A Direção da ACE Escola de Artes informou, esta quinta-feira, que apresentou a demissão devido às "recentes manifestações públicas e do debate gerado" em torno da instituição depois de o ator António Capelo ter sido acusado de assédio por diversos jovens - como avançou em exclusivo o Notícias ao Minuto, na passada terça-feira, dia 9 de setembro.
"A Direção da ACE Escola de Artes informa que, na sequência das recentes manifestações públicas e do debate gerado em torno da nossa instituição, decidiu apresentar a sua demissão", pode ler-se numa publicação na rede social Instagram.
E continua: "Esta decisão resulta da convicção de que o presente momento exige serenidade, estabilidade e a proteção da missão dos valores que ACE Escola de Artes representa".
Na mesma nota, a direção diz considerar "que a escola deve permanecer acima de qualquer controvérsia" e que "a criação de um ambiente tranquilo é fundamental para garantir o bom funcionamento do ano letivo que acabou de iniciar", assim como "a continuidade do trabalho em prol da comunidade que servimos".
"Agradecemos a todos os nossos professores, funcionários, parceiros, colaboradores e membros da comunidade em geral a dedicação a projeto pedagógico e artístico único, com 35 anos de existência", afirma.
O que está em causa?
O ator António Capelo está a ser acusado por diversos jovens, entre os quais ex-alunos, de assédio. Os comportamentos terão, alegadamente, acontecido durante anos. O artista garante que o afeto demonstrado não tinha qualquer propósito desadequado. O Bloco de Esquerda (BE) confirma que recebeu uma queixa com "atos muito graves" protagonizados pelo ex-mandatário.
"És gay?", "falta de sexo" e "queres vir?" são apenas algumas das mensagens que o conhecido ator António Capelo, de 69 anos, terá, alegadamente, enviado a diferentes jovens, através das redes sociais durante anos e amplamente divulgadas, na última semana, por várias ativistas no Instagram.
De acordo com as capturas de ecrã agora expostas, o envio de mensagens era persistente. Mesmo sem resposta, eram feitas várias abordagens. Algumas com espaço de horas, outras de dias, de semanas e de meses ou anos. Muitas não tinham carácter sexual. Praticamente todas as divulgadas eram insistentes.
Ao Notícias ao Minuto, um jovem mostrou mensagens que remontam a 2017, quando tinha 20 e poucos anos. "Podes vir almoçar a Paço de Arcos, eu convido", terá escrito pouco depois de o abordar através do Facebook.
Perante este convite, que considerou impróprio, o jovem não respondeu mais. No entanto, as mensagens continuaram. No dia seguinte, dois dias depois, três e por aí fora. Sempre sem qualquer retorno.
Mas há mais denúncias. As abordagens do artista terão mesmo extravasado os ecrãs. Alguns dos relatos denunciam assédio em plena sala de aulas da ACE Escola de Artes – Teatro do Bolhão, tanto que o assunto chegou até a ser alvo de apostas entre os estudantes. "Quem será o escolhido este ano?", questionavam a cada ano que passava.
Capelo assegura: "Gestos de afeto nunca tiveram outro propósito"
Confrontado com estas acusações, António Capelo disse apenas ao Notícias ao Minuto que, através do advogado, moveu uma "queixa crime contra uma página anónima no Instagram", aguardando, neste momento, "o desenrolar dos acontecimentos".
O ator remeteu mais explicações para um comentário, entretanto, enviado por e-mail ao Notícias ao Minuto, onde expressa ter sido "alvo de acusações anónimas e difamatórias", nos últimos tempos, que põem em causa a sua "honra, vida profissional e até vida privada".
"Não me revejo em práticas de denúncia anónima nem em linchamentos públicos, que em nada contribuem para a justiça ou para a verdade", realça, acrescentando que as acusações que lhe dirigem "são graves e totalmente distorcidas da realidade".
"A minha conduta sempre se pautou pela exigência profissional, pelo respeito e pelo cuidado com os alunos. Gestos de proximidade, de afeto ou de apoio — como abraços, empréstimos de livros, partilha de refeições ou acolhimento em momentos de necessidade — nunca tiveram outro propósito senão o de educar, apoiar e formar seres humanos e profissionais", assegura na mesma nota.
Por essa razão, reafirma a sua "confiança na verdade e na Justiça", tendo já apresentado uma queixa-crime "por difamação contra quem se arroga dono da verdade".
"Continuarei, com serenidade e firmeza, a defender a minha honra, reputação e imagem e os valores que sempre guiaram a minha vida, bem como a dignidade da instituição", conclui.
Assédios "abafados"? ACE recusa acusações
O Notícias ao Minuto, note-se, contactou a ACE, porque muitos alunos nas suas denúncias contra António Capelo referiram que a escola em questão "não é apenas cúmplice, é parte ativa" das situações de assédio, uma vez que terá havido várias tentativas de apresentar queixa contra o então diretor artístico e todas foram "ignoradas". "Cultura interna de assédio abafada", acusa até um dos testemunhos.
Confrontada com estas acusações, a ACE garantiu ao Notícias ao Minuto que não recebeu qualquer queixa relativa ao comportamento de António Capelo.
"Em nenhum dos instrumentos de auto-avaliação ou órgãos de controlo pedagógico da escola foi registada qualquer queixa contra este antigo professor. Nem junto da 'rede' de profissionais que enquadram o quotidiano escolar e que estão em contacto directo com os alunos, como diretor de turma, diretor de curso ou direção pedagógica, nem nos inquéritos anónimos de avaliação individual dos professores por parte dos alunos, que a escola promove anualmente, desde 2011. De igual modo, também não se verificaram queixas desta natureza nos inquéritos, anónimos, produzidos pela Comissão de Avaliação Interna, em 2023/24, ou nos inquéritos às/aos alunas/os criados pela Associação de Estudantes, em 2021".
[Notícia atualizada às 18h30]
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