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Alemanha entrou na presidência da UE com um intruso chamado coronavírus

A Alemanha iniciou a presidência da União Europeia com "um projeto e um tema", mas deparou-se com "um intruso" chamado coronavírus que impôs uma agenda e comprometeu todos os planos importantes, defende Mónica Dias, especialista em relações internacionais.

Alemanha entrou na presidência da UE com um intruso chamado coronavírus
Notícias ao Minuto

09:30 - 16/10/20 por Lusa

Mundo Opinião

Coordenadora do programa de doutoramento do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa, Mónica Dias considera por isso "muito injusto" que se diga que a presidência alemã do Conselho da União Europeia (UE) "não fez A, B ou C", dado "o que já alcançou do ponto de vista económico e de manter a casa unida num momento tão difícil como é o nosso, entre Trump e Xi Jiping, e tantos conflitos no mundo e mais a pandemia".

"A Alemanha entrou nesta presidência com um plano, que já tinha sido desenvolvido há muito tempo, (...) e havia um projeto e um grande tema que deveria ser a sustentabilidade e políticas na área da energia. Obviamente esse plano não pôde ser seguido tal como imaginado, [...] primeiro por causa do desenvolvimento do 'Brexit' e por outro lado também da pandemia", explica Mónica Dias em entrevista telefónica à Lusa para um balanço de três meses e meio da presidência alemã.

A académica cita, a propósito, o embaixador alemão em Lisboa, Martin Ney, que numa conferência no início da presidência alemã, a 01 de julho, disse: "juntou-se à presidência alguém não convidado".

"Portanto, houve um intruso e esse intruso chama-se coronavírus. Achei engraçado porque de facto ninguém estava à espera disto e trocou as voltas completamente", refere.

Mónica Dias explica que as medidas para fazer face à pandemia "estão no centro da política" europeia e, ao mesmo tempo, "as populações estão muito mais preocupadas com estas questões do que com o projeto europeu", o que torna "um bocadinho ingrato" exercer a presidência, porque "todas as agendas e todos os planos importantes para que a união política avançasse" ficaram "comprometidos".

Aponta como exemplo "a questão da política externa comum", que "teria tido uma prioridade de estratégias sobretudo económicas para pensar como conviver com a China", o que "está a ser muito mais difícil", ou "conviver com os Estados Unidos, com este Presidente [Donald Trump] que está a ser um grande problema para a UE e também para a Alemanha", ou ainda com a Rússia.

Por outro lado, aponta, a população alemã vive "muitas tensões sociais" devido à resposta à pandemia, com "manifestações daqueles que acham que as liberdades individuais estão a ser excessivamente limitadas, que não se deve usar máscara, que devem ser autorizados ajuntamentos, e daqueles que acham que não se deve autorizar", num "debate que foi politizado".

E ainda o "problema político muito grande" que a Alemanha atravessa, com um centro político-partidário "muito grande" em que "as pessoas não se reveem", muitas das quais "não encontram soluções pelo menos nas franjas à esquerda e à direita".

Tudo isto, resume, faz com que "a política europeia não seja uma prioridade" na Alemanha numa altura em que tem a presidência, "um momento fundamental da sua política externa".

"A Alemanha estaria muito preocupada também e empenhada num maior aprofundamento político das instituições, mas acho que percebeu que neste momento tal não é possível [...] É percetível que, neste momento - vou utilizar um termo estranho - não vale a pena forçar a barra", sustenta a especialistas em relações Internacionais.

Por essa razão, a presidência alemã tem-se caracterizado pelo "low profile" (discrição), de "mais de gestão de crise, de tentativa de conciliação dos problemas do dia a dia", acrescenta, apontando que Merkel "não é uma política de grandes visões que possam levar para a frente o projeto europeu", mas "muito boa a resolver as questões pequenas, na negociação do dia a dia, a conseguir negociar e alcançar pequenas conciliações".

"E atenção, eu acho que é o grande mérito, talvez uma das qualidades mais extraordinárias de Angela Merkel e que tem de ser admirado no contexto político atual, em que parece que o político que mais grita é que é ouvido pela imprensa e é que tem destaque", frisa.

Mónica Dias recusa contudo que seja "uma presidência com poucos objetivos alcançados", salientando que "é uma presidência discreta e que, tendo em conta a circunstância complexa da pandemia, aposta em resoluções muito pragmáticas, em negociações pequenas, parcelares, em pequenos passos, mas que, com esses, pelo menos garante uma solidez e garante uma continuidade e eficácia".

"A resposta à pandemia nunca teria sido assim se a Alemanha não estivesse tão empenhada no projeto europeu", afirma.

"As conquistas econômicas, que também são muitas vezes esquecidas por causa da pandemia e acha-se que tem de estar tudo disponível e tudo funcionar, mas isso em termos burocráticos e em termos da vontade política de todos os Estados-membro, em termos de conseguir convencer todos, é absolutamente extraordinário".

A presidência do Conselho da União Europeia é exercida rotativamente pelos países europeus por períodos de seis meses, agrupada em "trios" de três Estados-membros que as exercem consecutivamente e elaboram um programa conjunto.

O atual trio iniciou-se a 01 de julho com a Alemanha, que exerce a presidência até 31 de dezembro, seguindo-se Portugal, entre 01 de janeiro e 30 de junho de 2021, e a Eslovénia, entre 01 de julho e 31 de dezembro de 2021.

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