"O que há de pior em nós, momentaneamente, triunfou. [...] Essa melhora súbita da extrema-direita no Mundo é uma melhora que até pode demorar, mas não vai triunfar porque nós não vamos voltar atrás. A gente não vai voltar atrás nas conquistas civilizatórias que são essenciais à nossa existência", afirmou o ex-deputado.

Jean Wyllys está esta semana em Paris e hoje falou na conferência "Os impactos dos discursos de ódio e das fake news: o caso do Brasil", que aconteceu na Ecole des Hautes Etudes en Sciences Sociales e foi organizada pelo Grupo de Reflexão sobre o Brasil Contemporâneo, em cooperação com outros grupos de investigadores brasileiros em França.

Este grupo, instalado na capital francesa desde os tempos da ditadura militar no Brasil como fórum de discussão e debate dos dissidentes, tem regressado, nos últimos anos, à sua génese devido à situação política no país.

"Entre os anos da democracia, o grupo de reflexão era basicamente um grupo de encontro de pesquisadores e de trabalho sobre o Brasil, um espaço de discussão académico. Nestes últimos anos, a presença do discurso político começou a ter muita importância devido à situação no país. A gente volta, de uma certa medida, à origem do grupo", explicou Glauber Sezerino, um dos membros do Grupo de Reflexão sobre o Brasil Contemporâneo.

Jean Wyllys prepara-se agora para começar um doutoramente em Berlim sobre as fake news e o seu impacto e disse à plateia que encheu o auditório da Ecole des Hautes Etudes en Sciences Sociales, na Boulevard Raspail, que as fake news não são "inócuas".

"[As fake news] Não é uma brincadeira, uma coisa inócua. Pode parecer para quem compartilha, mas não para quem é alvo. E, por isso, eu vi a minha vida desmoronar, eu vi o meu trabalho de deputado honesto, o mandato que eu construí com muito esforço de democracia transparente, eu vi o prestígio internacional que o meu mandato adquiriu, desmoronando perante as fake news", indicou o antigo deputado.

Wyllys foi especialmente aplaudido pela plateia quando recordou a noite da destituição de Dilma Roussef quando cuspiu na cara de Jaír Bolsonaro, agora Presidente do Brasil. "Eu sei objetivamente porque cuspi na cara dele: foram anos de assédio moral por parte dele em lugares onde isso não devia acontecer [...] Mas teve outra dimensão, inconsciente, que tem a ver com o meu lado místico, eu vislumbrei o futuro. Eu não cuspi na cara do deputado federal, eu cuspi na cara do futuro Presidente", afirmou o ex-deputado.

Para o antigo deputado, Bolsonaro "vocalizou [durante a campanha] aquilo que as pessoas tinham vergonha de dizer" durante os anos em que os governos do Partido Trabalhista estiveram no poder e que, para Jean Wyllys, representou uma época em que os "melhores valores" do Brasil estavam em hegemonia.

Ainda segundo o antigo deputado, sem tempo de antena e sem comparecer a debates, Bolsonaro ganhou as eleições "graças à operação das fake news", enumerando algumas das notícias falsas que circularam sobre si como a apresentação de uma proposta para a alteração da Bíblia.

"A fake news opera nesse nível da meia verdade, nesse nível da mentira que poderia ser e à medida que vai conseguindo destruir uma reputação ou criar uma imagem falsa da pessoa, mais ela vai avançando", explicou o antigo deputado que tem a vida ameaçada no Brasil.

Jean Willys está a passar esta semana em França, tendo já dado várias entrevistas aos principais meios de comunicação e sendo recebido no Senado e na Câmara Municipal de Paris, acompanhado nesta visita pela Amnistia Internacional.