Papa defende mudança de paradigma neoliberal e pede reforma da ONU
O papa Francisco defende na sua nova encíclica 'Fratelli Tutti' (Todos Irmãos), hoje publicada, a necessidade de, após a pandemia, mudar o paradigma do neoliberalismo, e pede a reforma da Organização das Nações Unidas (ONU).
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No documento, afirma a necessidade de superar o "dogma de fé neoliberal" no mercado, lembrando que "o mercado, por si só, não resolve tudo, embora às vezes nos queiram fazer crer neste dogma de fé neoliberal".
"Trata-se de um pensamento pobre, repetitivo, que propõe sempre as mesmas receitas perante qualquer desafio que surja", escreve, no texto divulgado pelo Vaticano e noticiado pela agência Ecclesia, acrescentando que a "fragilidade dos sistemas mundiais perante a pandemia evidenciou que nem tudo se resolve com a liberdade de mercado".
O papa condena a "especulação financeira", marcada por uma "ganância do lucro fácil", e defende a necessidade de uma reforma da ONU e da "arquitetura económica e financeira internacional".
"O direito de alguns à liberdade de empresa ou de mercado não pode estar acima dos direitos dos povos e da dignidade dos pobres nem acima do respeito pelo ambiente", considera.
Francisco espera que a atual pandemia tenha um desfecho diferente da crise financeira dos anos 2007 e 2008, em que considera ter-se perdido a oportunidade de promover uma "nova regulamentação da atividade financeira especulativa e da riqueza virtual".
Na encíclica, o papa aponta ainda o dedo ao falhanço do projeto de globalização, que por detrás da "ilusão global" de desenvolvimento esconde benefícios para o mercado de capitais, que aumentaram as desigualdades e injustiças sociais.
"O avanço deste globalismo favorece normalmente a identidade dos mais fortes que se protegem a si mesmos, mas procura dissolver as identidades das regiões mais frágeis e pobres, tornando-as mais vulneráveis e dependentes. Desta forma, a política torna-se cada vez mais frágil perante os poderes económicos transnacionais", escreve Francisco no texto, dedicado à "fraternidade e amizade social".
Apelando a uma defesa global e urgente dos "direitos humanos mais essenciais", o papa dá como exemplos a necessidade de erradicar a fome ou combater o tráfico de pessoas e "outras formas atuais de escravatura", que apresenta como "vergonha para a humanidade".
Para Francisco, o mundo "massificado" não resolve as questões da solidão, mas "privilegia os interesses individuais e debilita a dimensão comunitária da existência".
No documento, o papa propõe ainda a criação de um fundo mundial contra a fome, a ser financiado pelas atuais despesas militares.
Reiterando a sua oposição à pena de morte, Francisco considera também que nenhuma guerra é justificável, face ao poder destruidor das armas, e defende que, "com o dinheiro usado em armas e noutras despesas militares" se crie um fundo mundial, "para acabar de vez com a fome e para o desenvolvimento dos países mais pobres".
A nova encíclica papal, intitulada 'Fratelli Tutti', que se dedica à fraternidade e amizade social, foi hoje apresentada pelo papa Francisco no Vaticano, após a oração do Angelus.
'Fratelli tutti' é a terceira encíclica do pontificado do Papa Francisco, após 'Lumen Fidei' (A luz da fé), em 2013, e 'Laudato si', em 2015, sobre a ecologia integral.
No sábado, Francisco assinou junto ao túmulo de Francisco de Assis a nova encíclica, o 299.º documento do género na história da Igreja Católica.
O antecessor de Francisco, Bento XVI, publicou três encíclicas, no seu pontificado (2005-2013) e o anterior, João Paulo II assinou 14 encíclicas, entre 1979 e 2003.
Segundo a agência Ecclesia, a encíclica -- tradicionalmente assinada no Vaticano -- é o grau máximo das cartas que um Papa escreve e a expressão 'Fratelli Tutti' remete para os escritos de São Francisco de Assis, o religioso que inspirou o líder dos católicos na escolha da sua designação papal.
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