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"Cooperação é cada vez mais geopolítica e economia e menos solidariedade"

O académico Luís Mah defendeu hoje, em Lisboa, que a cooperação para o desenvolvimento está a tornar-se cada vez mais num instrumento de política externa e geoeconomia e muito menos de solidariedade e de luta pela justiça social.

"Cooperação é cada vez mais geopolítica e economia e menos solidariedade"
Notícias ao Minuto

16:16 - 20/11/19 por Lusa

Mundo Investigador

"A cooperação internacional para o desenvolvimento está a tornar-se cada vez mais num instrumento de geopolítica e geoeconomia, de política externa, e muito menos de solidariedade internacional ou de luta pela justiça social", disse Luís Mah.

O docente do Programa em Estudos de Desenvolvimento na Lisbon School of Economics and Management do Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG) falava, em Lisboa, durante a apresentação do relatório que monitoriza a ajuda pública ao desenvolvimento portuguesa.

"Não é que já não estivesse no passado, mas agora está a ser feito de uma forma mais descarada", acrescentou o também investigador no Centro de Estudos sobre África, Ásia e América Latina do ISEG.

Para Luís Mah, esta "tendência emergente" está a ser "encorajada pelo sucesso da cooperação Sul-Sul", onde a "China está a mudar as regras do jogo".

Numa intervenção sobre as tendências atuais da cooperação internacional, Luís Mah sublinhou o envolvimento crescente do setor privado na ajuda pública ao desenvolvimento (APD), nomeadamente através do financiamento misto (blended finance), que a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) define como o "uso estratégico" da ajuda ao desenvolvimento para atrair e mobilizar recursos privados.

"Estes novos doadores trazem uma maneira diferente de fazer ajuda. Juntam dinheiro dos bancos de desenvolvimento e do setor privado em vez da ajuda pública, apostam no crescimento económico em vez da redução da pobreza, em infraestruturas e menos nos setores sociais. É um modelo que já vem do Japão, enquanto potencia emergente no sudoeste asiático, mas que a China está a imitar", disse.

De acordo com o investigador, esta mudança está também já no discurso da União Europeia e é perceptível nas orientações da nova Comissão Europeia, que definem que a cooperação deve "ser estratégica, efetiva, criar valor para o dinheiro e contribuir para os objetivos políticos" da Europa, criando "uma parceria entre iguais e de interesse mútuo".

É neste contexto, prosseguiu Luís Mah, que surge a discussão em torno da criação do novo banco europeu de desenvolvimento sustentável para juntar todos os instrumentos financeiros.

O académico apontou ainda a discussão que decorre no âmbito do Comité de Ajuda ao Desenvolvimento (CAD) da OCDE relativa à modernização da forma de avaliar a ajuda pública de forma a incluir os instrumentos do setor privado.

"O 'blended finance' tornou-se nos últimos anos no grande instrumento financeiro para o desenvolvimento...]. É um mecanismo financeiro quase hegemónico nos dias de hoje porque é visto como o instrumento que poderá ajudar a preencher o 'gap' [lacuna] de 2,5 mil milhões de dólares que existe para o cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável" em 2030, disse.

Luís Mah assinalou que a perceção de que a agenda da eficácia da ajuda falhou reforçou a narrativa de validação e legitimação do setor privado no desenvolvimento, que está na agenda dos países doadores desde a década de 90.

"O que parece ser novo agora é o uso da APD para apoiar esse setor privado, o que levanta fortes receios de todos os atores, nomeadamente da sociedade civil e da academia, porque sabemos como o investimento do setor privado pode ter fortes e negativos impactos em termos sociais e ambientais na sua busca pelo lucro", disse.

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