido de dinheiros públicos.

Brasil. Uma tatuagem de Anitta trouxe ao de cima um escândalo financeiro

Uma tatuagem, aparentemente, inocente da artista brasileira Anitta trouxe ao de cima um escândalo financeiro relacionado com a Lei Rouanet (que tem como objetivo apoiar a cultura no Brasil) e a aplicação de verbas públicas em concertos.

O caso teve início a 13 de maio, quando o cantor Zé Neto, da dupla de sertanejo Zé Neto e Cristiano, criticou a cantora e a Lei Rouanet durante um concerto. “Estamos aqui em Sorriso, Mato Grosso, um dos estados que sustentou o Brasil durante a pandemia. Nós somos artistas que não dependemos da Lei Rouanet. O nosso cachê quem paga é o povo. A gente não precisa de fazer tatuagem no ‘toba’ [ânus] para mostrar se a gente está bem ou mal. A gente simplesmente vem aqui e canta, e o Brasil inteiro canta com a gente”, afirmou o artista.

Em causa, está uma tatuagem numa zona íntima de Anitta realizada há vários anos. No ano passado, um vídeo da artista a retocar a marca tornou-se viral.

Os comentários de Zé Neto foram alvo de críticas, tendo várias personalidades e familiares da cantora brasileira saído em sua defesa. Enquanto o youtuber Felipe Neto destacou que o cantor de sertanejo “precisa atacar a colega de profissão para ser notado” e que “tinha de ser minion [nome dado aos apoiantes do presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, que é manifestamente contra a lei]", o pai de Anitta revelou que Zé Neto “sempre teve problemas unilaterais” com a sua filha.

O cantor defendeu-se e numa publicação nas redes sociais escreveu: “Não falei o nome de ninguém. Mas o engajamento está top. Mete o pau. Desculpa não responder todo mundo, é que tenho 23 shows neste mês. Então, vou descansar aqui. Beijo, pessoal”.

Porém, autor dos comentários também recorre a verbas públicas

No entanto, apesar da explicação, já tinha sido aberta uma ‘caixa de pandora’ no que toca à Lei Rouanet e o uso indevido de dinheiro público. Na rede social Twitter, o jornalista Demétrio Vecchioli revelou que o próprio grupo ‘Zé Neto e Cristiano’, que criticou a lei, também usou verbas públicas, vindas de municípios. Atuou em, pelo menos, oito “prefeituras pequenas, sem licitação”, com recurso a verbas municipais. Só o concerto em Sorriso, no estado de Mato Grosso, custou cerca de 400 mil reais [78 mil euros] ao município.

“Eles são contratados por inexigibilidade. A prefeitura [autarquia] fala: quero contratar a dupla tal. A dupla diz: tem que pagar para a empresa tal, o valor é esse. E a prefeitura vai lá e paga o valor pedido (justo ou não) para a empresa indicada”, explicou o jornalista.

Já ao abrigo da Lei Rouanet, segundo uma explicação de Vecchioli, “o artista pede dinheiro, por exemplo, para montar um álbum. No projeto, ele coloca quanto custa a hora do técnico de som, o aluguel do estúdio, o fotógrafo… apresenta três orçamentos. O governo aprova o valor, e autoriza a pedir doações para empresas, que descontam no Imposto de Renda”.

A lei em causa, formalmente denominada como ‘Lei de Incentivo à Cultura’ e em vigor desde 1991, é a “principal ferramenta de fomento à cultura do Brasil”. “Contribui para que milhares de projetos culturais aconteçam, todos os anos, em todas as regiões do país. Por meio dela, empresas e pessoas físicas podem patrocinar espetáculos - exposições, shows, livros, museus, galerias e várias outras formas de expressão cultural - e abater o valor total ou parcial do apoio do Imposto de Renda”, refere o governo do Brasil. 

Qual é então a diferença entre a Lei Rouanet e as verbas municipais?

“A falta de controlo”, explica o jornal brasileiro A Folha de São Paulo. No primeiro caso, existe um portal onde os cidadãos podem pesquisar os projetos que já foram ou que estão a ser financiados pela Lei Rouanet, já no caso das verbas municipais é “inviável uma pesquisa sobre todas as apresentações contratadas por meio desse financiamento” e é a prefeitura que artistas quer contratar. Não há, inclusive, regras como um limite por cachê.

Através da Lei Rouanet, o artista “precisa de correr atrás do dinheiro”, além de detalhar todos os custos de um projeto. Por exemplo, na realização de uma digressão, é necessário especificar o custo do transporte dos músicos e o aluguer do material de som. O teto por artista baixou de 45 mil reais [nove mil euros] para três mil [588 euros] durante o governo do presidente Jair Bolsonaro. 

Segundo o jornal, quem mais recorre a esta verba pública são os artistas de sertanejo, "visto que são eles que, diferentemente dos cantores de géneros como o pop, percorrem o Brasil de norte a sul e vão a cidadezinhas do interior para se apresentar em festivais do agronegócio". 

Cantor Gusttavo Lima no centro da polémica

Uma semana após as críticas à Lei Rouanet, o Ministério Público do Estado de Roraima abriu uma investigação a uma contratação do cantor Gusttavo Lima na cidade de São Luiz, fixada em 800 mil reais [157 mil euros]. Sublinhe-se que, de acordo com os mais recentes censos, a cidade é composta por 8.232 habitantes, o que, dividido pela população, cada cidadão estaria a pagar 97 reais [20 euros] pelo concerto.

Outro espetáculo de Gusttavo Lima, previsto para dia 20 de junho, na prefeitura de Conceição do Mato Dentro, foi avaliado em 1,2 milhões reais [235 mil euros], sendo financiado pela Compensação Financeira pela Exploração Mineral, cujas verbas só podem ser utilizadas na educação, saúde e infraestruturas.

Este último fim de semana, a prefeitura anunciou o cancelamento dos espetáculos tanto de Gusttavo Lima e como da dupla sertaneja Bruno e Marrone, justificando que há "uma guerra política e partidária que não tem nenhuma ligação com o município e nem tampouco com a tradicional festa".

Face à polémica, a cantora Anitta recorreu, no domingo, às redes sociais para explicar que a sua intenção era apenas fazer uma tatuagem e não dar início a uma discussão sobre os cachês pagos a artistas de sertanejo. “E eu achando que 'tava só fazendo uma tatuagem no tororó”, ironizou. 

Leia Também: Brasil pediu oficialmente a Portugal trasladação do coração de D. Pedro

Recomendados para si

;
Campo obrigatório