Depois de ter lançado no dia 10 de março a linha de roupa 'No Gender', no mesmo dia em que os avós maternos completaram 55 anos de casamento, o stylist Mário de Carvalho esteve à conversa com o Notícias ao Minuto para falar sobre a mesma.
Uma coleção que "celebra o amor, a igualdade e a vida" e que homenageia a avó, "a mulher que o fez acreditar que todos são iguais".
Mas a conversa não ficou por aqui, pois nos tempos que correm é impossível ficar indiferente à fase que o mundo atravessa com a chegada da pandemia da Covid-19. O novo coronavírus tem provocado vários efeitos em diversas áreas, e o mundo da moda não é exceção.
Aos 24 anos, Mário Carvalho veste algumas personalidades portuguesas muito conhecidas do grande público, estando também presente no pequeno ecrã, como no programa 'Ao estilo da Globo', da TV Globo. No entanto, ainda tem muitos sonhos por concretizar.
‘No Gender’ é uma homenagem à sua avó, que chegou também no ano em que os seus avós celebraram 55 anos de casamento. Agora que a linha já foi lançada, e acredito que os seus familiares já tiveram a oportunidade de a ver, sente que conseguiu cumprir o tributo que pretendia?
'No Gender' é uma homenagem à minha avó paterna – a Odete, que dá nome à colecção. E já que estávamos numa ode de homenagem aos avós, decidi lançar a coleção no dia em que os meus avós maternos completaram 55 anos de casados. É uma celebração do amor, diria. Quero que a 'Odete' chegue a muitos lugares, mas a verdadeira sensação de dever cumprido foi quando vi a minha Odete com uma 'Odete' vestida.
Os principais ‘ingredientes’ desta coleção passam pelo amor, a igualdade e a vida. Como é que estes conceitos transparecem na moda?
Aplicando-os. Cultivando-os. Regando-os para que depois os possamos colher. Eu acredito numa sociedade igual, luto por ela da forma que me é possível. Mas acredito ainda mais na força do amor, acho que é ele que nos dá vida. Seja amor pelo próximo, por uma causa ou pelo nosso trabalho.
“Todos somos iguais”, é um dos lemas que quis passar também nesta coleção e cada vez mais vimos linhas inspiradas no direito da igualdade. Sente que a indústria da moda tem ajudado neste passo da igualdade?
Esta pergunta é um mix feeling. Eu gostava muito de dizer que sim, sem olhar a mais nada. E é um trabalho que começou a ser feito nos anos 90, veja-se as campanhas da Calvin Klein protagonizadas pela Kate Moss. Mas não me posso esquecer que quando, dentro do mercado português, disse que esta era a minha bandeira me disseram, “Mário estás em Portugal. Isso aqui não vai resultar”. O que é certo é que quatro anos depois, sou o primeiro homem a ter uma rubrica online numa revista, por exemplo.
Entre as peças desta linha pode encontrar-se uma mala feita 100% de material reciclado. É fácil conseguir fazer-se peças completamente sustentáveis?
Não é o caminho mais fácil, tão pouco o mais económico. Por norma, materiais reciclados tendem a ser mais caros. Mas já que inclusão era e é o chavão da minha colecção, decidi arriscar e ter uma peça 100% reciclada.
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O planeta também tem sido um dos temas mais centrados na atualidade, com os ativistas a lutar contra a redução do plástico, por exemplo. É possível para um estilista viver apenas deste tipo de produção?
Estamos a falar de materiais que são, à partida, mais caros. Não é impossível, mas tem de se ter um budget maior na altura de produzir as peças.
Aos 24 anos, já é o nome responsável pelo look de várias caras conhecidas. Quando começou a interessar-se e a dar os primeiros passos no mundo da moda já se imaginava neste patamar?
Acho sempre que é mais fácil para os outros avaliar o meu hipotético sucesso. Para mim, e felizmente, cada passo que dou, dou-o de pés assentes no chão. E isso só é possível porque tenho uma família incrível e uma agente que me chama à terra quando disperso. Eu trabalho em moda desde os 13 anos. Faz parte de mim há mais de dez anos. Já trabalhei, creio, que em todas as frentes possíveis e imaginárias dentro da área. E aos 24 anos saber que as pessoas sabem que Mário de Carvalho é um nome, mas também é um rosto, é verdadeiramente gratificante.
O que recorda do seu início neste meio?
Recordo as minhas feições muito femininas. Foram elas as responsáveis pelo meu início. Recordo o apoio incondicional da minha avó, que me levava aos castings e ficava horas à minha espera. Que me pagou as mais diversas formações para que, nas palavras dela, eu pudesse sempre ser o melhor. E recordo uma frase da minha mãe: "Faças o que fizeres, o que importa é que sejas feliz".
Que personalidade (nacional ou internacional) gostava de ver com um look assinado por si? E em que passerelle gostava de ver uma coleção sua?
Sublinho que sou stylist e não designer. Esta aventura de ter uma coleção em nome próprio foi um desafio que lancei a mim mesmo. Porém adoraria um dia ver peças minhas na London ou Paris Fashion Week. Mas teria muito gosto em lançar a próxima coleção, sim, porque vai haver próxima, na Moda Lisboa. Relativamente a uma personalidade que gostasse de vestir, Rita Ora está no topo das escolhas.
Com a crise que chega com a pandemia do novo coronavírus, com vários desfiles cancelados e lojas fechadas… de que forma é que a pandemia afetou o seu negócio?
Afetou imenso. Havia todo um plano de promoção desenhado pela minha agente que caiu por terra. Mas nem eu, nem ela desistimos. E por isso mesmo achámos por bem manter tudo disponível online e aproveitar cada janela aberta.
O comércio online veio para ajudar os diferentes tipos de negócio. No seu caso, sente que hoje em dia consegue ter mais lucro no universo online?
Sim, sem dúvida. Sinto que consigo chegar a um maior número de pessoas, e dessa mesma forma ter uma maior carteira de clientes. Posso dizer que 50% das pessoas que visto, foi através de uma mensagem no Instagram, ou minha ou delas.
Tem tido também uma presença assídua no pequeno ecrã, não só em Portugal como também na TV Globo. Estes trabalhos têm sido fundamentais para se consolidar no mundo da moda? Tem sido importante a aposta da TV neste ramo?
Sim, sem dúvida. Mas nem sempre isso é algo bem aceite. Perdi trabalho à conta da exposição pública. Portugal é um país maravilhoso, mas é um país onde 'os grandes' dizem que só podes ser uma coisa. E eu nunca quis ser só uma coisa. Eu quis e quero ser tudo aquilo para o qual estudei. Eu quero concretizar cada sonho. Se sou stylist, mas apresento um programa, então dizem-me que “Queres é ser famoso!”. Não, eu licenciei-me em jornalismo, à posteriori formei-me em moda (e trabalho na área há mais de dez anos). Este é um percurso que me é legítimo e eu adoro fazer ambas as coisas. Trabalhei e estudei muito para conseguir ser quem quero ser. E o caminho ainda vai longo! Mas um dia vou poder olhar para um filho meu e dizer-lhe: “Vês? Eles é que estavam errados. Tu podes ser tudo aquilo que quiseres ser".
Falando em especial do programa ‘Ao Estilo da Globo’, como é que o povo brasileiro o tem recebido e qual o retorno que tem tido desta experiência?
Foi muito engraçado e repentino. Eu não tinha ideia dos números da comunidade brasileira em Portugal, e o meu programa passava vezes sem conta nos intervalos de qualquer telenovela, portanto o público brasileiro via-me permanentemente. Mas foram sempre incrivelmente calorosos. Quer por mensagens no Instagram, ou para tirar uma selfie na rua.
O que pretende alcançar num futuro próximo?
Como disse anteriormente, quero fazer tudo aquilo para o qual estudei. E ora bem, formei-me em teatro, licenciei-me em jornalismo, fiz um master degree em styling e pós-graduei-me em marketing de moda. Portanto, acho que ainda há todo um leque de coisas para fazer. As prioridades estão claras: a apresentação e a moda.