Dez perguntas e respostas sobre o Pacto Global para a Migração
O Pacto Global para a Migração é apresentado como o primeiro acordo negociado a nível intergovernamental, e preparado sob os auspícios das Nações Unidas, para abranger todas as dimensões da migração internacional, de forma integral e abrangente.
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Mundo ONU
O esboço do texto final do pacto, finalizado após 18 meses de consultas e negociações, traça 23 objetivos para melhorar a gestão das migrações em todos os seus níveis: local, nacional, regional e global.
Atualmente, existem cerca de 258 milhões de migrantes em todo o mundo.
As Nações Unidas (ONU) estimam que este número aumente por causa de diversas razões. Crescimento da população mundial, comércio, crescentes desigualdades sociais, desequilíbrios demográficos e as alterações climáticas são algumas das razões apontadas pela organização liderada pelo secretário-geral e ex-primeiro-ministro português António Guterres.
O que é o Pacto Global para a Migração?
O Pacto Global para uma Migração Segura, Ordenada e Regular (GCM, na sigla em inglês) pretende ser o primeiro quadro cooperativo internacional, não juridicamente vinculativo, sobre as migrações (movimento populacional que compreende qualquer deslocação de pessoas, independentemente da extensão, da composição ou das causas, inclui a migração de refugiados, pessoas deslocadas, pessoas desenraizadas e migrantes económicos). É o resultado de um processo abrangente de consultas e de negociações entre os Estados-membros das Nações Unidas que começou com a assinatura da "Declaração de Nova Iorque para Refugiados e Migrantes" em 2016, texto que foi na altura adotado, por unanimidade, na Assembleia-geral da ONU.
O que pretende alcançar o Pacto Global para a Migração?
A migração é uma realidade global, que nenhum país consegue gerir sozinho, segundo a ONU. Por isso, defende a organização internacional, o tema exige soluções globais e um sentido de responsabilidade partilhado, que devem ter como base a cooperação internacional. O pacto global pretende fomentar essa cooperação internacional, ao estabelecer um conjunto de princípios orientadores e um quadro político multilateral. O documento tem a ambição de tratar a natureza complexa da migração internacional, abordando um vasto conjunto de aspetos que estão relacionados com a temática, tais como a gestão de fronteiras, contrabando de migrantes e tráfico de pessoas, documentação ou o regresso e a readmissão de migrantes. A diáspora e as remessas dos migrantes também são abordados.
Dez princípios, como a universalidade dos direitos humanos ou a soberania nacional, orientam a aplicação do documento. O texto traça 23 objetivos concretos para uma migração segura, ordenada e regular que podem servir como pontos de referência para os Estados quando estes aplicarem as respetivas políticas migratórias nacionais.
Quais são os 23 objetivos e compromissos definidos no documento?
a) Recolher e utilizar dados exatos e pormenorizados para formular políticas que tenham uma base empírica;
b) Minimizar os fatores adversos e estruturais que forçam as pessoas a deixarem os respetivos países de origem;
c) Fornecer informação precisa e oportuna em todas as etapas da migração;
d) Garantir que todos os migrantes tenham provas da sua identidade legal e documentação adequada;
e) Aumentar a disponibilidade e a flexibilidade das rotas regulares de migração;
f) Facilitar a contratação equitativa e ética de migrantes e salvaguardar as condições que garantam um trabalho decente;
g) Abordar e reduzir as vulnerabilidades na migração;
h) Salvar vidas e apostar em iniciativas internacionais coordenadas no âmbito dos migrantes desaparecidos;
i) Reforçar a resposta transnacional ao tráfico ilícito de migrantes;
j) Prevenir, combater e erradicar o tráfico de pessoas no contexto da migração internacional;
k) Gerir as fronteiras de forma integrada, segura e coordenada;
l) Aumentar a exatidão e a previsibilidade dos procedimentos de migração para uma adequada verificação de antecedentes, avaliação e encaminhamento;
m) Utilizar a detenção de migrantes apenas como o último recurso e procurar outras formas alternativas;
n) Melhorar a proteção, assistência e cooperação consular ao longo de todo o ciclo de migração;
o) Proporcionar aos migrantes o acesso a serviços básicos;
p) Capacitar os migrantes e as sociedades para alcançar uma plena inclusão e coesão social;
q) Eliminar todas as formas de discriminação e promover um discurso público com o objetivo de modificar ideias preconcebidas em relação à migração;
r) Investir no desenvolvimento de aptidões e facilitar o reconhecimento mútuo de aptidões, qualificações e competências;
s) Criar as condições necessárias para que os migrantes e as diásporas possam contribuir plenamente no desenvolvimento sustentável em todos os países;
t) Promover transferências de remessas mais rápidas, seguras e baratas, bem como fomentar a inclusão financeira dos migrantes;
u) Colaborar para facilitar o regresso e a readmissão dos migrantes em condições de segurança e dignidade, bem como uma reintegração sustentável;
v) Estabelecer mecanismos para a portabilidade da segurança social e dos benefícios adquiridos;
w) Fortalecer a cooperação internacional e as alianças mundiais para uma migração segura, ordenada e regular.
Como o pacto global afetará a migração irregular?
O objetivo central do pacto global é que a migração ocorra de forma segura, ordenada e regular. Nesse sentido, o documento promovido pela ONU inclui ações concretas que tencionam ajudar os Estados a reduzir a migração irregular (movimento que ocorre fora do âmbito das normas reguladoras dos países de envio, de trânsito e de acolhimento). Entre essas ações está a gestão das fronteiras de maneira integrada, segura e coordenada, a colaboração entre Estados para facilitar o regresso e a readmissão em condições de segurança e de dignidade e o fortalecimento da resposta transnacional ao tráfico ilícito de migrantes.
O documento, como um quadro político cooperativo internacional, também apoiará o trabalho já desenvolvido neste campo entre organizações internacionais e países terceiros, como é o caso da União Europeia (UE), Organização Internacional para as Migrações (OIM) e o Alto Comissariado da ONU para os Refugiados (ACNUR).
Como o pacto global vai ser adotado ou assinado?
O texto do pacto global será adotado numa conferência intergovernamental em Marraquexe, Marrocos, que está agendada para os próximos dias 10 e 11 de dezembro. Não vai existir uma assinatura formal. A adoção do documento ocorrerá por meio de consenso ou de uma votação, sendo necessária uma maioria de pelo menos dois terços. No passo seguinte do processo, a Assembleia-geral da ONU será convidada a endossar formalmente o Pacto Global para a Migração na forma de uma resolução.
O pacto global estabelece obrigações legais para os Estados?
O Pacto Global para a Migração não é juridicamente vinculativo, podendo ser interpretado como uma declaração de intenções. Nenhuma obrigação legal sobrepõe as leis nacionais ou internacionais dos Estados participantes. O documento parte do pressuposto que existe uma vontade política internacional para melhorar a gestão da migração.
O Pacto Global para a Migração terá alguma implicação sobre os direitos de soberania dos Estados?
Não. O acordo baseia-se no princípio de total respeito da soberania nacional, conforme é referido no texto a ser adotado: "O pacto global reafirma o direito soberano dos Estados de determinar a sua política migratória nacional e a sua prerrogativa de gerir a migração dentro da sua jurisdição, em conformidade com o direito internacional".
O documento não implica qualquer transferência ou restrição de direitos soberanos ou competências. Não é classificado como um tratado internacional e, dessa forma, não terá nenhum efeito legal sobre os sistemas jurídicos nacionais, nem irá implicar obrigações.
O Pacto Global para a Migração estabelece o "direito humano de migrar"?
Não. O documento visa melhorar a cooperação para a migração internacional. Não encoraja a migração, nem desencoraja a migração, segundo frisa a ONU. O pacto global não vai criar novas categorias legais, mas pretende enfatizar que os migrantes têm o direito de serem abrangidos pelos direitos humanos universais e pelas liberdades fundamentais, como qualquer outro ser humano. O texto a ser adotado não contém linguagem que promova um "direito humano de migrar".
O Pacto Global para a Migração vai implicar custos?
Não. Devido ao caráter não vinculativo, o pacto não vai criar obrigações financeiras diretas. A aplicação do pacto será apoiada por um programa de capacitação nas Nações Unidas. Os Estados-membros da ONU podem contribuir, de forma voluntária, para a organização e para as respetivas agências.
Como será feito o acompanhamento do Pacto Global para a Migração?
O secretário-geral da ONU, o ex-primeiro-ministro português António Guterres, anunciou em setembro passado a criação de uma rede de coordenação para a migração, designada como "Rede para a Migração". Será esta estrutura que vai assegurar o processo de acompanhamento e de monitorização do pacto, trabalho esse que vai consistir na partilha de experiências, em ajudar os Estados-membros a superar as dificuldades e a procurar soluções. A rede será coordenada com a ajuda da Organização Internacional para as Migrações (OIM), órgão chefiado desde outubro passado por outro português, António Vitorino.
As Nações Unidas propõem ainda que os Estados-membros discutam e avaliem os progressos deste pacto num Fórum Internacional que será realizado a cada quatro anos, a partir de 2022.
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