Protestos de movimentos "inorgânicos" no Brasil vão ser mais frequentes
O politólogo brasileiro Paulo Baía considera que as grandes manifestações contra o, no último sábado, foram mobilizadas por movimentos "inorgânicos" que surpreenderam o Brasil, mas que deverão ocorrer com mais frequência no futuro.
© Lusa
Mundo Brasil
A forte adesão às manifestações, que tiveram lugar em mais de 100 cidades do Brasil, surpreendeu até mesmo algumas áreas da oposição e algumas organizações, que esperavam um número menor de pessoas nas ruas devido à pandemia de covid-19.
A presença inesperada de centenas de milhares de cidadãos nas ruas deu-se devido a movimentos inorgânicos, que se organizaram na internet contra Jair Bolsonaro, numa convocatória "muito mais por fora dos partidos e das organizações sindicais", explicou Paulo Baía.
"As organizações sindicais e alguns partidos ponderaram que não era o momento de fazer uma manifestação, por causa da pandemia. Então, esses grupos mais autónomos é que puxaram a manifestação, sobretudo movimentos de moradores periféricos e jovens", afirmou o cientista político, que é também sociólogo e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
"Fiquei muito impressionado com a grande presença de jovens, que ainda não estão vacinados, mas que foram muito ativos, principalmente em São Paulo, que acolheu a maior manifestação, mas também no Rio de Janeiro ou em Brasília. Acredito que, a partir de agora, outras manifestações vão acontecer, com maior densidade e com maior público, mas frisando que as de sábado já tiveram uma adesão razoável e surpreendente dentro do atual clima de pandemia", frisou.
Na visão do especialista, os protestos poderiam ter sido muito superiores, e com um impacto ainda maior, se tivesse ocorrido uma convocação dos sindicatos, de mais Organizações Não-Governamentais (ONG) e de outros setores da sociedade civil.
Contrariamente às manifestações pró-Bolsonaro que decorreram durante a atual pandemia, as organizações dos protestos de sábado pediram aos participantes para adotarem as medidas preventivas contra a covid-19 e distribuíram máscaras e gel desinfetante, recomendações que tiveram grande adesão, mas que não conseguiram evitar aglomerações.
O dilema entre o discurso pró-isolamento social, defendido por médicos e cientistas, e o incentivo a aglomerações, resultou em diferentes níveis de participação, com importantes organizações sindicais a não convocarem a população e os seus membros.
Apesar de a pandemia no Brasil caminhar para uma terceira vaga, Paulo Baía avaliou que o cansaço da população face ao Governo foi mais forte.
"O que eu avalio é que há um cansaço da população. A população está cansada, sufocada, em função dos impactos da pandemia, dos impactos no seu dia-a-dia, na falta de dinheiro, de emprego, de verem pessoas morrer", disse à Lusa o professor universitário.
Nesse sentido, deu-se um movimento alavancado em duas frentes: uma no sentido de pedir o afastamento de Jair Bolsonaro da Presidência brasileira, levado a cabo, sobretudo, pelos setores mais organizados da juventude; e outra dos que pedem "vacina para todos", que defendem um processo de imunização em massa para a população brasileira.
Segundo Paulo Baía, não foram só os movimentos inorgânicos e os jovens que surpreenderam nas manifestações do passado sábado, mas também a "quebra do monopólio" observado nos últimos anos no Brasil, onde a direita dominava os protestos no país.
"Outro dado importante que eu vejo na manifestação foi que se quebrou o monopólio que se estabeleceu a partir de 2016 até 2018, de manifestações de direita, e de 2019 até agora, de manifestações a favor de Bolsonaro. Esse monopólio foi quebrado e estabeleceu-se um contraponto, de uma manifestação contra Bolsonaro", salientou o especialista.
Nesse sentido, e ainda de acordo com o sociólogo, Bolsonaro enfrentará, a partir de agora, cada vez mais dificuldades até 2022, ano em que o Brasil voltará a ir às urnas para escolher o seu próximo Presidente da República.
Segundo o Instituto Datafolha, a popularidade de Bolsonaro caiu para 24%, o nível mais baixo da sua Presidência.
O Brasil, um dos países mais afetados pela pandemia em todo o mundo, totaliza 462.791 óbitos e 16.545.554 infeções pelo novo coronavírus.
A pandemia de covid-19 provocou, pelo menos, 3.543.125 mortos no mundo, resultantes de mais de 170,2 milhões de casos de infeção, segundo um balanço feito pela agência francesa AFP.
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