O Tribunal Penal Especial (CPS), criado pelo governo centro-africano sob patrocínio da ONU, vai julgar crimes de guerra e crimes contra a Humanidade cometidos desde 2003.
A instância judicial iniciou o primeiro julgamento em 25 de abril, adiado da primeira audiência, sem que os arguidos tivessem sido ouvidos por ausência dos seus advogados.
Os arguidos Issa Sallet Adoum, Ousman Yaouba e Tahir Mahamat, que integram o 3R (Retorno, Recuperação e Reabilitação), um dos mais importantes grupos rebeldes, estão a ser julgados por crimes de guerra e crimes contra a Humanidade, acusados de participarem, em 21 de maio de 2019, num massacre de 46 civis nas aldeias de Koundjili e Lemouna, no noroeste do país.
Os três homens, envergando macacões laranja da prisão, sem algemas e separados por um vidro à prova de bala, ficaram impassíveis, sob as suas máscaras anti-covid-19, enquanto se liam a referência dos crimes de que são acusados e os nomes das vítimas: "assassínios e tortura, outros ultrajes à dignidade da pessoa, em particular o tratamento desumano e outros atos degradantes".
Em seguida, Adoum e Yaouba tomaram a palavra e as suas primeiras declarações foram apresentar "desculpas ao povo centro-africano", sem, no entanto, reconhecer os factos de que são acusados.
Mahamat não expressou nenhum remorso. A audiência dos três homens durou aproximadamente duas horas e a audiência será retomada na terça-feira.
"A pessoa que deu a ordem para atacar Koundjili e Lemouna é Sidiki Abass", disse Issa Sallet Adoum, sem adiantar detalhes. Os 3R anunciaram a morte de seu líder, Sidiki Abass, em abril de 2021.
"Eles tentam insultar-se uns aos outros (...) Mas as verdadeiras vítimas, os sobreviventes desses incidentes estão lá (...) Vamos escutá-los e eles ajudarão o tribunal a chegar a uma decisão válida", considerou Claudine Bagaza Dini, advogada da parte civil.
Os trabalhos do CPS iniciaram-se em outubro de 2018 com as primeiras investigações. Este tribunal especial integra juízes e procuradores de, além da RCA, França, Togo e República Democrática do Congo (RDCongo).
A República Centro-Africana, o segundo país menos desenvolvido do mundo segundo a ONU, é palco de uma guerra civil desde 2013, muito mortífera nos primeiros anos, mas que diminuiu de intensidade desde 2018.
Nos primeiros anos opôs milícias de maioria muçulmana unidas na aliança Séléka, contra os anti-balakas, dominadas por cristãos e animistas, com a ONU a acusar os dois lados de crimes de guerra e crimes contra a Humanidade.
O conflito prossegue atualmente com grupos rebeldes armados, saídos da aliança Séléka e dos anti-balaka, por vezes unidos, contra as forças governamentais do Presidente Faustin Archange Touadéra, apoiado por centenas de paramilitares russos.
Leia Também: Países voltaram a querer petróleo e gás africano devido à guerra