Argélia. Centenas de milhares de manifestantes em aniversário do 'Hirak'
Centenas de milhares de argelinos saíram hoje à rua, a 53.ª sexta-feira consecutiva de marchas semanais, para assinalar um ano da contestação popular que continua a exigir a mudança do "sistema".
© Reuters
Mundo Argélia
Em Argel, e nas principais cidades e localidades do país magrebino, centenas de milhares de pessoas responderam ao apelo das organizações próximas do 'Hirak', o movimento de contestação pacífico iniciado há um ano que levou, em abril, à demissão do Presidente Abdelaziz Bouteflika.
Ao longo da semana, multiplicaram-se os apelos nas redes sociais para uma forte mobilização por ocasião da 53.ª sexta-feira, sobretudo em Argel.
O Pacto para a Alternativa Democrática (PAD), que reagrupa partidos e associações na vanguarda do movimento, apelou que "os dias 21 e 22 de fevereiro se tornem num momento forte da mobilização popular para denunciar a agenda da regeneração do 'sistema' e lançar as bases de uma nova República".
Na quinta-feira, a polícia começou a instalar barreiras nos principais eixos rodoviários que se dirigem para a capital, com o objetivo de impedir o ingresso dos manifestantes de outras regiões circundantes.
Os manifestantes concentraram-se de forma pacífica na Grande Poste, no centro de Argel e o local emblemático deste protesto. "Não viemos celebrar, viemos para que saiam" e "Não vamos parar!", ecoaram. Mulheres e crianças juntaram-se ao desfile, e apesar da presença de um forte dispositivo policial não foi dada ordem para dispersar a multidão.
Há um ano, milhões de argelinos, homens e mulheres de todas as idades, saíram à rua para denunciar uma nova candidatura de Bouteflika e um sistema que vigora deste a independência em 1962, com forte predominância dos militares.
"Por um Estado civil e não militar" tem constituído uma das principais palavras de ordem dos protestos, revelando o desencanto face a um regime que permanece dominado pela Frente de Libertação Nacional (FLN), que conduziu sangrenta guerra de libertação contra o domínio colonial francês (1954-1962) e fomentou de início um sentimento de esperança na população, mas depressa degenerou.
Hoje, os milhões de argelinos, num país onde 54% dos 43 milhões de habitantes tem menos de 30 anos, contestam um "sistema" que tornou possível a longa presidência de Bouteflika, incapacitado desde 2013, e que com a instauração plena da economia de mercado permitiu uma transferência massiva de dinheiro público e de bens comuns -- incluindo as terras da revolução agrária e das cooperativas camponesas -- para interesses privados.
Após a demissão de Bouteflika, o alto comando militar assumiu abertamente o poder, rejeitou as reivindicações sobre a mudança de "sistema" antes de um escrutínio presidencial e acentuou a repressão e as detenções.
Em entrevista na noite de quinta-feira aos media nacionais, o Presidente Abdelmadjid Tebboune - um ex-membro do círculo de Bouteflika eleito em dezembro apesar de uma taxa de abstenção recorde -, prestou homenagem ao 'Hirak' que impediu o "colapso total" do país. E assegurou que vai aplicar "o conjunto das suas reivindicações'.
No entanto, e através do 'Manifesto 22-Fevereiro' também divulgado na quinta-feira, as organizações próximas do 'Hirak' apelaram a 'prosseguir a mobilização' e sublinharam que as suas palavras de ordem permanecem atuais. "Que saiam todos" exprime "uma vontade de rutura com as atuais instituições" e a recusa "que o processo fique confinado ao atual poder".
O manifesto também denuncia o prosseguimento das "medidas repressivas" contra jornalistas, militantes e manifestantes" e recorda que os argelinos "pretendem que o seu país seja governado e gerido na transparência".
Os cidadãos "pretendem pessoas responsáveis pelas suas ações, uma justiça independente e um parlamento legítimo que não seja uma câmara de inscrição", sublinhou o Manifesto.
A mobilização do dia de hoje era considerada um teste ao 'Hirak', confrontado com numerosos desafios face a um regime que recupera a iniciativa, apesar da grave crise económica também motivada pela queda do preço do crude.
As mobilizações pelo país foram superiores às registadas nas últimas semanas, mas segundo diversos analistas o 'Hirak', que permanece sem estrutura organizada ou dirigentes identificados, será forçado a repensar a sua estratégia para evitar o "risco de "esvaziamento".
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