Antigos chefes de milícias da RCA acusados de "campanha de terror"
Dois antigos chefes de milícias armadas na República Centro-Africana (RCA) foram hoje acusados pela procuradoria do Tribunal Penal Internacional (TPI) de incentivarem uma "campanha de violência e de terror" contra civis no país.
© Reuters
Mundo RCA
O antigo presidente da Federação Centro-africana de Futebol, Patrice-Edouard Ngaïssona, e o deputado Alfred Yekatom são acusados de envolvimento em crimes de guerra e crimes contra a humanidade, incluindo homicídio, perseguição, tortura e recurso a crianças-soldado enquanto eram líderes de milícias anti-Balaka.
Ao painel de três juízes, em Haia, Holanda, o procurador Kweku Vanderpuye afirmou que os crimes aconteceram após "atrocidades" por forças muçulmanas conhecidas por Séléka, cujos movimentos obrigaram, em 2013, o então Presidente, François Bozizé, a abandonar o país.
A RCA caiu no caos e na violência em 2013, com milhares de mortos e centenas de milhares de deslocados, após o derrube do ex-Presidente François Bozizé por grupos armados juntos na Séléka, o que suscitou a oposição de outras milícias, agrupadas na designação anti-Balaka.
Mesquitas, lojas e habitações foram saqueadas e destruídas, sendo que hoje, seis anos depois do início dos conflitos, continuam a registar-se episódios de violência.
O procurador alegou que Ngaïssona influenciou grupos anti-Balaka e que Yekatom atuou como líder militar - chegando a apelidar-se de "coronel Rambo" - e que comandou milhares de militantes alocados de grupos locais de autodefesa.
"No exilo, o sr. Ngaïssona e outros membros próximos de Bozizé usaram estes grupos", referiu Vanderpuye, acrescentando que estes "exploraram a vingança e ódio sentidos pelas pessoas para criarem uma força de luta formidável que poderia derrotar os Séléka, abrindo caminho para que recuperassem o poder".
Todavia, o procurador considera que os anti-Balaka não se limitaram a combater os Séléka e procuraram "aterrorizar incessantemente" cidadãos civis.
Vanderpuye assinalou também o recurso a crianças-soldado, que diz terem sido utilizadas para cometer crimes violentos, contando a história de um antigo jovem a quem foi ordenado que esfaqueasse ou cortasse as orelhas de prisioneiros muçulmanos.
O presidente da Federação Centro-africana de Futebol foi detido em 2018, em Paris, após a emissão de um mandado de detenção pelo TPI, e enfrenta 111 acusações, ao passo que Yekatom, que se apresentou ao tribunal no ano passado, enfrenta 21 acusações.
A advogada do deputado, Mylene Dimitri, argumentou que o seu cliente não consegue defender-se porque os procuradores estão a conservar provas que recolheram durante investigações a crimes cometidos pelos Séléka.
Yekatom "está a defender-se no escuro", disse Dimitri aos juízes.
Atualmente, o Governo centro-africano controla cerca de um quinto do território, enquanto o resto é dividido por mais de 15 milícias que procuram obter dinheiro através de raptos, extorsão, bloqueio de vias de comunicação, recursos minerais (diamantes e ouro, entre outros), roubo de gado e abate de elefantes para venda de marfim.
Um acordo de paz foi assinado em Cartum, capital do Sudão, no início de fevereiro pelo Governo e por 14 grupos armados, mas um mês depois as partes entenderam-se sobre um governo inclusivo, no âmbito do processo de paz.
Portugal está presente na RCA desde o início de 2017, no quadro da missão das Nações Unidas (MINUSCA), cujo 2.º comandante é o major-general Marcos Serronha, onde está a 6.ª Força Nacional Destacada (FND), e militares na Missão Europeia de Treino Militar-República Centro-Africana, cujo 2.º comandante é o coronel Hilário Peixeiro.
A 6.ª FND, que tem a função de Força de Reação Rápida, integra 180 militares, na sua maioria paraquedistas, pertencendo 177 ao Exército e três à Força Aérea.
Na RCA estão também 14 elementos da Polícia de Segurança Pública.
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