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Manuscritos roubados de Céline reaparecem 77 anos depois

Mais de mil páginas manuscritas de Louis-Ferdinand Céline reapareceram após terem sido roubadas de sua casa em 1944, após a fuga do escritor francês devido às suas cumplicidades com oficiais nazis na Paris ocupada, indicou hoje o Le Monde.

Manuscritos roubados de Céline reaparecem 77 anos depois
Notícias ao Minuto

23:27 - 05/08/21 por Lusa

Mundo Louis-Ferdinand Céline

Estas manuscritos integravam a "lenda negra" do célebre autor, que denunciou incessantemente o roubo das suas criações literárias, incluindo 600 páginas do romance "Casse-pipe", um romance desconhecido intitulado "Londres", 1.000 páginas de "Morte a crédito" (1936) e outra série de documentos.

Segundo o diário Le Monde, uma parte será destinada à Biblioteca Nacional, que já reconheceu a autoria dos textos, escritos à mão por Céline e selecionados com molas de madeira, como era seu hábito.

Os textos inéditos deverão ser publicados pela Gallimard, a editora da sua restante obra.

Nos bastidores desta reaparição encontra-se o crítico de teatro Jean-Pierre Thibaudat, que trabalhou no diário Libération até 2006 e que após a morte da viúva de Céline, em 2019, a bailarina Lucette Destouches, divulgou os documentos que lhe foram entregues.

"Há muitos anos, um leitor do Libération telefonou-me dizendo que me queria dar uns documentos. No dia do encontro apareceu com dois sacos enormes que continham folhas manuscritas, de Louis-Ferdinand Céline", revelou ao diário de Paris.

Seguindo Thibaudat, o misterioso leitor, que não permitiu ser identificado, colocou como condição que não seria revelada a existência deste espólio até à morte de Destouches.

"Sendo de esquerda, não queria que a viúva do escritor enriquecesse", explicou.

A entrega ocorreu antes da sua saída do Libération, há mais de 15 anos.

Através de um advogado, Thibaudat avisou os atuais depositários da obra de Céline, o biógrafo de referência do escritor, François Gibault, de 89 anos, e Véronique Chovin, 69, amiga da viúva.

Após um encontro entre as partes em 2020, os herdeiros decidiram denunciar Thibaudat, que apesar de não exigir dinheiro pelos documentos, que poderiam alcançar valores muito elevados, decidiu impor condições sobre esse novo património.

"Por que motivo poderia dispor por teimosia de uns manuscritos que foram roubados durante a Libertação?", assinalou ao Le Monde o advogado dos herdeiros, Jérémie Assous.

No entanto, ao ser convocado pelo Gabinete central de luta contra o tráfico de bens culturais (OCBC), o crítico surgiu com todos os originais, que durante anos decidiu transcrever de novo.

Após serem autenticados, os documentos foram entregues a Chovin e Gibault, que admitem ceder o manuscrito de "Morte a crédito" à Biblioteca Nacional francesa, lhes permitirá cobrir as despesas dos processos legais relacionados com esta descoberta, indicou a agência noticiosa Efe.

Na Biblioteca Nacional encontra-se desde 2001 o original de "Viagem ao fim da noite", que foi comprado por 1,8 milhões de euros.

Os restantes manuscritos inéditos serão provavelmente editados pela Gallimard, que também poderá republicar o autor na sua célebre coleção La Pléiade.

Durante anos, Céline, que em 1951 foi contemplado com uma amnistia e autorizado a regressar a França após vários anos de exílio na Dinamarca, denunciou perante alguns amigos os roubos de que foi vítima, mas as infrutuosas buscas de investigadores e admiradores da sua obra converteram o furto numa lenda.

O escritor estava convencido -- como também consideram outros especialistas -- que terá sido o corso Oscar Rosembly, um membro da Resistência de origem judia, quem se dirigiu à casa de Céline após a Libertação e levou os manuscritos.

Apesar do seu envolvimento na Resistência, Rosembly foi julgado em setembro de 1944 por "atuações desonestas" (era acusado de ter participado em vários roubos) e esteve preso durante algum tempo antes de se instalar nos Estados Unidos.

Oscar Rosembly morreu em 1990 e a sua filha, Marie-Luce Rosembly, que esteve em contacto telefónico com outros especialistas que suspeitavam do ocorrido, faleceu em novembro passado.

Uma história rocambolesca e à altura do polémico e genial Céline e das suas opções políticas, quando também se destacou pelos seus panfletos antissemitas que continuou a defender após o seu regresso a França.

Céline (1894-1961) morreu aos 67 anos em Meudon, periferia de Paris, onde continuava a receber a visita de amigos célebres e escritores emergentes da geração "Beat".

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