Diplomacia dos EUA degradada e Departamento de Estado esvaziado
A ex-embaixadora dos EUA na Ucrânia lançou hoje um alerta sobre a degradação da diplomacia norte-americana e o esvaziamento do Departamento de Estado pelo atual governo de Donald Trump, durante um depoimento no Congresso.
© iStock
Mundo Marie Yovanovitch
O testemunho de Marie Yovanovitch foi prestado no âmbito do processo de destituição de Trump, com a diplomata a contar como se tornou uma das primeiras vítimas do processo que conduziu à atual investigação parlamentar com vista à destituição do presidente norte-americano.
Em tom desafiador e glacial, Marie Yovanovitch afirmou aos congressistas que o fracasso do secretário de Estado, Mike Pompeo, e outros dirigentes seniores em a defender e a outros diplomatas de carreira dos ataques políticos de Trump e dos seus apoiantes contribui para uma desmoralização severa no Departamento de Estado.
"Continuo desapontada por a liderança do Departamento e outros terem recusado admitir que os ataques contra mim e outros são perigosamente errados", disse Yovanovitch.
"Isto vai muito para além de mim ou de alguns indivíduos. À medida que os profissionais da diplomacia são denegridos e destruídos, também a instituição é degradada", especificou.
O seu testemunho, no qual fez a defesa do papel dos diplomatas norte-americanos, colocou um rosto público à profunda insatisfação que se vive no Departamento na era Trump.
O governo do multimilionário tem cortado o orçamento do Departamento, deixado muitos postos importantes por preencher durante extensos períodos temporais e desprezado com frequência o trabalho dos diplomatas.
O caso com a Ucrânia apenas se acrescentou aos problemas já existentes, afirmou.
"Os ataques estão a provocar uma crise no Departamento de Estado, com o processo político claramente emaranhado, os cargos de liderança por preencher e agentes seniores e de estatuto médio a confrontarem-se com um futuro incerto e a dirigirem-se para a saída", descreveu Yovanovitch.
"O impacto da crise deixou se ser sobre os indivíduos e passou a ser sobre a instituição. O Departamento de Estado está a ser esvaziado a partir de dentro quando a conjuntura internacional é competitiva e complexa", acentuou.
Trump tem minimizado os relatos de Yovanovitch e outros diplomatas e membros seniores do seu governo, que exprimiram preocupação com os seus esforços aparentes para forçar o executivo ucraniano a promover investigações que o ajudem no seu objetivo de reeleição, sob a ameaça de cortar a Kiev a ajuda militar norte-americana.
Já o silêncio de Pompeo é considerado por alguns como tendo prejudicado o Departamento que chefia e a credibilidade da diplomacia norte-americana.
"Temos um secretário de Estado que dirige esta desordem, que a permitiu e que se recusa a defender as pessoas que se fartaram e denunciaram a situação", declarou Aaron David Miller, um agente do serviço externo retirado, que trabalhou com sete secretários de Estado e agora colabora com a Fundação Carnegie para a Paz Internacional (Carnegie Endowment for International Peace)
"Ele está ainda mais descredibilizado aos olhos do seu próprio Departamento, aos olhos de Washington e nas capitais estrangeiras", reforçou.
Yovanovitch, uma imigrante com uma carreira de 33 anos na ação externa, testemunhou que se sentiu intimidada e ficou admirada quando foi mandada regressar de forma abrupta de Kiev, para Washington, apesar de lhe ter sido dito que não tinha feito nada errado e tinha uma folha de serviço exemplar.
Trump criticou Yovanovitch no passado, chegando a dizer ao presidente ucraniano, em telefonema feito em 25 de julho, que ela era uma "má notícia".
Os Democratas alegam que a sua demissão fazia parte de um esquema de Trump para abrir um canal diplomático alternativo com a Ucrânia, gerido pelo seu advogado pessoal, Rudy Giuliani, para promover os seus interesses pessoais.
Hoje, quando Yovanovitch estava a ser ouvida no Congresso, Trump fez-lhe um ataque cerrado na rede social Twitter, responsabilizando-a por crises em países onde ela esteve colocada.
"Onde quer que Marie Yovanovitch esteve, as coisas correram mal", disse Trump. "Ela esteve na Somália. Como é que correu? Acelerando para a Ucrânia, o novo presidente disse-me mal dela no meu segundo telefonema com ele", exemplificou.
A tentativa de Trump perturbar o depoimento de Yovanovitch ocorreu quando esta elogiava os seus colegas, muitos dos quais operam em situações extremas e perigosas. Recordou a crise dos reféns no Irão, as injúrias ainda não explicadas a diplomatas norte-americanos em Cuba e as mortes do embaixador dos EUA na Líbia, juntamente com outros três norte-americanos, no ataque ocorrido em Bengasi, em 2012, que suscitou então ultraje entre os republicanos.
A referência a Bengasi foi notável, porque congressistas republicanos, entre os quais estava na altura Pompeo, conduziram várias investigações ao ataque, nas quais acusaram o governo de Barack Obama (antecessor de Donald Trump), em particular a secretária de Estado Hillary Clinton, de negligência e tentativa de encobrimento das circunstâncias do caso.
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