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Muro de Trump transforma sonho americano em sonho canadiano

As palavras de repúdio de Donald Trump contra as caravanas de migrantes centro-americanos e o muro que a todos tenta repelir leva muitos a sonharem com o Canadá e até mesmo a começarem uma vida no México.

Muro de Trump transforma sonho americano em sonho canadiano
Notícias ao Minuto

11:10 - 27/12/18 por Lusa

Mundo Migrações

Keila Castro, de 30 anos, percorreu os 4.400 quilómetros que separam a hondurenha Porto Cortés da mexicana Tijuana com um único objetivo: entrar nos Estados Unidos.

Veio na primeira caravana que partiu de São Pedro Sula em 13 de outubro, mas a força coletiva e o sonho chocaram com um muro e a fé mudou de direção.

"Agora estou a pôr mais fé no Canadá. Viemos todos com o fim de chegar aos Estados Unidos, mas estamos a ver como são as coisas e hoje temos mais amor pelo Canadá. É mais fácil e seremos bem-vindos", explica Keila à Lusa à entrada da sua barraca no acampamento El Barretal, onde os migrantes centro-americanos traçam hipóteses de futuro, depois de terem deixado tudo para trás.

Keila conta que as palavras de repúdio de Donald Trump levaram muitos a repensarem se querem mesmo estar num país que os vê como "invasores".

"Acho que estar nos Estados Unidos seria como estar nas Honduras outra vez: não poderemos ser livres. Seríamos ilegais ou estaríamos contra a vontade de Donald Trump. Eu sentir-me-ia como uma usurpadora", lamenta.

Keila viaja com o atual marido e com um filho de seis anos. Deixou nas Honduras uma filha de 13 anos do primeiro casamento e um filho de 11 do atual. Fugiu do ex-marido, membro das "maras", como são conhecidos os gangues que aterrorizam o país.

Até chegar aqui, mais de um mês depois da partida, foram boleias, autocarros e jornadas diárias de 14 quilómetros a pé.

"Ontem à noite tive uma imensa vontade de regressar e não consegui dormir", desabafa, segurando o pranto.

"Conversei com os meus filhos. O menino foi mordido por um cachorro. A medicina nas Honduras ou não serve ou não existe. A perna do meu filho está em processo de gangrena, devido a essa mordida", chora.

Católica, Keila frequenta uma igreja nos domingos aonde vão muitos dos refugiados.

A esperança no Canadá nasceu justamente a partir de membros de igrejas canadianas e de advogados que vieram de lá para conversar com os migrantes.

"Explicaram que o Canadá está de braços abertos aos casais, que estão 'pobres' de crianças e que entraríamos como se entrássemos na nossa própria casa. Muitas mães ficaram entusiasmadas. Temos agora essa esperança", revela Keila.

A também hondurenha Gelen Padilla, de 28 anos, é outra dessas mães do acampamento que prefere agora o Canadá como destino.

"Para ir para os Estados Unidos tudo está complicado. Rejeitam-nos totalmente. Vemos também muito racismo. Sobre o Canadá, contam-nos que as portas estão abertas e vejo nas notícias que oferecem boas oportunidades", compara Gelen.

Para muitas mães, tentar passar pelo muro para pedir asilo nos Estados Unidos pode ser uma experiência traumatizante, especialmente para as crianças.

Mães e filhos podem ficar presos enquanto durar o longo processo de asilo e correm até o risco de serem separados.

Enquanto o Canadá é apenas uma promessa, o México pode ser uma realidade, mesmo que transitória.

Anualmente, a oferta de empregos em Tijuana é maior do que a procura.

É preciso trazer mão-de-obra do Sul do México, uma região socioeconómica semelhante a Guatemala, Honduras e El Salvador, países de origem das caravanas.

"Já temos centenas de migrantes aqui do acampamento que estão integrados na cidade. Saem às cinco da manhã e retornam às 21h00. Carpinteiros, mecânicos, canalizadores. Essas pessoas ajudaram a resolver problemas aqui no acampamento e conseguiram trabalho, rapidamente", conta à Lusa Mario Medina, coordenador operacional do acampamento El Barretal.

Segundo o Instituto Nacional de Migração do México, cerca de 400 migrantes centro-americanos no acampamento El Barretal já conseguiram trabalho e cerca de 1.200 pessoas regularizaram a sua situação migratória, estando agora aptas para trabalhar legalmente.

As agências de recrutamento fazem ações regulares para recrutar migrantes. Em associação com o Serviço Nacional do Emprego, foram criadas "feiras de empregos". Centenas de migrantes preencheram formulários com as suas competências à espera de serem chamados.

"A minha meta não é Tijuana, mas, enquanto aguardo outras oportunidades, vou tentar trabalhar para me manter e para trazer os meus filhos", conta Keila, exibindo à Lusa o seu pedido de visto humanitário.

Também Gelen admite que o México se possa tornar um inesperado porto seguro.

"Se o governo do México nos der uma oportunidade boa e eu puder trabalhar, vale a pena tentar também", considera Gelen, que partiu de Porto Cortés na segunda caravana em 21 de outubro, fugindo da sentença de uma vida estagnada economicamente e da sentença de morte que ameaçava o filho.

"As maras queriam recrutar o meu filho para que ele vendesse drogas na escola. Fiquei com medo e soube que tínhamos de ir embora", descreve Gelen, que trouxe o filho ameaçado, de 13 anos, mas deixou um pequeno de sete com o marido, que migrará assim que Gelen conseguir instalar-se.

"Se tudo der certo, o nosso reencontro será em breve, aqui ou no Canadá", anseia.

Dos 10 mil migrantes que entraram no México desde 19 de outubro nas caravanas, cerca de 3.700 migrantes solicitaram refúgio temporário e outros 2.500 pediram asilo, segundo a Comissão Mexicana de Ajuda a Refugiados (COMAR).

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