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Solidariedade "hoje está em falta" na União Europeia

O diretor-geral da Organização Internacional das Migrações lamenta, em entrevista à Lusa, que o princípio da solidariedade esteja atualmente em falta na União Europeia e como isso tem dificultado a construção de uma política migratória e de asilo comunitária.

Solidariedade "hoje está em falta" na União Europeia
Notícias ao Minuto

07:15 - 07/01/19 por Lusa

Mundo António Vitorino

"Acho que uma questão fundamental para termos uma política comunitária é o princípio da solidariedade. E manifestamente em alguns momentos, tanto no que diz respeito às migrações, como no que diz respeito ao asilo, acho que aquilo que mais falta fez foi essa vontade de solidariedade", afirma António Vitorino.

O diretor-geral da Organização Internacional das Migrações (OIM) recorda que a União Europeia (UE) já conseguiu ter esse princípio de solidariedade, como foi o caso na década de 1990, quando os países do bloco comunitário acolheram cerca de 700 mil migrantes refugiados oriundos dos Balcãs Ocidentais, fruto do conflito na antiga Jugoslávia.

"Aí houve um princípio de solidariedade, houve uma distribuição dos que chegavam para beneficiarem de proteção temporária entre os vários Estados-membros da UE. Ora isso não se verificou em 2015 [pico da crise migratória]. E é, portanto, preciso perguntarmo-nos porque é que essa solidariedade hoje está em falta e sem ela é difícil construir uma política comum, seja de asilo seja de imigração", refere António Vitorino, que é ex-eurodeputado e ex-comissário europeu.

Na opinião do diretor-geral da OIM, a falta de solidariedade sentida hoje no seio da Europa acontece por vários fatores, nomeadamente porque as sociedades mudaram muito entre os meados dos anos 90 e os meados da atual década (2015).

"Houve muitas transformações que não têm a ver com as migrações. São transformações que têm a ver com a insegurança e a incerteza sobre o futuro das classes médias e os seus níveis de rendimentos. Têm a ver com a insegurança de ordem pública com os atentados terroristas. Têm a ver com a perceção de que as inovações tecnológicas atingiram tal ritmo que muito daquilo que nós considerávamos consolidado, adquirido e garantido nas sociedades em que vivemos está posto em causa", afirma.

"Isso gera um mal-estar social em que as migrações aparecem como o bode expiatório fácil porque aquele que vem é diferente nós, é estrangeiro, vem de fora e é fácil reportar a eles aquilo que são no fundo ansiedades de nós próprios", prossegue.

Ainda em relação ao ano de 2015, altura em que a Europa recebeu mais de um milhão de migrantes e refugiados (o número mais alto no continente desde os anos 90), a maioria a fugir do conflito na Síria, António Vitorino lembra que na altura a comunidade internacional não percebeu os alertas lançados pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados, agência então liderada pelo atual secretário-geral da ONU, António Guterres.

"A maioria das pessoas que fugiram do conflito sírio foram acolhidas nos países limítrofes. No Líbano cerca de um milhão e meio, na Jordânia também cerca de um milhão e meio a dois milhões, e na Turquia três milhões. As condições nesses campos eram muito difíceis", recorda.

"Lembro-me perfeitamente que o então alto comissário das Nações Unidas para os refugiados, o engenheiro António Guterres, alertou de que se não houvesse um reforço do financiamento das condições de sustentação desses campos de refugiados não haveria condições de manter, por exemplo, o nível de alimentação que era necessário para garantir a subsistência destas pessoas. E de facto, a comunidade internacional nessa altura pareceu não perceber esta mensagem", afirma.

Segundo António Vitorino, a deslocação em massa de pessoas que estavam nestes campos de refugiados e que "procuraram encontrar na Europa um acolhimento mais favorável" acabaria por desencadear muitos outros movimentos oriundos de outras proveniências, como Afeganistão, Iraque ou países da Ásia central ou da África subsaariana, "que não tinham rigorosamente nada a ver com o conflito na Síria, tanto que as estatísticas mostram que apenas 30% do um milhão de pessoas que chegaram à Europa nesse ano eram oriundas do conflito da Síria".

Regressando ao momento atual, António Vitorino fala ainda sobre uma das imagens que marcaram o ano de 2018: o resgate de centenas de migrantes por navios de organizações humanitárias no Mediterrâneo que depois aguardam vários dias, em alto mar, pela luz verde de um país europeu para aportar num porto seguro.

"Há regras de direito internacional marítimo aplicáveis e nem sempre têm sido observadas. Obviamente que alguns países estão geograficamente mais expostos que outros. E nesse sentido o que é fundamental é garantir que a vida das pessoas está salvaguardada. E para isso é necessário que as instâncias nacionais e europeias tenham uma estratégia conjunta de abordagem das operações de busca e salvamento no mar", diz Vitorino.

"Mas, mais uma vez, a resposta só pode ser uma. A solução tem de ser integrada, tem de ser partilhada e tem de se basear na solidariedade", reforça.

Sobre a atuação da OIM nestes casos, António Vitorino indica que a organização está envolvida, designadamente naquilo que chama como "o dia seguinte" após o resgate, fornecendo apoio e assistência humanitária às pessoas que são resgatadas "e, muitas vezes, no retorno dessas pessoas aos respetivos países de origem".

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