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RCA. Castel vai investigar acusações de compra de segurança a milícias

O conglomerado vitícola francês Castel vai abrir um inquérito depois da publicação de um relatório pela organização não governamental (ONG) Sentry sobre o apoio financeiro de uma das suas filiais a milícias na República Centro-Africana (RCA).

RCA. Castel vai investigar acusações de compra de segurança a milícias
Notícias ao Minuto

00:43 - 20/08/21 por Lusa

Mundo RCA

A informação foi avançada pelo grupo em comunicado divulgado na quinta-feira.

Segundo a Sentry, especializada na identificação de 'dinheiro sujo', a Fábrica de Açúcar Africana da RCA (Sucaf RCA, na sigla em Francês), filial da Sociedade de Organização, Gestão e Desenvolvimento das Indústrias Alimentares e Agrícolas (Somdiaa), controlada em 87% pelo conglomerado vitícola Castel, "negociou um acordo de segurança" com a União para a Paz na RCA (UPC, na sigla em Francês), um grupo armado acusado de abusos.

O acordo destinava-se a "garantir a segurança da fábrica e dos campos de cana-de-açúcar" e "tentar proteger o monopólio da empresa", referiu a Sentry.

No comunicado, a direção-geral da Castel diz que "tomou conhecimento das alegações graves dirigidas em 18 de agosto à Sucaf RCA, filial centro-africana da Somdiaa, da qual a Castel é acionista".

Mais acrescentou que "incumbiu o seu comité de ética de proceder imediatamente a um inquérito, conforme aos procedimentos internos".

O resultado da investigação vai ser divulgado, garantiu o conglomerado.

Em troca da segurança das instalações, detalhou a Sentry na quarta-feira, a Sucaf RCA criou um "sistema sofisticado e informal para financiar as milícias armadas com pagamentos diretos e indiretos em dinheiro, bem como com apoio de outro género, como manutenção dos veículos e fornecimento de combustível".

Em declarações à AFP, o presidente da Somdiaa, Alexandre Vilgrain, tinha dito: "Não temos conhecimento de qualquer acordo feito pela direção da Sucaf RCA e não foi dado qualquer apoio".

A RCA, o segundo país mais pobre do mundo, segundo a Organização das Nações Unidas, vive uma acentuada crise político-militar desde 2013. Depois de uma guerra civil, vastas extensões do país ficaram sob controlo de milícias, que se apoderam dos seus recursos.  

A refinaria da Sucaf RCA e os 5.137 hectares de plantação de cana-de-açúcar encontram-se em Ngakobo, 400 quilómetros a leste da capital Bangui, na prefeitura de Ouaka, controlada entre o fim de 2014 e o início de 2021 pela UPC, uma das principais milícias do país.

Segundo a Sentry, o chefe da UPC, Ali Darassa, e aquele que era então o seu n.º 2, Hassan Bouba, principais beneficiários deste "acordo tácito" com a Sucaf RCA, foram responsáveis pelo ataque a um campo de deslocados, em novembro de 2018, em Alindao, que provocou a morte a pelo menos 112 pessoas, entre as quais 19 crianças.

Relatórios da segurança interna, recolhidos pela Sentry e consultados pela AFP, mostram que a direção da Somdiaa, em Paris, estava informada dos ataques e abusos realizados pelos grupos armados na prefeitura de Ouaka.

Em troca da segurança do local de Ngakobo, Ali Darassa e Hassan Bouba receberam uma dezena de milhares de euros por ano, entre 2014 e 2021, afirmou a ONG.

Os milicianos da UPC estacionados nos locais da fábrica também foram remunerados pela Sucaf RCA, segundo as entrevistas realizadas pela Sentry com os empregados da sociedade e subcontratados, bem como com milicianos da UPC.

O grupo armado também criou postos de controlo nas estradas. A Sucaf RCA e os seus subcontratados deveriam pagar taxas por cada camião que viajasse entre Ngakobo e Bangui, segundo a Sentry, que afirma que este sistema representou uma importante fonte de rendimento para a UPC.

Hassan Bouba, que agora é ministro, desmentiu à AFP que alguma vez tivesse havido qualquer acordo ou pagamento mensal.

Para "proteger o monopólio" da empresa na distribuição do açúcar nas várias províncias do país, a Sucaf RCA, segundo o relatório, conseguiu o apoio da UPC e de outras milícias no noroeste do país, "nomeadamente pela apreensão forçada do açúcar de contrabando", proveniente do vizinho Sudão. A Sentry avançou que os milicianos eram pagos por cada apreensão que fizessem.

"O açúcar era descarregado discretamente de noite, antes de ser colocado em sacos da Sucaf RCA para ser depois vendido a grossistas", relatou a Sentry.

O acordo de segurança, concluiu o documento, "continuou até março de 2021", quando os membros da UPC foram expulsos da zona por uma ofensiva das forças armadas do país e de mercenários russos.

A RCA caiu no caos e na violência em 2013, após o derrube do então presidente, François Bozizé, por grupos armados juntos na Séléka, o que suscitou a oposição de outras milícias, agrupadas na anti-Balaka.

Desde então, o território centro-africano tem sido palco de confrontos comunitários entre estes grupos, que obrigaram quase um quarto dos 4,7 milhões de habitantes da RCA a abandonarem as suas casas.

O país registou um pico de violência em meados de dezembro, quando a Coligação dos Patriotas pela Mudança (CPC, em francês), uma aliança formada por grupos armados em dezembro de 2020, lançou ofensivas com o objetivo de derrubar o regime de Touadéra e perturbar as eleições presidenciais.

A coligação enfrentou forças mais bem preparadas e equipadas, como os cerca de 12.000 'capacetes azuis' e centenas de soldados ruandeses e paramilitares russos enviados no final de dezembro pelos seus países.

Desde o início do ano, as forças governamentais conseguiram recuperar aos rebeldes as cidades e grande parte do território que controlavam há vários anos.

No entanto, os ataques dos rebeldes continuam a ser frequentes e aumentaram nas últimas semanas, sendo que, no sábado, pelo menos seis civis foram mortos no noroeste do país, junto à fronteira com os Camarões.

Portugal tem atualmente 241 militares na RCA, dos quais 183 integram a missão das Nações Unidas, Minusca.

Os restantes 58 militares portugueses participam na missão de treino, promovida pela União Europeia, até setembro deste ano.

Leia Também: RCA. Militares portugueses estiveram em operações de paz até 12 de agosto

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